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A Ficção Científica no Cinema | Retrospectiva 2019

Para a última matéria do ano, decidi fazer a retrospectiva com produções sci-fi que conseguiram se destacar, positiva ou negativamente. Tivemos um ano com boas produções, talvez melhor que o anterior, e mesmo que alguns desastres tenham chegado às salas de cinema (ou no conforto da sua casa, com algum serviço de streaming), há mais vitórias que derrotas.

Antes de começar, vale mencionar que as obras destacadas (em negrito), boas ou não, correspondem ao gosto de quem escreve essa matéria. Vamos lá.

Os Desastres

Mesmo com boas produções, esse foi o ano em que a Netflix decidiu colocar em seu catálogo os filmes IO, com uma premissa genérica que desperdiça o tempo da atriz Margaret Qualley, e a comédia Fim do Mundo, que considera citar referências de outros filmes (melhores) constantemente e depender de humor barato, algo engraçado. 

Mas saindo da Netflix, esses dois exemplos não chegam perto do desperdício de tempo e dinheiro chamado Cópias – De Volta à Vida, estrelado por Keanu Reeves. 

Cópias - De Volta à Vida
Cópias – De Volta à Vida

O problema do filme não é ter todos os elementos mais batidos do mundo para a construção da trama (acidente de carro, corporação do mal…), mas sim não saber usá-los. Eu não vejo problema algum em ter um roteiro simples e direto ao ponto, mas se você não for consistente com cada uma das coisas que apresenta, o resultado é um produto vazio e tedioso.

Cópias erra em quase todos os aspectos, o primeiro deles sendo a direção de Jeffrey Nachmanoff, que não só depende demais de movimentos de câmera desnecessários, como o excesso do ângulo holandês (dutch angle para o pessoal internacional), presente em cenas onde não só destroem a tensão que o longa tenta construir, mas distraem pela maneira nada natural com a qual Nachmanoff aborda as cenas. Esse é mais um filme genérico e previsível que poderia ter sido lançado direto em algum streaming e ainda assim, não recomendaria.

Outra produção que não conseguiu convencer o público foi o retorno da franquia MIB: Homens de Preto, com o filme MIB: Homens de Preto – Internacional, estrelado por Tessa Thompson e Chris Hemsworth, a direção ficou por conta de F. Gary Gray, responsável pela comédia Friday (Sexta-Feira em Apuros, no Brasil), que parece não ter dado conta de uma franquia grande como essa. O desastre foi público e crítico, e o filme quase não apareceu nessa lista por ser tão esquecível. 

E infelizmente, uma outra grande decepção veio estrelada pelo ex-protagonista de MIB, Will Smith. O ator não parece conseguir uma nova produção que carregue a aclamação do começo de sua carreira, mas ele continua tentando, e por isso se reuniu com o ótimo diretor Ang Lee, de O Tigre e o Dragão e As Aventuras de Pi, para um novo blockbuster de ação que prometia trazer de volta um sucesso de bilheteria e público para o ator. 

Com Projeto Gemini, Ang Lee explora a velocidade de fotogramas (ou frame rate), e tenta gravar o filme em 120 quadros por segundo (ou fps), o que altera drasticamente a experiência, mexendo com o ritmo e a nitidez da imagem, deixando-a tão suave que chega a causar náusea em algumas pessoas. Os cinemas sequer tinham capacidade para passar essa versão do filme em todas as suas salas, então disponibilizou em outras versões, não só a comum, de 24 quadros, mas uma de 60.

Lee já chegou a lançar o filme A Longa Caminhada de Billy Lynn da mesma maneira; mas enquanto esse, um drama de guerra, se beneficia de uma filmagem mais realista por conta da narrativa crua, Projeto Gemini sofre por depender de sequências de ação exageradas e nem um pouco realistas, o que o aumento da quantidade de quadros deixa mais evidente, principalmente em uma absurda sequência envolvendo uma perseguição de motos que desafia várias leis da física. 

Mas não é como se a quantidade de quadros fosse o verdadeiro problema de Projeto Gemini, que traz bons atores como Mary Elizabeth Winstead e Benedict Wong para interpretar um enredo repetitivo e previsível, sem contar que dessa vez Ang Lee parece estar mais cansado que nunca, com uma das direções mais sem identidade do ano. 

Os Sucessos

Saindo das decepções, é hora de abordar o que deu certo esse ano, começando pela ação Alita: Anjo de Combate. Baseada no mangá Gunnm, de Yukito Kishiro, Alita é a jornada de uma ciborgue à procura de sua identidade perdida. É uma premissa conhecida, mas há elementos o suficiente para fazer dessa história algo próprio. 

É uma premissa que envolve batalhas entre outras máquinas e ao mesmo tempo deve desenvolver uma protagonista carismática capaz de carregar uma possível franquia. Por esse motivo entendo a decisão de chamarem alguém como Robert Rodrigues para comandar o projeto. Ele já se provou competente criando boas sequências de ação “cartunesca” com seus Sin City e Machete, mas também sabe apelar para o lado mais infantil, o que ajudou no desenvolvimento de Alita, uma guerreira de personalidade forte, mas com o entusiasmo de uma criança para coisas novas.

Alita: Anjo de Combate
Alita: Anjo de Combate

O filme conseguiu “se pagar” na bilheteria, mas não foi nada estrondoso, o que coloca em risco as chances de uma continuação. Mesmo com problemas, Alita encontrou as pessoas certas para sua adaptação. Até mesmo os olhos grandes tiveram uma explicação mais plausível e aceitável que as modificações de outra adaptação estrelada por um ciborgue, o decepcionante live action de Ghost in the Shell, de 2017.

Dessa vez vou dar crédito à Netflix por ter distribuído algumas produções independentes muito boas. A primeira delas é I am Mother, um filme de menor escala e orçamento relativamente modesto, considerando o que costumam valer outros filmes de estúdios e diretores mais conhecidos. O filme tem a vantagem de poder criar cada um dos seus elementos com mais cautela e sem muita intromissão.

Esse é o primeiro longa do diretor Grant Sputore, mas ele faz um bom trabalho. Há espaço para algumas reviravoltas, o que muitos diretores parecem criar primeiro e montar o filme inteiro em cima delas, mas essa é uma obra onde o enredo e os personagens vem antes, e mesmo que traga algumas características “batidas” de narrativas sci-fi, uma execução limpa e objetiva sempre funciona. Ao lado da direção, a equipe de design merece elogios pela forma como apresentou o mundo do filme e montou o visual dos droides. Uma boa surpresa. 

