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Watchmen | Martial Feats Of Comanche Horsemanship – S01E02

Chegamos ao segundo episódio da série Watchmen, com mais revelações, mas também muito mais mistérios. Nicole Kassel retorna para a direção, construindo a tensão e estabelecendo alguns elementos que provavelmente serão essenciais para compreender a “grande conspiração” prenunciada por Will Reever, o centenário em cadeira de rodas aparentemente responsável pela morte de Judd Crawford. 

Agora Watchmen parece estar mais ligada ao seu material original, com referências diretas aos quadrinhos, além de começar a revelar o possível caminho que seguirá até o fim da temporada, dando maior espaço para os acontecimentos de Tulsa em 1921 e o drama pessoal de Angela, que descobre informações importantes sobre seu próprio passado. 

Podemos ver Looking Glass em ação novamente, dessa vez tentando conversar com Night (alter ego de Angela) sobre o assassinato de Crawford, o que a deixa desconfortável. Red Scare também recebe atenção, mesmo que superficialmente. Entendemos porque seu uniforme é vermelho (ele se considera um comunista) e vemos seu ódio pela Kavalaria ou os apoiadores de Nixon. 

Não houveram grandes mudanças em tom do primeiro episódio para esse, apenas na música de Trent Reznor e Atticus Ross, que ficou ainda melhor e mais experimental, então para não perder tempo, vamos logo para as referências e teorias.  

Sob o Capuz: Referências e Teorias (SPOILERS)

Watchmen
  • Retornamos a Tulsa, e podemos ver como o passado será um ponto chave para compreender a temporada. Podemos ver mais uma vez o pequeno Will Reever, lendo o panfleto com as regras para os negros em tempos de guerra. O episódio abre com um oficial alemão pedindo para que sua secretária datilografe uma mensagem em inglês direcionada aos soldados negros.

    Essa cena não é ficção, a mensagem é real e ainda há cópias digitalizadas do panfleto em alguns museus dos EUA. Ainda não sabemos o paradeiro do bebê encontrado por Will, mas algo me diz que ele pode ter algo a ver com a “nave” que surge na conclusão do episódio e leva o centenário embora. Abaixo, você pode ver uma réplica do panfleto.
  • Uma das grandes ligações diretas aos quadrinhos é a banca de jornal do Mr. News, onde temos o jornaleiro Seymour conversando com o entregador, uma clara alusão ao personagem Bernard, dono de uma banca que observa e conhece todos em volta. Na HQ, Bernard está sempre conversando com um jovem que senta na calçada e lê a nova edição do Cargueiro Negro (quadrinho dentro do universo de Watchmen), mas é apenas no fim que descobre o nome do jovem, o mesmo que o seu.

    Na série, podemos ver que o jornal New Frontiersman e a revista Nova Express continuam em atividade. Ao fundo, é visível um estabelecimento chamado Mac Mcgee, mais uma referência musical da série, dessa vez à cantora Janis Joplin e sua música Me and Bobby McGee, presente na HQ e na trilha do filme de Zack Snyder, de 2009.
  • Antes dessa cena, há outra referência aos quadrinhos, um detalhe pequeno mas que prova a atenção da série aos detalhes. Entre a transição das cenas de Angela e do jornaleiro, podemos ver uma silhueta marcada na parede de um casal de beijando, e essa mesma imagem pode ser vista nos quadrinhos.
  • No episódio, Angela tenta descobrir a verdadeira identidade de Will, então decide ir ao centro cultural de Greenwood, onde é recebida por uma mensagem digital do secretário do tesouro nacional, Henry Louis Gates Jr, que na vida real é um editor, escritor e acadêmico envolvido nos estudos sobre o passado histórico da comunidade negra.
Watchmen
  • Uma coisa curiosa foi ver a forma como alguns repórteres e paparazzi fazem seu trabalho no mundo da série. Quando Night, Looking Glass e Red Scare chegam para ajudar a polícia na cena do crime de Judd Crawford, um homem com asas mecânicas cai no capô de um carro, enquanto outro pode ser avistado sobrevoando o local com uma câmera. Red Scare chama esses repórteres de “moths”, ou “traças”, em português. Essa pode ser uma menção ao personagem Byron Lewis, dos quadrinhos, que atuava como o herói Mothman, do grupo Minutemen (os Watchmen originais), traduzido por aqui para Traça.
Watchmen
  • E por falar nos Minutemen, finalmente acontece a estréia do programa American Hero Story, contando a história de heróis clássicos atuando contra o crime. O episódio foca na jornada do Justiça Encapuzada, um dos primeiros justiceiros em atividade, e o mais misterioso. Além do que parece ser uma homenagem aos primeiros minutos do filme Crepúsculo dos Deuses, de Billy Wilder, a série dentro da série parece estar parodiando o estilo de filmagem do diretor Zack Snyder, enchendo as cenas de câmera lenta e violência gratuita.

