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Para sua quinta temporada, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente porque todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série. Em Rachel, Jack and Ashley Too temos uma abordagem um pouco diferente do que a série está acostumada.
Ashley O (Miley Cyrus) é uma das maiores estrelas da música pop, influenciando várias jovens no mundo inteiro. Ela acaba de lançar uma linha de bonecas chamada Ashley Too, que são basicamente pequenos robôs com um tipo de inteligência artificial capaz de se comunicar com seu dono. Rachel (Angourie Rice) é uma grande fã de Ashley O, então precisa da boneca para se conectar com o ídolo.
A trama alterna entre dois núcleos, o primeiro envolvendo os bastidores da vida de Ashley O, uma jovem com um sorriso e atitude positiva no palco, mas depressiva e desiludida com o rumo de sua carreira. Assistimos sua relação com os produtores e sua agente — e tia -, Catherine (Susan Pourfar), que não é das melhores. Ashley tem escondido os medicamentos que Catherine usa para controlar o seu temperamento, o que resulta em uma ação inesperada dos produtores, que colocam a cantora em um coma induzido e copiam sua imagem para manter a agenda da artista em ordem através de apresentações virtuais.
Do outro lado, seguimos Rachel e sua irmã, Jack (Madison Davenport), tentando se comunicar depois da perda de sua mãe. Rachel tem apenas Ashley Too como companhia, enquanto Jack tenta ao máximo se isolar de todos. Os dois núcleos convergem quando a consciência de Ashley O vai parar na boneca de Rachel e agora as duas irmãs precisam ajudar a cantora a retornar ao seu corpo.
O roteiro de Brooker é bem mais leve neste episódio, com uma jornada divertida envolvendo duas adolescentes arranjando maneiras absurdas de ajudar uma boneca senciente. E quando eu digo “leve” é porque mesmo que haja uma corrida contra o tempo para salvar a estrela da música em coma, fica difícil sentir qualquer peso na maneira como a história foi executada, tendo uma mistura de comédia e drama que nunca chegou a combinar organicamente.
A direção ficou nas mãos de Anne Sewitsly, que carrega uma filmografia pequena mas quase sempre carregando um elenco predominantemente feminino, então faz sentido ela estar responsável pelo episódio. Sua habilidade guiando as atrizes é o ponto alto aqui, com algumas sequências engraçadas com as personagens, bem interpretadas por Rice e Davenport.
Quando se fala de Miley Cyrus alguns torcem o nariz, o que considero um exagero porque ela se esforça para trazer uma personagem atraente, seja nos palcos ou fora dele. É claro que não é nada impressionante, mas é o suficiente para que sua imagem fora da série não influencie o espectador — se bem que ela interpreta uma cantora pop, então não há muito problema nisso. O que realmente me impressionou foi ver Cyrus cantando versões mais chiclete das músicas Head Like a Hole e Right Where It Belongs, da banda Nine Inch Nails, que tem um som que vai na direção oposta a tudo que a cantora já fez na carreira (terminar o episódio com Ashley e Jack no palco foi um pouco cafona, mas o episódio já tinha descambado para uma comédia adolescente mesmo, então é melhor abraçar logo o ridículo).
Rachel, Jack and Ashley Too tem uma abordagem bem diferente em tom do que a série está acostumada — até mesmo o humor foi sempre utilizado de maneira ácida e trágica em outras temporadas — e isso acaba afetando negativamente o formato da série. Não é um episódio que deve ser descartado, é claro, mas ainda assim perde seu sentido no meio dos outros.
Ficha Técnica:
Black Mirror, S05E03
Criada por Charlie Brooker
Direção de Anne Sewitsly
Roteiro de Charlie Brooker