I Am Mother
I Am Mother

Ao lado de I am Mother, tivemos uma aula de como fazer filmes de baixo orçamento com o ótimo Riqueza Tóxica.  Lançado originalmente em 2018, o sci-fi independente só chegou ao Brasil em 2019, quando a Netflix decidiu distribuí-lo.

No meio de tanta coisa grande saindo nos cinemas, rendendo bilhões nas bilheterias, seja mais um filme da franquia Marvel ou Star Wars (basicamente, tudo Disney), é fascinante ver como uma obra menor, em escala e orçamento, consegue ser tão poderosa. Começando pela sua construção visual, que atingiu uma estética realista e distópica sem precisar do uso de tela verde. A maior parte das filmagens foi realizada em uma floresta conhecida da infância dos diretores, e um galpão precisou ser construído para que a equipe pudesse trabalhar perto do local.

É esse tipo de esforço que me faz apreciar ainda mais filmes assim, onde é visível a importância de ter sido gravado longe de um estúdio, com luz natural, contribuindo para a imersão daquele mundo. Tudo aqui é original: trajes espaciais, armas, ilustrações e até mesmo a poeira. Para que o filme tivesse sua própria identidade visual, os diretores passaram dias explorando maneiras diferentes de representar a poeira rosada que cobre a superfície de uma lua verde.

Riqueza Tóxica
Riqueza Tóxica

Também foi em 2019 que o aclamado diretor Spike Lee produziu uma ficção científica. A Gente se Vê Ontem é o primeiro longa de Stefon Bristol, que tem alguns curtas no currículo e esteve envolvido nas filmagens de Infiltrado na Klan, onde provavelmente conheceu Spike Lee. A Gente Se Vê Ontem é baseado em um de seus curtas de mesmo nome, trazendo de volta a maior parte do elenco para a nova versão.

Esse é um filme carregado de temas pertinentes ao diretor e a comunidade negra, tendo a brutalidade policial como principal objeto de análise. Mas ainda que envolva críticas sociais e um dilema moral por parte dos seus protagonistas, seguimos com um tom leve, que lembra um pouco a sensação de estar assistindo apenas uma produção adolescente. 

Os elementos de ficção científica ficam em segundo plano, mesmo que sirvam para impulsionar a trama. Isso não é um problema, já que o gênero abre as portas para incontáveis interpretações e é uma das melhores opções quando um roteiro precisa de uma alegoria construtiva. Aqui temos viagem no tempo e efeito borboleta para mostrar como a violência contra a comunidade negra não é uma casualidade, envolve uma mentalidade preconceituosa impregnada na sociedade. 

A Gente se Vê Ontem
A Gente se Vê Ontem

Mas a grande surpresa divulgada (mesmo que pouco) pela Netflix esse ano foi o maior sucesso de bilheteria da China nos últimos anos, a jornada espacial Terra à Deriva. Também lançado originalmente em 2018, o filme chegou ao Brasil apenas esse ano, e é um excelente trabalho que funciona em todos os níveis, com sequências de ação angustiantes na superfície e debates sobre culpa e arrependimento nos minutos derradeiros da humanidade.

Frant Gwo assina a direção. Mesmo com poucos filmes no currículo, faz um excelente trabalho. Além de encontrar um ótimo elenco (incluindo Mike Sui, que interpreta Tim e serve de alívio cômico. Felizmente, bem encaixado) e desenvolver alguns visuais impressionantes, Terra à Deriva é o tipo de obra que consegue construir drama envolvente no meio da ação incessante.

Terra à Deriva é uma adaptação do conto literário de mesmo nome do autor chinês Cixin Liu, que ficou conhecido por ter sido o primeiro de seu continente a receber o prêmio de Melhor Romance no Hugo Awards (com o seu “O Problema dos Três Corpos”). O filme foi feito com aproximadamente $50 milhões e tornou-se um sucesso rendendo quase $350 milhões de bilheteria apenas em seu país de origem. 

Terra à Deriva

Continuando fora do mercado norte-americano, vale mencionar o misterioso drama brasileiro Divino Amor, sobre um futuro teocrático absurdo, mas nem um pouco impossível considerando a crítica que estão fazendo usando o paralelo da presença de uma “bancada evangélica” no congresso nacional. A atriz Dira Paes apresenta uma personagem que combina carisma e intimidação, mas é complexa o suficiente para entregar certa fragilidade.

Ainda que 2019 seja o ano de Bacurau, que tecnicamente entra em ficção científica por ser uma narrativa em um “futuro distópico”, Divino Amor explora mais o gênero, com sua ambientação de neon e construção de mundo mais futurista. Essa obra prova que o cinema brasileiro, além de inteligente em enfrentar os obstáculos que o próprio país coloca em sua frente, consegue ser original, independente do gênero. 

Vale lembrar aqui que algumas obras provavelmente não chegarão aos cinemas ou serviços de streaming brasileiros, então decidi usar esse espaço para mencionar duas obras mais introspectivas, que receberam pouca atenção da bilheteria. A primeira é High Life, estrelada por Robert Pattinson, que tecnicamente é mais uma da lista lançada em 2018, em festivais, mas chegou aos serviços de mídia digital com certo atraso. Indo para o segundo exemplo, tivemos Lucy in the Sky, dirigido por Noah Hawley, responsável pelas séries Legion e Fargo

Os dois filmes souberam explorar o formato um pouco melhor, ao contrário do que aconteceu em Projeto Gemini. Eles brincam com a estrutura e linguagem do cinema, e mesmo que a alternância na razão de aspecto em Lucy in the Sky distraia um pouco, não deixa de ser criativa. O enredo das duas obras segue uma premissa simples, mas se aproveita dos atores para entregar um estudo de personagem mais envolvente, seja a solidão do espaço sentida por Robert Pattinson em High Life, ou a solidão na Terra, por não estar mais no espaço, de Natalie Portman, como a protagonista em Lucy in the Sky

A Grande Obra do Ano

É arriscado afirmar que uma obra de arte tenha se expressado melhor que outra. Na verdade, é impossível. Todos temos reações e impressões diferentes por conta de nossos gostos, mas existem conquistas técnicas e narrativas que ficam visíveis em um filme, e talvez Ad Astra: Rumo às Estrelas represente isso melhor que os outros filmes da lista. 

Pouco pode ser dito sobre a proposta da obra sem entregar detalhes relevantes da trama, que apresenta sequências de ação impressionantes ao lado de um ritmo mais vagaroso. Isso pode soar como um contraste capaz de colocar a experiência do filme em risco, mas tudo funciona perfeitamente. 