    Eu já mencionei por aqui, mas para quem esqueceu, Snyder dirigiu a adaptação para o cinema de Watchmen, em 2009, e essas são algumas de suas marcas registradas. Além disso, a série faz uma comparação entre os eventos do clímax do quadrinho e o pandemônio causado pelo diretor Orson Welles em 1938, quando decidiu narrar os acontecimentos do livro Guerra dos Mundos ao vivo em uma rádio pública. A descrição de uma invasão alienígena causou uma comoção enorme entre os ouvintes, muitos acabaram correndo pelas ruas ou ligando para a emergência pedindo ajuda.
Watchmen
  • Uma das coisas mais curiosas do episódio é uma cena envolvendo o garoto Thoper Abar, interpretado por Dylan Schombing, que pode ser visto construindo um tipo de castelo gravitacional com peças magnéticas de um conjunto chamado Magna-Hattan Blocks. Além da óbvia ligação do nome Magna-Hattan com Manhattan, essa pode ser uma cena importantíssima para a série, isso porque a ligação não está apenas em palavras, mas visualmente.

    No primeiro episódio, Manhattan é transmitido na TV tentando construir um castelo bastante parecido com o de Topher. Estariam os dois ligados de alguma maneira? E se formos ainda mais ousados, será que há alguma conexão com o castelo de Adrian Veidt?
  • Por falar em Veidt, voltamos ao seu castelo escondido do mundo, onde Adrian parece estar tentando recriar seus dias como em uma peça teatral, o que ele já está fazendo com seus funcionários, tentando trazer para a luz sua tragédia O Filho do Relojoeiro, uma dramatização da história de origem do Dr. Manhattan (com direto à Cavalgada das Valquírias, de Wagner, como trilha sonora – outra ligação com o filme de Snyder).

    Essa é uma das sequencias mais absurdas do episódio, revelando que todos os funcionários de Adrian são clones. Isso faz sentido se lembrarmos que ele é um dos nomes mais importantes do mundo quando se fala em tecnologia e ciência, tanto que seu animal de estimação nos quadrinhos, Bubastis, era uma criatura geneticamente modificada, então nada mais justo para o personagem do que evoluir sua pesquisa para seres humanos. E por falar em Bubastis, Adrian tem agora outro animal de estimação, um cavalo chamado Bucéfalo, inspirado no cavalo de mesmo nome do imperador “Alexandre, O Grande”, o maior ídolo de Veidt.
  • É na casa de Judd Crawford que recebemos algumas das reviravoltas e informações mais importantes do episódio, mesmo que ainda não esteja claro se são reais ou fabricadas por alguém tentando sujar a imagem do oficial. A primeira informação é o quadro Martial Feats of Comanche Horsemanship, que pode ser encontrado na sala de Judd. A pintura de 1984 dá nome ao episódio e representa as primeiras batalhas entre os índios e a cavalaria, talvez uma referência temática aos membros da Kavalaria que usam máscaras de Rorschach.

    A segunda é a introdução do personagem Joe Keene, o filho (talvez neto) do senador Keene, responsável pela lei de 1977 que proíbe a atividade de heróis com identidade secreta na HQ. Tudo indica que ele será o principal concorrente de Robert Redford nas próximas eleições, e do jeito que as coisas vão, parece que vai ser uma disputa difícil.

    Tirando a revelação final da sequencia em que um traje da Klu Klux Kan é encontrado no armário de Judd, a série continua tentando nos convencer de que ele era o Coruja o tempo inteiro, e aí entra a terceira informação importante, quando Angela encontra um par de óculos capazes de visão raio-x bastante similares aos óculos de leitura infravermelha de Dan Dreiberg, o Coruja, nos quadrinhos.
  • Mesmo em um episódio com clones e fotógrafos alados, o mais estranho mesmo foi o imã gigante que veio dos céus para resgatar (?) Will. Até o momento a minha teoria para isso é que… a série é louca mesmo. Admito não lembrar de nada assim nos quadrinhos, mas entre as sombras podemos ver que há uma hélice, que deve fazer parte de alguma nave de recolhimento. Vai saber ¯\_(ツ)_/¯
Watchmen

Antes de terminar esse texto, uma boa dica para quem quer saber ainda mais sobre os bastidores de Watchmen é o PeteyPedia, um site mantido pela HBO, onde cataloga notícias e documentos importantes como se fosse parte da série, assim como o próprio Alan Moore fez entre as edições da HQ original, quando aproveitava as páginas de publicidade para criar mais conteúdo sobre o universo que criou.

Parece que as coisas vão ficar muito mais confusas daqui pra frente, então não se esqueça de voltar na próxima semana para continuarmos debatendo a série. Até lá!

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Branco Sai Preto Fica | O trauma da perda de identidade

Adirley Queirós é hoje uma das maiores referências do cinema de Brasília, cidade natal do diretor e cenário para todos os seus filmes. Corajoso em seus comentários, sem deixar de lado a eloquência, costuma traduzir sua experiência de vida crescendo na cidade-satélite Ceilândia para suas obras, debatendo questões arriscadas, mas pertinentes. Em ação desde 2005 com o curta Rap, O Canto da Ceilândia, foi apenas em 2014 que finalmente conquistou a atenção do público através de seu longa Branco Sai, Preto Fica.

A inspiração principal para o filme vem de um incidente da década de 1980, quando policiais invadiram um ginásio referência para os cidadãos chamado Quarentão, onde os jovens costumavam se divertindo fazendo um baile de música negra. A violência dos policiais resultou em várias pessoas machucadas, além de acabar amputando a perna de um dos moradores e deixar outro paralítico.

As duas vítimas, Marquim da Tropa e Shokito (depois chamado de Sartana), assumem a responsabilidade de reviver o trauma atuando no filme, que procura uma forma de reparação ao apresentar uma trama na qual os dois descobrem uma maneira agressiva de se vingar do estado, mesmo que esse tenha adquirido características mais fascista por conta da decisão do diretor em utilizar elementos de ficção científica para transformar a cidade em uma distopia, com direito a passaportes para transitar entre os distritos e guerras entre facções.

Branco Sai, Preto fica

Queirós usa arquétipos da ficção científica para fortalecer algumas das suas críticas, chegando a inserir no filme o viajante temporal Dimas, que precisa reunir informações capazes de influenciar o futuro de 2073, no qual uma “vanguarda cristã” toma o poder do estado. Isso logo deixa evidente como a obra não se acanha em apontar culpados e ir direto aos seus alvos, o que o próprio diretor não tem vergonha de assumir, ostentando uma postura radical que talvez seja essencial para que possa provar seu ponto.

Para Queirós, o Quarentão foi um dos maiores polos de formação de identidade da cidade, e essa é uma das razões pela qual a polícia decidiu destruir o lugar, para perpetuar uma narrativa de segregação racial e social. Até mesmo o título, Branco Sai, Preto Fica, tem um duplo sentido para o diretor, no qual ele recebe um significado ligado diretamente a abordagem dos oficiais na década de 1980, mas também é uma forma de representar uma dívida histórica que não só o estado, mas o país precisa admitir.

O filme é uma mescla entre meta-documentário e ficção científica, o que em questão de enredo funciona bem, mas não é sempre que esses elementos casam perfeitamente na montagem. A proposta inicial do diretor era de fazer um documentário sobre os eventos no Quarentão, mas ao ver como a história começava a apresentar contornos mais fabulosos, abraçou a ficção científica, não só na distopia do texto, mas no visual, criando ambientes quase cyberpunk, mas com uma individualidade marginal, sem a glamourização tecnológica quase fetichizada de Hollywood, aqui enchendo um estúdio de gravação musical com fios e cabos elétricos espalhados ou mostrando a importância de uma instalação onde um dos personagens recicla e conserta próteses para a comunidade.

Ainda que Branco Sai, Preto Fica tenha um excelente trabalho fotográfico com a luz natural em contraste com os ambientes cobertos em metal distorcido, e saiba aproveitar o baixo orçamento como poucos (a nave interplanetária do viajante do tempo é apenas um contêiner, por exemplo), a mudança na abordagem original do diretor, de fazer um documentário, acaba se manifestando por conta da falta de interação entre alguns núcleos e o tom que pode destoar um pouco em alguns momentos.

Branco sai, preto fica

Ainda assim, esse é um filme que merece ser exaltado pelas suas vitórias, a maior delas é contar uma história muitas vezes negligenciada, fazendo com que a sociedade use uma de suas armas mais poderosas, a arte, para acabar com a ascensão de uma mentalidade fascista, mesmo que literalmente.

Branco Sai, Preto Fica é atrevido e ao mesmo tempo melancólico, uma obra que divide opiniões mas não esquece de nos instigar constantemente.

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Watchmen | It’s Summer and We’re Running Out of Ice – S01E01

Com roteiro de Alan Moore e arte de Dave Gibbons, a graphic novel Watchmen é lançada em 1986, pela DC Comics, em doze volumes. Ela é um enorme sucesso, vendendo muito bem e sendo elogiada por todos. Duas décadas depois, a HQ é destacada como um dos melhores romances do século pela revista Time, fazendo com que a obra de Moore e Gibbons receba novo fôlego e atenção até daqueles não interessados na arte sequencial.