Ad Astra: Rumo às Estrelas
Ad Astra: Rumo às Estrelas

Seguindo uma trajetória contrária do que se espera de um filme grande como esse no atual contexto das salas de cinema, Ad Astra se distancia completamente de sucessos como Interestelar, de Christopher Nolan, e tem mais interesse em uma condução que ecoa melhor os longa-metragens de ficção científica do diretor russo Andrei Tarkovski, como Solaris ou Stalker.

Ad Astra é uma experiência diferente, a jornada solitária de um homem com um dilema universal. Aqui podemos ver como a humanidade conquistou a lua e até Marte, mas continua olhando para o céu na esperança de nova vida, esquecendo a que já possui.

O que achou da lista?
Se concorda, discorda ou acha que faltou algo, é só deixar nos comentários.

2020 promete ser ainda mais agitado, com a chegada de filmes como O Homem Invisível, The Tomorrow War, o atrasado Chaos Walking, e a tão aguardada adaptação de Duna pelo diretor Denis Villeneuve. O problema agora é esperar. 

Até a próxima!
Vida Longa e Próspera 🖖

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Séries

A Ficção Científica em Séries | Retrospectiva 2019

2019 foi um bom ano para a ficção científica. Ainda que uma série ou outra possa decepcionar ou ser simplesmente ruim, no geral, foi um ano com o retorno de nomes fortes e a estréia de alguns que prometem evoluir bastante, sem contar as minisséries que, até o momento (nunca se sabe quando um estúdio pode encomendar uma segunda temporada), entregaram uma história impressionante. 

Antes de começar a lista, vale mencionar que as séries destacadas, boas ou não, correspondem ao gosto de quem escreve essa matéria. Também serão válidas apenas as temporadas lançadas esse ano (se ela não tem data para sair no Brasil, considero o lançamento no país original), e aquelas que eu assisti em sua totalidade, então vou deixar logo algumas menções honrosas de séries que comecei, mas ainda não terminei, como a terceira temporada de Stranger Things e The Handmaid’s Tale, assim como a estréia das séries Osmosis e Raising Dion. As duas começaram muito bem, mas por motivos de agenda e a confusão de tanto material para ler / assistir / resenhar, acabei deixando elas para depois.

Outros exemplos, como a aclamada Dark, não entram na lista pelo simples fato de eu ter demorado demais para começar a assistir, então ainda estou no começo (mas o pouco que vi já achei muito bom). Independente disso, a lista está longe de ser pequena, e mesmo com alguns exemplos de “séries ruins”, felizmente a maioria teve um resultado positivo. 

A lista segue uma ordem de pior para melhor série, então vamos começar logo indo das decepções do ano, chegando aos poucos nas obras que melhor representaram o gênero ou foram simplesmente excelentes. 

The I-Land e Another Life (Estréias)

As duas piores do ano dividem a posição por terem problemas similares. Enredos mal executados, personagens sem desenvolvimento e dramas forçados ao ponto de beirar o ridículo, tanto que cheguei a fazer uma matéria apenas para destacar o que deu errado nas duas séries, e na maneira como a Netflix vem abordando algumas produções de ficção científica. 

É uma pena ver uma atriz boa como Katee Sackhoff interagindo com personagens tão ruins (destaque para a palavra “personagens”, isso porque a culpa é exclusivamente do roteiro, já que alguns nomes do elenco já estiveram bem em outras produções) em Another Life; e The I-Land não foge da bronca por ter basicamente copiado a estrutura narrativa e vários elementos de Lost, incluindo a premissa. Duas grandes decepções, mas agora é hora de começar a tirar o gosto ruim da boca e partir para algo um pouco melhor.

Love, Death & Robots (Estréia)

Love, Death & Robots

A proposta de Love, Death & Robots é bem criativa. Uma série em formato de antologia contendo dezoito curtas com temática sci-fi, por diferentes artistas. Criada por Tim Miller, de Deadpool, e David Fincher, de Clube da Luta, você pode ir alternando entre os curtas sem problema, já que eles não possuem qualquer ligação narrativa. É claro que em uma coletânea de dezoito histórias, algumas podem ser menos interessantes, outras podem acabar se tornando repetitivas, mas as que funcionam, funcionam bem.

Você pode saber mais sobre cada um dos curtas em um vídeo feito para o canal do Primeiro Contato. 

Black Mirror (5ª Temporada)

Black Mirror

Para sua quinta temporada, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente considerando que todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série.

A série parece estar um pouco perdida em alguns momentos, e entrega um de seus episódios mais fracos, Rachel, Jack and Ashley Too. Mas há casos onde Black Mirror continua surpreendendo o público com uma premissa original, como em Striking Vipers; ou quando não é muito original, compensa com boas atuações e tensão, o que acontece em Smithereens

Além da Imaginação (Estréia)

Além da Imaginação

Um clássico está de volta. Jordan Peele, diretor de Corra e Us, assume o posto de anfitrião da série, e mesmo que Rod Serling, o apresentador original, seja insuperável, Peele faz um bom trabalho. Em uma temporada com dez episódios, Além da Imaginação pode ter um retorno um pouco turbulento, com pequenos tropeços ao longo do caminho, mas no geral consegue se salvar trazendo narrativas relevantes e com premissas instigantes. 

Ainda que em seu último episódio a série tenha uma reviravolta um pouco desnecessária, ela deixa um indício de que a segunda temporada pode ser um pouco mais livre para explorar as bizarrices que a série clássica adorava, o que esse remake parecia ter um pouco de vergonha. Você pode assistir os vídeos sobre cada um dos episódios no nosso canal

His Dark Materials (Estréia)

His Dark Materials

Com um elenco impressionante, incluindo nomes como James McAvoy e Lin Manuel Miranda, His Dark Materials é a promessa de uma adaptação mais fiel e competente da série de livros de mesmo nome, que recebeu uma versão esquecível para os cinemas, em 2002, levando o título do primeiro livro, A Bússola de Ouro

A primeira temporada tem apenas oito episódios, e é uma pena que demore para realmente engatar na trama, que começa apresentando muitas informações, mas explorando-as bem pouco. Felizmente, quando as coisas entram no eixo, His Dark Materials pode brilhar além de suas ótimas atuações e efeitos especiais de qualidade, provavelmente os melhores do ano.  

Star Trek: Discovery (2ª Temporada)

Star Trek: Discovery

Não é uma lista de ficção científica sem um pouco de Star Trek. A segunda temporada de Discovery se arrisca brincando com o passado e estabelecendo um novo futuro, mas ainda tem seus pequenos problemas, como subtramas mal valorizadas ou diálogos ruins. Ainda assim, Discovery continua uma boa escolha para matar a saudade da franquia, com alguns episódios que seguem a essência da série, como New Eden, dirigida pelo veterano Jonathan Frakes. 