É 2009 e Hollywood consegue finalmente adaptar Watchmen para o cinema. Dirigido por Zack Snyder, o longa tem uma recepção mista da crítica, mas a bilheteria não impressiona. Ainda assim, todos parecem interessados em desenvolver suas próprias histórias se aproveitando das doze edições originais da HQ. A própria DC tenta uma prequel em quadrinhos, intitulada Antes de Watchmen, reunindo diversos artistas com o intuito de contextualizar um universo que, alguns diriam, não necessitava disso. Mesmo sem sucesso, a editora insiste em inserir os personagens em seu selo padrão, criando a saga Doomsday Clock.

Estamos em 2019: Damon Lindelof, co-criador de séries como Lost The Leftovers, decide liderar uma adaptação de Watchmen para a HBO. O primeiro episódio é lançado no dia 20 de Outubro. Hoje, eu escrevo a resenha.

É verão e estamos ficando sem gelo.

Watchmen Trailer Looking Glass

A primeira sequência do episódio talvez seja a mais importante para estabelecer o tema principal dessa série, que promete utilizar o contexto político e social dos quadrinhos para desenvolver uma crítica mais pertinente ao crescimento de grupos fascistas e supremacistas brancos nos EUA. Tudo começa em 1921, durante a rebelião racial de Tulsa, na qual a comunidade negra de Oklahoma é covardemente atacada por brancos intimidados com o crescimento de distritos como Greenwood, um dos mais ricos do estado, habitado por negros. No meio do tumulto e dos linchamentos, seguimos um casal tentando salvar seu filho o enviado em uma carruagem com uma mensagem no bolso.

Em seguida, somos introduzidos ao ano 2019 da série, que mesmo sendo uma versão alternativa do nosso, se passando no mesmo universo dos quadrinhos (aparentemente, o filme não será levado em conta), comenta a realidade fora da tela. Depois dos eventos do quadrinho, que termina com o personagem Rorschach entregando seu diário contendo os planos de Adrian Veidt, o Ozymandias, e todos os outros integrantes do grupo Watchmen, a série explora as sequelas da despedida do Dr. Manhattan, assim como a catastrófica solução de Veidt para trazer a paz mundial.

Talvez a decisão mais radical da série, ainda que faça total sentido (eu vou explicar na parte de spoilers), é transformar Rorschach em uma figura de resistência para um movimento de supremacistas brancos chamado Seventh Kavalry (seria apenas uma referência ao regimento dos EUA ativo em grandes guerras, ou uma ligação mais forte com um diálogo dos quadrinhos onde Veidt menciona a cavalaria como contraste para o apocalipse?). No 2019 de Watchmen, é a vez da polícia usar máscaras e se auto-intitular a vigilante máxima da sociedade, respondendo o questionamento em latim “Quis custodiet ipsos custodes”, traduzido por Alan Moore para “Quem vigia os vigilantes”. Mas ainda há obstáculos para a própria polícia, que precisa de códigos de segurança mais restritos quando envolve o uso de armas, que agora tem uma trava liberada apenas por autorização geral.

Entre os policiais, ainda há vigilantes encapuzados, como Angela Abar (Regina King) e Looking Glass (Tim Blake Nelson), que procuram trabalhar na margem da lei, mas dessa vez de maneira mais organizada.

Além de uma boa construção de mundo e um ótimo elenco (Regina King e Jeremy Iron prometem ser a maior força dramática da série), esse primeiro episódio, dirigido por Nicole Kassell, tem um excelente trabalho do departamento de direção de arte, com uma bela fotografia que apresenta a iconografia dos quadrinhos, com ovos que formam o rosto sorridente do bóton do Comediante ou a gota de sangue caindo no distintivo de um dos personagens, sem contar as composições que tentam replicar o formato de um relógio de bolso e seus ponteiros. Vale mencionar a composição musical da dupla Trent Reznor (da banda Nine Inch Nails) e Atticus Ross, responsáveis por filmes como A Rede Social e Garota Exemplar, aqui aumentando a força da narrativa com uma atmosfera mais sombria e tensa através do piano melancólico de Reznor.

It’s Summer and We’re Running Out of Ice é um ótimo começo para a série, estabelecendo muita coisa dos quadrinhos e desenvolvendo outras que prometem colocar o dedo na ferida. Alan Moore já abordou em Watchmen alguns tópicos relevantes do nosso 2019, como os direitos LGBTQ+ ou o risco de acreditar na carisma de figuras fascistas, mas a atenção da série ao debate racial pode ser um ângulo intrigante capaz de transformar a série em algo próprio, ao contrário de outros materiais que tentaram apenas recriar a sensação do quadrinho original.

Sob o Capuz: Referências e Teorias (SPOILERS)

Watchmen

Como é apenas o primeiro episódio da série, vou deixar apenas algumas das coisas curiosas que achei enquanto assistia o episódio.

  • O livro SOB O CAPUZ, a autobiografia de Hollis Mason (primeiro Coruja, do grupo Minutemen, os heróis que atuavam antes dos Watchmen), pode ser visto na mesa do escritório de Judd Crawford. E por falar em Crawford, o episódio dá alguns indícios de que ele possa ser o segundo Coruja, Dan Dreiberg, como sua caneca em formato de coruja ou o fato de utilizar a Arquimedes, nave do herói nos quadrinhos. É claro que ele poderia simplesmente estar usando um de seus nomes falsos depois dos eventos da HQ, mas depois da revelação final do episódio fica difícil continuar acreditando que ele seja o Coruja.
Watchmen Sob o capuz
  • A CHUVA DE LULA que acontece enquanto Angela Abar está trazendo seu filho da escola é uma clara referência ao clímax causado pro Adrian Veidt nos quadrinhos, na qual ele desenvolve uma lula mutante para aterrorizar a humanidade orquestrando um falso ataque alienígena. Isso deixa evidente que a série é uma sequencia da HQ e não do filme. Falando nisso, na cena anterior podemos ver um quadro com a imagem dos principais presidentes dos EUA, e um deles é Robert Redford, uma piada com a última página do quadrinho, onde brincam com a possibilidade de um ator na casa branca.
Watchmen Polvo
  • O personagem JUSTIÇA ENCAPUZADA tem bastante destaque na série, sendo o “rosto” principal nos anúncios do futuro documentário sobre os Minutemen, aparecendo em uma propaganda de ônibus e nos comerciais da TV. Na própria HQ, Hollis Mason diz em sua autobiografia que ninguém sabe a verdadeira identidade do Justiça Encapuzada, mas por conta de sua roupa, idealizada com uma corda em forma de forca no pescoço e um capuz roxo como máscara, a principal teoria é que seja um homem negro (possivelmente homossexual, isso de acordo com Hollis). Assistindo ao episódio não pude deixar de imaginar que o idoso da cadeira de rodas, que aparece lendo seu jornal e fazendo comentários aleatórios para Angela (e no fim revela-se o garoto com o bilhete da sequencia de abertura), é o verdadeiro Justiça Encapuzada. E isso faz total sentido, considerando a camisa roxa, a idade e as suposições de Hollis.
  • Uma das coisas que mais aguardo na série é o retorno de Adrian Veidt, que tem poucos minutos no episódio, mas já revela estar trabalhando em uma peça, uma tragédia em cinco atos — o que provavelmente será mais um de seus planos para trazer a paz mundial que tanto almeja. Um dos indícios de que Adrian pode estar mais uma vez por trás de uma grande conspiração é uma rápida tomada na qual podemos ver um jornal com a manchete que diz “Veidt é Oficialmente Declarado Morto”. Ou esse é o primeiro passo para seu esquema mirabolante, ou a série está experimentando com uma narrativa não-linear, o que não seria surpresa agora que tantas séries estão fazendo isso, como a própria Westworld, da HBO.
Watchmen Veidt Morto
  • Entre todos os nomes mencionados no episódio, o que achei mais curioso foi PIRATE JENNY, utilizado por uma vigilante trabalhando ao lado de Judd Crawford, pilotando a Arquimedes. Pirate Jenny é o título de uma música (macabra) da cantora Nina Simone, uma das favoritas de Alan Moore, tanto que ele utiliza a letra da canção como inspiração para os Contos do Cargueiro Negro, uma história dentro da história de Watchmen. Para ser mais exato, o Cargueiro Negro é um quadrinho sobre piratas que os jovens leem no universo de Watchmen, já que heróis encapuzados são uma realidade, quadrinhos como da Marvel e DC não fazem sentido. Um trecho da letra traduzida: “Há um navio, o Cargueiro Negro. Com uma caveira em seu mastro. Eles estão chegando”. Ouça a música.
Watchmen Pirate Jany
  • O aspecto mais polêmico do episodio envolve Rorschach e os Supremacistas Brancos. Eu entendo quem talvez tenha se incomodado com isso, mas eu considero um dos grandes acertos do episódio. Tirando o fato do grupo de supremacistas generalizar seu preconceito, se estendendo também aos policiais, a inspiração deles é em um personagem claramente preconceituoso — e não me entenda errado, adoro o personagem, mas posso gostar dele e não gostar de suas atitudes ao mesmo tempo (ponto para o roteiro de Alan Moore, como sempre). Nas HQs, Rorschach está constantemente fazendo comentários sexistas e homofóbicos sobre seus companheiros de trabalho, como chamar Veidt de homossexual, por exemplo. Isso sem contar que o personagem é um ávido leitor do jornal The New Frontiersman, direcionado ao público mais reacionário. Há várias outras menções na HQ, mas a mais gritante é quando uma das vizinhas de Rorschach o chama de “pervertido nazista”. Essa parte pode ser polêmica, mas não infundada.
The Watchman HBO
Watchmen Rorshach Mark Hill/HBO
  • Para fechar os meus destaques (há outros, mas não quero deixar isso muito grande e outros ainda precisam ser confirmados), é bom saber que algumas coisas nunca mudam e Alan Moore ainda não aceita ser creditado em nenhuma adaptação de suas obras, deixando todo o crédito para o artista Dave Gibbons.
Watchmen Final