Depois de uma primeira temporada inconsistente, havia uma preocupação para o que viria neste segundo ano, principalmente depois do season finale da temporada anterior introduzir a clássica NCC-1701, capitaneada no momento por Christopher Pike (Anson Mount). E por falar em Anson Mount, o rapaz foi tão bem aceito pelos fãs que a ideia de um spin off surgiu antes mesmo da temporada acabar. 

Undone (Estréia)

Undone

Após terem escrito o sucesso Bojack Horseman, da Netflix, os roteiristas Kate Purdy e Raphael Bob-Waksberg (também showrunner da série), decidiram desenvolver uma nova produção, com um formato diferente e para outro serviço de streaming, dessa vez a Amazon Prime Video. A minissérie Undone é um drama peculiar em sua apresentação, envolvido em elementos de ficção científica.

Trazendo a atriz Rosa Salazar como protagonista, e utilizando rotoscopia, uma técnica onde as filmagens com atores são aproveitadas para que novos quadros sejam desenhados “por cima delas”, Undone foi uma das maiores surpresas do ano, e um grande acerto da Prime Video, apresentando uma experiência arriscada, capaz de distrair e distanciar alguns não acostumados ou satisfeitos com a técnica (o que não é o meu caso), mas que ainda funciona muito bem como a jornada de uma jovem descobrindo sua própria identidade enquanto encara o desafio da aceitação. Leia nossa crítica completa da temporada

Rick and Morty (4ª Temporada)

Rick and Morty

Colocar Rick and Morty nessa lista é trapacear um pouco, já que apenas metade da temporada foi lançada esse ano, enquanto a outra chega apenas em 2020. Mas tecnicamente, os cinco episódios da série liberados esse ano são o que tivemos de Rick and Morty, e qualquer coisa dessa animação já vale a pena ser mencionada. 

Depois de uma terceira temporada com recepções mistas (por conta de problemas no estúdio, atrasos e mudanças na sala de roteiristas, e por aí vai), Rick and Morty volta mais forte mostrando que consegue equilibrar narrativas originais e entregar um pouco do que os fãs querem, mesmo que na maioria dos casos esteja fazendo piada deles (apenas aqueles que merecem a zombaria, como quem sobe no balcão do McDonalds pedindo um sachê de molho que a série menciona em um episódio). 

Com episódios satirizando narrativas diversas, e voltando bem mais politizada, a série retoma um pouco de fôlego. Você pode ler as críticas de cada um dos episódios no site.

The Expanse (4ª Temporada)

The expanse

Depois de ser cancelada injusta e prematuramente pelo canal SyFy quando acabou de entregar uma ótima terceira temporada, The Expanse conseguiu um novo lar no serviço de streaming da Amazon, o Prime Video. O mais impressionante não é apenas o fato de ter sido renovada para uma quarta temporada, mas por continuar com uma base de fãs forte e críticas positivas sendo uma série de ficção científica mais “pesada” no meio de tantas produções de maior nome. 

Com essa mudança, alguns poderiam ficar preocupados com o rumo tomado pela série, ainda mais com a redução de episódios por temporada, indo de treze para dez (como foi em seu primeiro ano), ou ter que mexer nos cenários e agendas de elenco. Felizmente, a maioria dessas preocupações foram desnecessárias e tivemos um ótimo retorno para uma das melhores séries da atualidade

Legion (3ª Temporada)

Legion

Em um mundo cheio de adaptações de quadrinhos no cinema e na TV, tivemos dois destaques positivos, e o primeiro deles é Legion, que teve sua terceira e última temporada esse ano. Enfrentando a baixa audiência e orçamento modesto, o criador Noah Hawley conseguiu descobrir maneiras de criar uma despedida justa para um personagem complexo como David, o protagonista interpretado por Dan Stevens. 

Ambientado no universo dos X-Men, da Marvel Comics, Legion conta a história de David Haller, o filho do líder dos mutantes, Charles Xavier, lidando com seus demônios interiores, literalmente. Com um enredo bizarro, excelente direção de arte e um bom elenco, Legion pode ter passado despercebida por alguns, mas é uma das melhores séries do ano.

Watchmen (Estréia)

Watchmen

Uma das maiores surpresas do ano é Watchmen. E eu não digo isso por terem feito mais um derivado do quadrinho original de Alan Moore e Dave Gibbons, também não é por ser no formato de série para HBO, o que realmente surpreendeu o público é como a adaptação funcionou bem. 

Aproveitando os temas e os debates políticos do quadrinho, o criador da série, Damon Lindelof, seguiu o caminho da renúncia por uma versão completamente submissa ao material original, mas ainda assim respeitando a linguagem de Moore, sem idealizar seus personagens, mostrando como realmente poderia ser um cotidiano entre mascarados.

Um elenco perfeito, enredo de primeira e a maravilhosa trilha sonora da dupla Trent Reznor e Atticus Ross fizeram de Watchmen o melhor lançamento da HBO esse ano. 

Leia a resenha de todos os episódios.

The OA (2ª Temporada)

THE OA

Criada pela genial Brit Marling, The OA se posiciona como uma das produções mais originais atualmente, e eu ouso arriscar que é o mais próximo que teremos de algo no nível de Twin Peaks (que saudades de você!). Essa segunda parte (como chamam as temporadas) mescla alguns gêneros sem perder seu ritmo. A ficção científica ainda é uma base para a série, mas o misticismo, já presente antes, agora tem um papel ainda maior na jornada. 

O que transformou The OA em um evento para mim é a forma como alterna organicamente entre gêneros, traz personagens envolventes e abraça cada pedaço da trama, até aqueles que podem soar vergonhosos à princípio, mas que logo se revelam um momento executado com tanta honestidade e vontade de inovar que te faz admirar a produção com mais força. 

Meticulosa em cada elemento, The OA é facilmente a melhor série de ficção científica do ano.

Leia a crítica completa.

I'm alone. I can do it alone.

O que achou da lista?
Se discorda, concorda ou acha que faltou algo, é só comentar abaixo. 

Felizmente, esse foi um bom ano para o gênero na TV e nos serviços de streaming, e pelo que vi das estréias de 2020, o próximo ano parece ainda melhor.

Até a próxima. Vida Longa e Próspera 🖖

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Cinema

Star Wars Precisa Mudar – Episódio I: A Caixa de Mistérios Contra-Ataca

Quando J.J. Abrams foi definido como o diretor de Star Wars: O Despertar da Força, de 2015, eu fiquei um pouco preocupado. Considero Abrams um diretor competente, mas apenas quando está responsável pelos elementos visuais, longe de roteiros, isso porque ele emprega uma técnica narrativa em suas produções que não me agrada nem um pouco, mas já vamos chegar nisso. Minha preocupação não era comigo mesmo, não sou muito apegado ao universo de Star Wars, mas com o rumo que a franquia poderia levar.

O Despertar da Força foi o retorno da série de filmes depois de uma década, e a pressão era grande em cima do estúdio, que tinha o trabalho de agradar todos depois da recepção amarga da trilogia de prequels (Episódios I, II e III), além de conquistar um novo público consumidor querendo seu próprio Star Wars. O estúdio precisava de alguém capaz de apelar para a nostalgia dos fãs mais antigos e renovar a space opera de George Lucas para uma nova geração, e não há nome mais apropriado para tomar conta dela que Abrams, responsável pelo remake de outra franquia espacial clássica, Star Trek, em 2009.

A abordagem de Abrams para Star Trek não foi das melhores, mas ao menos trouxe de volta o interesse pela franquia, e agora temos novamente uma série de sucesso pela CBS, Star Trek: Discovery, e spin offs já começaram a brotar. Na época, o próprio Abrams costumava admitir não ser um grande amante da série, sendo mais fascinado por Star Wars, então podemos imaginar que seu trabalho em Trek serviu como um currículo para a franquia que realmente gostava. Assim, a recepção de O Despertar da Força pelo público foi mais que positiva, arrecadando bilhões em bilheteria. 

Star Wars

Com a confirmação da continuação, Os últimos Jedi, a direção ficou por conta de Rian Johnson, mais conhecido por seu filme Looper: Assassinos do Futuro, de 2012. Dessa vez, o público parece ter se dividido entre aqueles que sentiram falta da reverência ao material clássico de Abrams, e os impressionados pela subversão de Johnson, mostrando que a série pode seguir em frente e sobreviver com novas tramas, mas o que parece ter incomodado mesmo foram algumas decisões de elenco e execução de alguns personagens. Mas também já vamos chegar lá.

Para “consertar” a visão de Johnson e retornar para um longa que agrade mais o público, Abrams retorna para a direção e entrega A Ascensão Skywalker, que surpreendentemente acaba dividindo ainda mais os fãs, com uma metade feliz pelo retorno ao estilo J.J. Abrams, e outra incomodada pelo filme negar os eventos de Os últimos Jedi.

Essa é uma contextualização básica da recepção da nova trilogia de Star Wars, e agora que assisti tudo posso dizer o que realmente me incomoda na franquia, principalmente nos últimos anos. Vamos por partes:

A Caixa de Mistérios de J.J. Abrams

Star Wars

“Eu nunca fui bom com desfechos. Eu sei como começar uma história, mas terminar é difícil” (ABRAMS, 2019)

J.J. Abrams foi um dos palestrantes do famoso evento TED Talks em 2007, e foi durante sua apresentação que introduziu ao público um conceito que costuma chamar de “Caixa de Mistérios”, uma técnica narrativa onde “o mistério é mais importante que o conhecimento”. Seu processo consiste basicamente de pegar uma “questão fundamental”, que nos levará a um questionamento, e depois outro, e por aí vai. É uma boa tática para atrair o interesse do público, principalmente se você quiser convencer alguém de uma premissa, mas há um problema na técnica de Abrams, que fica tão interessado em criar suspense e mistérios, mas acaba esquecendo do resto, resultando em tramas mal executadas. 

O seu trabalho como co-criador de Lost, ao lado de Damon Lindelof e Jeffrey Lieber, foi o primeiro a chamar atenção considerável do público. Cada temporada foi desenvolvida usando a “Caixa de Mistérios” de Abrams, e a recepção negativa de grande parte do público e crítica se dá por conta da conclusão da série, que parece ter amarrado suas pontas da maneira mais “conveniente” possível. Esse caso pode ser apenas uma coincidência, mas se estiver procurando um exemplo de péssimo uso da técnica do diretor, é só assistir Star Trek: Além da Escuridão

Por mais que continue com o bom elenco do primeiro filme e seja uma aventura divertida e com boas sequências de ação, o enredo de Além da Escuridão poderia ser melhor resolvido sem todo o mistério que envolvia a verdadeira identidade de um personagem interpretado por Benedict Cumberbatch. Depois de tantas informações sobre bastidores, e considerando o repertório limitado de Abrams da franquia, as teorias sobre o personagem “secreto” de Cumberbatch revelaram o quão óbvia era a solução para o mistério. E mesmo que você não saiba quem ele é de antemão, o filme passa a sua maior parte escondendo a identidade do personagem, mas no fim isso não é algo que afete os temas do longa, vira apenas referência.

Com O Despertar da Força, Abrams teve a chance de brincar com sua “Caixa de Mistérios”, introduzindo novos personagens, uma protagonista com passado desconhecido, novos planetas, novos conflitos e obstáculos. Isso tudo funciona, e assim acabamos com um filme satisfatório, agradando os fãs de longa data e os recém chegados. Mas no fim, Abrams não assumiu riscos, apenas fez o que faz de melhor, estabelecer elementos da trama, só que isso não é o suficiente. Até mesmo Lawrence Kasdan, roteirista dos episódios V: O Império Contra-Ataca e VI: O Retorno do Jedi, foi chamado para tomar conta do argumento de O Despertar da Força, então as várias similaridades com os filmes clássicos, incluindo a trama sobre explodir a estrela da morte, não são coincidência.

O Controle de Qualidade de Kathleen Kennedy

Star Wars

George Lucas vendeu a sua empresa, LucasFilm, para a Disney em 2012. Com seu afastamento da franquia, Lucas indicou Kathleen Kennedy para o cargo de presidente da nova LucasFilm. Kennedy tem sido a voz de Star Wars na última década, e por mais que a mudança na liderança pareça uma boa ideia para alguns, descontentes com o próprio Lucas, nada mudou de verdade. 

Star Wars costuma ser alvo de críticas recorrentes por suas tramas recicladas ou um universo “pequeno demais” onde todos parecem ser parentes. Essas críticas se aplicam exclusivamente ao filmes, isso porque a franquia se estende por livros, quadrinhos e séries de TV, mas uma das decisões da Disney, agora dona da LucasFilm, foi uma mudança total no que é considerado cânone.

Ignorar grande parte do universo expandido da série acabou limitando ainda mais a franquia, tornando-a refém dos dramas da família Skywalker, perdendo a chance de explorar novos personagens. Para piorar a situação, Kennedy desconsidera completamente qualquer material de Star Wars que não sejam os filmes, e usa isso como uma desculpa para mostrar como “é difícil achar novas ideias para a franquia”. 