Essas foram algumas das minhas considerações sobre o primeiro episódio da série de Watchmen, It’s Summer and We’re Running Out of Ice. Deixe nos comentários o que achou do episódio e das mudanças.

Nos vemos na próxima semana.

Tick, tock, tick tock.

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Cinema

Paprika | A porta entre sonho e realidade

Responsável por longas animados como Perfect Blue (Pâfekuto Burû, 1997)Tokyo Godfathers (Tôkyô Goddofâzâzu, 2003) e Millennium Actress (Sennen Joyû, 2001), Satoshi Kon é o meu diretor favorito quando se fala de animação japonesa.

É fundamental ressaltar a relevância de alguém como Hayao Miyazaki para a indústria, principalmente pela forma como popularizou o estúdio Ghibli, mas quando comecei a me interessar de verdade por cinema, o de Kon sempre falou mais comigo, considerando as premissas que envolvem temas complexos e absurdos, experimentando o formato de maneira única. O seu filme que melhor representa isso é Paprika (Papurika, 2006), o último longa que dirigiu, considerado por muitos a sua obra máxima.

Adaptado da obra literária homônima, lançada originalmente em 1993 por Yasutaka Tsutsui, Paprika é um filme cheio de conceitos instigantes, utilizando thriller, ação e ficção científica para contar a história da psicóloga Atsuko Chiba (dublada por Megumi Hayashibara), tentando ajudar seus pacientes, mesmo que ilegalmente, com uma máquina capaz de adentrar os seus sonhos. Para não ser reconhecida, Chiba cria um alter-ego chamado Paprika, uma figura capaz de caminhar pelo mundo subconsciente sem problema.

Paprika

Um de seus pacientes é o detetive Toshimi Konakawa (Akio Ôtsuka), que sofre de um pesadelo recorrente sobre um caso não resolvido. Realidade e sonho entram em colapso enquanto Chiba, Konakawa e o doutor Kohsaku Tokita (Tôru Furuya), parceiro de pesquisa de Atsuko, tentam deter uma recente ameaça cada vez mais poderosa.

Se a premissa parece familiar, é porque você provavelmente já assistiu A Origem (2010), de Christopher Nolan, com um conceito bem similar ao de Paprika, tendo até algumas sequências inspiradas no longa animado. Proposital ou não, podemos ver o excelente trabalho de Satoshi Kon na representação visual dos sonhos, e esse é apenas um dos aspectos que faz desse filme tão bom.

Paprika Quebrando Vidro

Como já foi salientado pelo finado (porém maravilhoso) canal do YoutubeEvery Frame a Painting, Kon é um mestre na edição, aproveitando o formato animado para executar cenas impossíveis em live action, com uma montagem dinâmica onde nossas concepções sobre a realidade são constantemente questionadas, seja pela experimentação com a perspectiva, a composição ou simplesmente nas representações mais oníricas do filme.

No ano de seu lançamento, Paprika recebeu mais elogios da crítica por seu apelo estético, mas há espaço para um bom desenvolvimento de personagens, revelando suas intimidades e maiores medos, o que podemos ver na “amizade” de Chiba com Tokita, ou na ansiedade do detetive Konakawa. É curioso ver como Chiba também interage com Paprika, por vezes parecendo que o alter ego adquiriu consciência própria, o que cria um questionamento sobre a verdadeira natureza de sua relação. Essa parte da obra chega perto de algo que Philip K Dick faria, o que faz sentido considerando que Satoshi Kon era um grande fã do escritor.

Outra coisa interessante, mais voltada para a animação em si, é a atenção aos detalhes de Kon, atribuindo pequenos maneirismos em seus personagens, como as expressões de Paprika e o jeito como Konakawa imita o diretor Akira Kurosawa enquanto conversa com a protagonista em uma sala de cinema — essa parte é uma das minhas favoritas.

Eu estava constantemente tentando me aprofundar no meu subconsciente, o que é bem difícil quando você está completamente consciente (Satoshi Kon)

Paprika

Além de todos os elogios ao trabalho visual de Kon, não posso deixar de mencionar a belíssima composição musical pop e techno de Susumu Hirasawa, que combina muito bem com a explosão de cores e elementos inseridos na tela (em certo ponto, temos eletrodomésticos e brinquedos antropomórficos desfilando no meio da rua enquanto executivos engravatados saltam de prédios com um sorriso no rosto e a protagonista sobrevoa observando tudo isso de sua nuvem — parece bizarro, e é).

O roteiro pode não se destacar por seus debates políticos e sociais, que estão lá na superfície mas nunca chegam a ser parte essencial da trama (obviamente, o roteiro não tinha essa obrigação ou intenção), talvez por estar mais envolvido em inserir elementos misteriosos para que o público possa interpretar assistindo o filme mais de uma vez, como as borboletas azuis presentes ao longo da obra.

Paprika é, acima de tudo, uma experiência espetacular, de impacto visual como poucos filmes conseguem, e mesmo que seu enredo não seja tão claro em alguns aspectos, assistir a jornada de Chiba e sua equipe é algo que todo fã de cinema e animação precisa fazer. Muitos cineastas já tentaram interpretar o real e o sonho em sua própria maneira, como David Lynch, Christopher Nolan ou Terry Gilliam, mas nenhum deles parece ter se divertido tanto com as possibilidades da sétima arte como Satoshi Kon, que se foi aos 48 anos, em 2010, com uma filmografia pequena, mas inesquecível.

Paprika
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Séries

Arquivo X | “Home”: O Episódio mais arriscado da série.

A televisão da década de 1990 foi o começo do que alguns consideram uma revolução para o formato, com o surgimento de clássicos como Twin Peaks, co-produzida por David Lynch, um (excelente) diretor de cinema que decidiu investir em séries, ou Os Sopranos, criada por David Chase, que fechou a década transformando a HBO em uma das produtoras de conteúdo mais renomadas do mercado e inspirando gerações de roteiristas com o drama familiar de Tony Soprano, um chefe da máfia que acabou inspirando outros personagens como o próprio Walter White, de Breaking Bad. Mas a TV também não seria a mesma sem a presença da dupla de agentes do FBI, Mulder e Scully, de Arquivo X.

Toda semana, Arquivo X prometia trazer algo novo e bizarros para o público. Com uma premissa envolvendo dois agentes responsáveis por investigar os casos mais inexplicáveis da humanidade, temos o contraste perfeito nos protagonistas Fox Mulder e Dana Scully, interpretados respectivamente por David Duchovny e Gilliam Anderson.

Enquanto Mulder liga a maioria dos casos à atividades extraterrestres, isso porque acredita ter presenciado a abdução de sua irmã mais nova, Samantha, ainda na infância; do outro lado, temos Scully, uma agente mais cética que confia apenas no que a ciência pode explicar. Foi a interação entre os personagens e suas tentativas em resolver casos cada vez mais perigosos que fez dessa série um marco da televisão, rendendo onze temporada (até o momento) e dois filmes, um em 1998 e depois em 2008. 

Ainda que explore diversos temas por conta de elementos como alienígenas, distorções temporais, conspirações corporativas e muito mais, é curioso notar como um dos episódios mais aclamados da série se passa quase inteiramente dentro e na varanda de uma casa, no segundo episódio da quarta temporada, intitulado Home

Arquivo X

No episódio, Mulder e Scully investigam a descoberta de um cadáver enquanto um grupo de crianças jogava basebol. O que deixa o mistério ainda mais intrigante é que o cadáver foi enterrado vivo, e era um bebê. Os principais suspeitos são a família Peacock, constituída de irmãos com severa deformação genética, que mora na casa decrépita próxima a cena do crime.

Home marca o retorno dos roteiristas Glen Morgan e James Wong, que saíram da série na segunda temporada para desenvolver seu próprio programa. O que eles fizeram é considerado até hoje um dos episódios mais brutais e arriscados da história da TV, não só pela violência gráfica, mas pelos temas abordados, como incesto e estupro.

Talvez uma das maiores inspirações para o roteiro seja o documentário Brother´s Keeper, de 1992, que traça algumas similaridades com os eventos do episódio, envolvendo uma personagem desfigurada e um misterioso assassinato. Home também busca referências no cinema de terror slasher da década de 70, com uma ambientação similar a de filmes como O Massacre da Serra Elétrica, de 1874. Os elementos de terror, junto do excelente trabalho da equipe de direção de arte, recriando uma casa antiga da Guerra Civil, fizeram desse episódio um dos mais memoráveis da série. 

Home é um marco na história da TV, chegando a ser banido e ter sua reprise retirada da programação pela própria emissora por conta de seu teor violento, mas os debates que abre através dos questionamentos sobre maternidade de Scully, do sarcasmo de Mulder para mascarar o horror do que o ser humano é capaz ou até a maneira como a câmera foca em fechaduras e maçanetas para mostrar que o mundo não é o lugar seguro e belo como alguns imaginam, provam que o episódio é mais do que apenas um banho de sangue. 