“Cada um desses filmes é particularmente difícil de fazer. Não há material original. Não temos quadrinhos. Não temos grandes romances. Não temos coisa alguma além de contadores de história apaixonados se unindo para falar sobre o que o próximo filme pode ser” (Kennedy, 2019)

Ainda que não esteja interessada em seguir um rumo diferente com a franquia, Kathleen Kennedy costuma elogiar constantemente o filme Os Últimos Jedi

Episódio III: O Despertar da Força para Rian Johnson

Star Wars

Rian Johnson tomou conta da direção da continuação de O Despertar da Força, e entregou o polarizante Os Últimos Jedi, em 2017. Por mais que parte do público esteja indignada com a subversão de expectativa causada pelas decisões criativas de Johnson, mesmo sob o olhar das limitações da Disney e Kennedy, o filme foi um sucesso de bilheteria e crítica, reforçando o poder da franquia, mas isso não é o suficiente para os fãs. 

O filme tinha a tarefa de continuar todos os pontos da trama deixados em aberto por J.J. Abrams, como a verdadeira identidade dos pais de Rey e seu encontro com Luke Skywalker, assim como os planos de Snoke e a Primeira Ordem. Para Johnson, a solução foi simplesmente acabar com todos os questionamentos e surpreender o público, positivamente ou não, mostrando o desprezo de Luke pelo seu próprio sabre de luz, revelando que os pais de Rey foram apenas catadores que a abandonaram, e tirando do caminho a ameaça de Snoke. 

Com uma narrativa sobre a importância de fracassar e aprender a seguir em frente, Os Últimos Jedi não é bem recebido por uma grande parcela dos fãs, e o próprio J.J. Abrams mostrou seu descontentamento dizendo que não acha que as pessoas estejam interessadas em ir ao cinema para descobrir que nada importa.

Mesmo com uma boa bilheteria e crítica, a recepção do público fez com que Kennedy e Disney decidissem chamar J.J.Abrams de volta para dirigir o último filme da trilogia, A Ascensão Skywalker.

Eu tenho um mau pressentimento sobre isso, mas tudo será esclarecido no Episódio II deste texto, onde finalmente falamos do novo filme, mais bastidores e o que Star Wars, e a Disney, vem fazendo de errado.

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Os Melhores Filmes SCI-FI da Década

Toda lista de “melhores da década” é uma tremenda responsabilidade, mas a década de 2010 foi bastante generosa com a ficção científica, então talvez a maior tarefa aqui seja escolher apenas aqueles que melhor representam o gênero nesses últimos anos.

Para começar, vou indicar apenas produções cinematográficas da década de 2010,  e vale lembrar que isso não é um TOP 10, são indicações de obras que marcaram a ficção científica no cinema. Vamos lá!

A primeira coisa que as pessoas costumam ter em mente quando pensam em ficção científica é o futuro. Somos fascinados por interpretações diversas do que pode ser o nosso cotidiano em alguns anos, então eu separei algumas produções que falam sobre possibilidades e potencial humano, longas como os intrigantes Interestelar e Gravidade, que mostram como podemos nos comportar sob pressão, ou como a humanidade é capaz de alcançar novos horizontes, em Perdido em Marte. Mas se tem um filme que fez isso de um jeito único, esse é A Chegada.

Também podendo entrar na categoria de filmes de invasão alienígena, esse filme fala sobre a surpreendente chegada de visitantes de outro planeta. Mas não é tão simples assim porque tudo que querem é conversar, e a linguista Louise Banks (Amy Adams) precisa correr para descobrir como se comunicar com estes seres antes que seja tarde demais e o governo faça a única coisa que sabe fazer quando se sente intimidado.

Com um apelo visual de encher os olhos, mas não tão extravagante como os de Christopher Nolan em Interestelar, A Chegada conquista o destaque com uma abordagem muito mais humana e genuína. Com a direção mais sutil e delicada de Denis Villeneuve, que tem um excelente olho para construção de tensão e desenvolvimento da trama, revelando cada elemento com maestria, o filme consegue se elevar ainda mais com a atuação de Amy Adams, que entrega uma personagem realista e convincente o suficiente para te deixar apreensivo em cada uma de suas ações durante as interações com os visitantes. Ela traz o peso dramático necessário para que o filme se torne uma das melhores experiências que qualquer cinéfilo possa ter.

Na sequencia, outra coisa que sempre surge na cabeça de quem começa a pensar em ficção científica são os avanços tecnológicos ou, no caso, coisas como robôs, androides e ciborgues. Bem, essa não foi a melhor das décadas para o gênero, tivemos umas coisas bem ruins como Chappie ou O Agente do Futuro, mas felizmente sobram uma sequência surpreendentemente boa como o original, em Blade Runner 2049, ou o escolhido da vez: Ex_Machina.

Ainda que eu tenha adorado Blade Runner 2049, sem contar que o considero um enorme feito de Villeneuve (olha ele aí de novo), decidi escolher uma produção mais contida, sem necessidade de uma certa bagagem ou repertório. Por isso, por mais que eu adore todo o dilema e os questionamentos existenciais do agente K, nada me preparou para a surpresa que foi descobrir Ex_Machina.

Inventivo, pequeno em escala mas grande em enredo, também traz ótimos visuais, apesar do orçamento modesto. Alex Garland dirigiu um possível clássico do gênero sobre um jovem convidado para a casa de um gênio bilionário excêntrico e doido para apresentar sua mais recente criação: uma inteligência artificial avançada.

Além de todo o debate sobre a evolução humana e robótica, o filme conta com ótimos diálogos e um elenco de primeira, com nomes como Domhnall Gleeson e os iniciantes (pelo menos na época do lançamento) Oscar Isaac e Alicia Vikander, que não estavam tão em evidência em uma era pré Star Wars: O Despertar da Força e Tomb Raider: A Origem.

E se é para fazer pensar, o que o gênero faz como poucos por conta de todas as suas licenças poéticas, vamos então para o departamento da contemplação, com filmes que fazem você ficar por horas pensando no que acabou de ver, isso depois de já ter passado duas horas imerso em uma narrativa que muitas vezes é mais lenta e introspectiva, mas que diz bastante e é poderosa, seja em um simples elemento como a fotografia ou uma interpretação minuciosa.

Nessa década tivemos o maravilhoso The Whispering Star, de Sion Sono, que lembrava uma mistura de Kubrick com Tarkovski – um baita elogio -, o silencioso High Life e o complexo Ad Astra: Rumo às Estrelas, chegando em 2019, bem próximo do fim da década. Mesmo com exemplos tão bons quanto esses, tem um filme que me fez gastar tanto tempo teorizando e procurando por novas pistas em toda cena possível que merece o destaque: Sob a Pele.

Dirigido por Jonathan Glazer, esse é um daqueles filmes que divide opiniões. De um lado, um grupo não está nem um pouco feliz com o ritmo lento e a forma como tudo é subjetivo demais, sem explicações. Do outro lado, o grupo que simplesmente adora quando um filme faz tudo isso, toma seu tempo, se beneficia do silêncio e cria um mundo estranho, mas intrigante, que ganha mais força quando nós podemos interpretá-lo de maneira única. 

Na trama, Scarlett Johansson interpreta uma “figura feminina” que procura e convida homens desconhecidos para sua residência. O que eles não sabem é que ela os leva para outro lugar, um que se eu explicar demais pode estragar a surpresa, então assista sabendo que “coisas bizarras acontecem”. Sob a Pele é uma incrível obra com um visual distinto e criativo, um que você provavelmente já viu em muitas séries e filmes que viriam depois (só as cenas na escuridão eu vi de outro jeito em uns dois filmes e uma série famosa da Netflix que não vou mencionar mas você provavelmente já percebeu pela imagem abaixo).

Se você adora algo mais complexo e quer ficar totalmente imerso no que está assistindo, assim como os personagens do filme, essa é uma ótima escolha e um estímulo cerebral que pode ser prazeroso… ou uma dor de cabeça. Eu fico com a primeira opção.

Agora chega de ficar só no papo e vamos para a ação. Eu não coloquei filmes de super-heróis aqui, o que alguns consideram ficção científica, mas eu acho que merecem uma lista própria, então até adaptações dos quadrinhos como Dredd (que é ótimo) ficam fora da lista, mesmo sendo mais sci-fi do que os outros. Mesmo com exemplos como Ataque ao Prédio, Upgrade, No Limite do Amanhã e Círculo de Fogo, do queridíssimo Guilhermo Del Toro, nada é tão espetacular quanto testemunhar a loucura de Mad Max: Estrada da Fúria.

Planejado para ser uma sequência de perseguição contínua, George Miller, responsável pela trilogia Mad Max original, decidiu começar o projeto pelo storyboard e desenvolver o roteiro em cima dele. Este formato fez com que a trama fosse executada de forma dinâmica e o desenvolvimento de personagens fosse muito bem elaborado, dependendo de situações extremas ou raros momentos de descanso. 

Toda a loucura da série e os momentos surreais são mantidos, agora com um orçamento maior, o que deu liberdade suficiente para termos um bando de percussionistas e um guitarrista louco por pirotecnia no meio da estrada (e acredite, neste filme faz sentido, TOTAL SENTIDO). Esqueça longos e desnecessários diálogos explicando a trama e nos lembrando constantemente o que está acontecendo em cena (como um outro diretor já mencionado aqui adora fazer), porque é através dos detalhes que Mad Max: Estrada da Fúria consegue nos conquistar.

Todos adoram uma boa distopia, e por isso a década trouxe Chris Evans tentando descobrir a saída de um sistema opressor em Expresso do Amanhã; a comédia sobre um atendente de telemarketing envolvido em uma guerra entre classes no hilário Sorry to Bother You; um grupo de cientistas liderado por Natalie Portman para desvendar uma anomalia, mas que acaba virando um thriller onde qualquer um pode morrer a qualquer momento, em Aniquilação (dirigido por Alex Garland, o mesmo de Ex Machina, dá pra ver que ele sabe o que está fazendo); ou a angústia de ver Mary Elizabeth Winstead aguentar a tortura mental e a dúvida do que pode acontecer se ela tentar fugir disso em Rua Cloverfield, 10.

Todas produções que você deveria assistir, mas se eu preciso indicar uma imperdível, fico com a trilogia do remake de Planeta dos Macacos.

Se você me dissesse há uma década que eu estaria torcendo e adorando uma franquia onde um bando de primatas em cima de cavalos e armados até os dentes iriam protagonizar um dos filmes mais envolventes do gênero, eu te chamaria de louco. Mas esse remake dos filmes clássicos da década de 1970 consegue se destacar com roteiro bem estruturado, direção competente e excelentes efeitos especiais. Esse último é praticamente fenomenal, com uma atenção aos detalhes gigantesca e realismo como poucas produções tem.

O primeiro filme da trilogia é dirigido por Rupert Wyatt, servindo para estabelecer o protagonista Caesar (Andy Serkis), o primata inteligente, e sua missão para manter a espécie viva. Mas foi na continuação, com Planeta dos Macacos: O Confronto, que o diretor Matt Reeves traz um tom mais sério e dramático para os filmes, com embates memoráveis e cenas de ação intensas. O terceiro e último filme, até o momento, é Planeta dos Macacos: A Guerra, que não tem o mesmo fôlego do anterior, mas ainda assim traz muito do que fez essa trilogia uma das melhores do gênero.

A ficção científica tem outra característica única, onde entra a parte “científica” do gênero, com todos os seus conceitos mirabolantes que fazem parte do mundo dos personagens. É hora de lembrar longas que se apoiam fortemente na subversão do que conhecemos das leis da física, como fizeram as obras A Outra Terra, Coherence, Looper ou O Predestinado. E por mais que alguns tenham problema com Christopher Nolan e sua direção mais objetiva, nenhum filme deixou o público tão apreensivo no cinema quanto A Origem.

Cobb (Leonardo DiCaprio) é um agente que utiliza sua perícia de investigação para roubar segredos corporativos diretamente dos sonhos de grandes magnatas e empresários. Não é todo filme que consegue entreter o público com uma premissa dessas. Mais improvável é como Nolan desenvolve ótimas cenas de ação e perseguição se aproveitando do conceito.

Nenhum dos personagens vai muito além de seus traços de personalidade básicos, com exceção do protagonista, mas o que faz o filme funcionar é como a narrativa é construída e executada sem perder fôlego, tendo que abordar várias tramas paralelas, linhas temporais e camadas de sonho. Parece o pesadelo de qualquer montador na ilha de edição, mas o resultado é um dos filmes mais aclamados pela crítica e público, debatido até hoje por todos que ainda estão na dúvida sobre a estabilidade daquele maldito peão!

Não seria justo fazer uma lista como essa sem incluir o nosso cinema nacional, que tem crescido nos últimos anos, mesmo com todos os obstáculos. Bem no fim da década tivemos o misterioso Divino Amor, de Gabriel Mascaro; um ano antes, foi lançada a comédia A Repartição do Tempo.