Arquivo X é uma das séries mais criativas da ficção científica, sempre procurando por respostas e mostrando que talvez as maiores ameaças (ou monstros da semana) já estejam entre nós, não precisamos procurar a verdade lá fora. 

Arquivo X
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Literatura

Ubik | Entre a vida, morte e a realidade

“Eu tenho vida”

Philip K Dick talvez seja meu autor favorito, o que não o isenta de ressalvas, como a maneira que costuma negligenciar o desenvolvimento de alguns personagens ou simplesmente os transforma em um narrador sem personalidade. Mas eu não comecei essa resenha com uma afirmação tão positiva sobre ele para deixar de mencionar o que fez para merecê-la. Os textos de Dick se apoiam em conceitos únicos, vindos de uma mente pouco convencional, e o que ele faz melhor é explorar temas complexos de maneira objetiva, criando um debate como poucos conseguem.

Romances como Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? ou O Homem do Castelo Alto conseguem se desvencilhar dos problemas que mencionei no parágrafo anterior, trazendo personagens mais envolventes e ativos, e depois de ler Ubik, tenho mais um exemplo de como o autor nem sempre cai na mesma armadilha. Lançado originalmente em 1969, no ano da eleição de Nixon e em meio à primeira retirada do exército Norte-Americano da Guerra do Vietnã, Philip K Dick decide conceber uma obra sobre o que entende melhor: questionamentos sobre a nossa realidade e espionagem corporativa, sem contar um pouco de religião e poderes mentais.

A obra se situa em uma Nova York de 1992 habitada por humanos que desenvolveram habilidades psíquicas ou conseguem se relacionar com o tempo de maneira diferente (eles tecnicamente não viajam no tempo, então prefiro deixar a definição dessa maneira). Em um mundo onde poderes como esse podem ser utilizados para manipular a realidade de seus adversários, muitas vezes com propósitos corporativos, algumas empresas oferecem um serviço de proteção, que contrata humanos capazes de neutralizar a ameaça original. Glen Runciter é um dos homens mais poderosos do mundo, responsável por uma dessas empresas, mas há um mistério a ser resolvido, envolvendo o desaparecimento de seus funcionários. Para ajudá-lo, o técnico Joe Chip parte em uma investigação que pode alterar toda a realidade.

Além da premissa mais “policial” do livro, PKD também explora temas de religião e até vida após a morte através de um conceito de meia-vida no qual a consciência de pessoas que já faleceram pode ser preservada para que seus contatos possam se comunicar, isso por conta de um serviço oferecido, novamente, por uma empresa. Fica clara a intenção do autor em comentar o avanço de grandes conglomerados e o impacto da propaganda no cotidiano, tanto que cada capítulo é apresentado com um texto publicitário sobre algum produto inovador, todos com o mesmo nome: Ubik.

Capa Ubik

Mors certa et hora certa

Há muito mais elementos apresentados no romance, como uma viagem à lua (talvez a promessa do homem na lua tenha o influenciado nesse aspecto) ou a esposa em meia-vida de Runciter, mas é Joe Chip o verdadeiro protagonista, correndo contra o tempo para descobrir o que está acontecendo, sem certeza sequer de que seu mundo continua real. Essa é uma das brincadeiras favoritas de PKD, alternando entre tempo e espaço e experimentando com a percepção do leitor, que nunca sabe se pode confiar no que está escrito.

Também podemos encontrar referências diretas com outros textos do autor, como a presença de precogs, aqui extremamente relevantes para o enredo, mesmo que indiretamente. Os precogs são humanos com habilidades mentais avançadas, capazes de observar o futuro, o que cria uma das sequências mais criativas do livro, envolvendo uma conversa entre Joe e Runciter através de um anúncio na TV. São momentos como esse que evidenciam a escrita quase cinematográfica de Dick, descrevendo ações como uma voz fora de sintonia com o movimento da boca ou um corpo tentando fugir da realidade.

Alguns leitores podem pegar uma obra como essa e considerar sua proposta desconfortável, isso porque o autor não faz questão de entregar uma narrativa comum, nem mesmo se importa em construir tramas incontestáveis, nos deixando com um exercício mental sobre o que consideramos real ou não. Terminamos o livro com mais questionamentos que antes, e esse pode ser o verdadeiro objetivo de Philip K Dick, abrir nossas mentes para tudo o que pode ser. Isso é apenas o começo.

Ubik

Ficha Técnica:
Título Original: Ubik
Editora Aleph, 2019
Tradução de Ludimila Hashimoto
Arte de Rafael Coutinho e Giovana Cianelli
240 Páginas.

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