O nosso cinema é rico em cultura e, por conta de sua situação política, carregado de comentário social e críticas ao poder, e se eu puder escolher um diretor que representa essa batalha muito bem é Adirley Queirós, um gênero do cinema de Brasília, responsável por um dos melhores filmes da década, a ficção científica Branco Sai, Preto Fica.

A inspiração principal para o filme vem de um incidente da década de 1980, quando policiais invadiram um ginásio referência para os cidadãos chamado Quarentão, onde os jovens costumavam se divertindo fazendo um baile de música negra. A violência dos policiais resultou em várias pessoas machucadas, além de acabar amputando a perna de um dos moradores e deixar outro paralítico.

As duas vítimas assumem a responsabilidade de reviver o trauma atuando no filme, que procura uma forma de reparação ao apresentar uma trama na qual os dois descobrem uma maneira agressiva de se vingar do estado. Queirós usa arquétipos da ficção científica para fortalecer sua crítica e entrega uma obra sem igual.

A ficção científica também pode ser um gênero dramático e cheio de emoção, capaz de deixar um pouco da sua tecnologia em segundo plano e focar nas relações humanas, falando sobre a mais forte delas: o amor. Eu pensei bastante em destacar o subestimado Safety Not Garanteed, mas deixei para o fim uma das produções mais sensíveis dos últimos anos, dirigida por Spike Jonze, o colorido e melancólico Ela.

Joaquin Phoenix interpreta Theodore, um homem solitário que ainda não conseguiu lidar com o fim de sua relação com Catherine (Rooney Mara). Ele não tem muito o que fazer além de trabalhar e jogar videogames, mas sua rotina muda quando se apaixona por Samantha, um sistema operacional que parece preencher todas as suas necessidades, incluindo lhe fazer companhia. É claro que é fácil acabar se apaixonando pelo seu próprio celular quando Samantha é dublada por Scarlett Johansson, mas não é fácil para Theodore lidar com o que está por vir.

Se o elenco, que também conta com Amy Adams, já não te convenceu  —  e deveria, porque Phoenix é um dos melhores atores dos últimos anos  — , Ela tem uma direção simples, mas belíssima, com um tom pastel que acalma e ao mesmo tempo transmite a insatisfação dos personagens.

É um futuro não tão distante, quase utópico em alguns elementos, e isso é destacado na construção de mundo, feita meticulosamente para parecer uma versão mais polida do nosso. A tecnologia é mais insinuante, sem extravagância, está nas estruturas, no design de produção, como o apartamento de Theodore. Tudo isso ao lado do bom enredo e música que elevam a obra como uma das melhores do gênero.

A ficção científica é a escolha perfeita para qualquer obra interessada em explorar o que somos e o que podemos ser. Não importa se estamos na vastidão do espaço ou lidando com a complexidade das nossas próprias emoções, esse é um gênero que está longe de perder fôlego, e essa década foi ótima para os fãs.

Quais foram os seus favoritos, e quais faltaram na lista? Deixe um comentário.

Até a próxima!

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Séries

Rick and Morty | Rattlestar Ricklactica S04E05

Depois de fazer piadas com dragões e gatos no episódio anterior, Claw and Hoarder: Special Ricktim’s Morty, essa semana continua explorando o mundo animal com serpentes alienígenas. O alvo das piadas de Rattlestar Ricklactica envolvem um elemento que a série sempre evitou: a viagem no tempo.

A decisão de negar esse recurso, bastante comum da ficção científica, não se dá apenas pelas possíveis inconsistências de uma narrativa como essa, mas para criar um diferencial entre Rick and Morty e sua principal inspiração, a trilogia de filmes De Volta Para O Futuro, de onde a série tirou sua dinâmica básica, tendo Rick and Morty como uma versão “ridicularizada” do Dr. Emmett Brown e do estudante Marty McFly (Morty é uma clara referência ao nome do protagonista do filme clássico), respectivamente.

Para quem não sabe, a primeira versão da série, quando ainda era um curta para o festival Channel 101 (um projeto de Harmon onde criadores podiam imaginar e executar o programa que quiser), foi uma paródia direta de De Volta Para o Futuro, chamada The Real Animated Adventures of Doc and Mharty, criada por Justin Roiland, que queria literalmente apenas irritar o estúdio Universal. Roiland faz a voz dos dois personagens principais, e comanda até hoje Rick and Morty, ao lado de Dan Harmon. 

Mas por que trazer uma narrativa de viagem no tempo? A série prova constantemente como tem pouco interesse em abordar o assunto, é só prestar atenção na prateleira de ferramentas de Rick, onde uma caixa intitulada “Time Travel Stuff”, ou “Tralhas de Viagem no Tempo”. A resposta mais óbvia, e provavelmente a correta, é para provar como os roteiristas consideram viagem temporal uma ideia ruim. 

Rick and Morty

Em mais uma de suas viagens, Rick nota que o pneu de sua nave está furado, mas pede para Morty ficar no carro enquanto faz o conserto, afinal, o espaço é perigoso. Como esperado, seu sobrinho não segue o conselho e acaba mordido por uma serpente espacial (o que é basicamente uma serpente comum, só que em um traje espacial – não sei se essa descrição foi relevante, pareceu algo bastante auto-explicativo). O veneno se espalha pelo corpo de Morty, mas Rick consegue salvá-lo a tempo depois de descobrir sobre uma civilização de serpentes, bastante similar a nossa, mas apenas em comportamento.

Morty, que acabou matando a serpente espacial, se sente mal e procura uma substituta para enviar ao planeta dela. O resultado é uma confusa sequência de eventos que acaba transformando a civilização serpente em um futuro distópico por conta da guerra entre elas e as máquinas. Enquanto isso, na Terra, Jerry tenta acender as luzes natalinas, mas nem isso consegue fazer sem botar sua vida em risco, e em uma sequência ainda mais confusa, seguimos a jornada de Jerry apanhando em bares e derrubando um avião cheio de passageiros. 

Como deu para notar pela premissa, o título Rattlestar Ricklactica pode até ser uma paródia ao nome da série Battlestar Galactica, mas a principal referência do episódio é a série de filmes Exterminador do Futuro, onde temos a viagem no tempo como principal recurso narrativo, um futuro distópico e um salvador da humanidade, que no episódio desta semana acaba sendo Morty mesmo. 

Rick and Morty

Rattlestar Ricklactica pode confiar um pouco demais na subtrama envolvendo Jerry, que é um ótimo personagem mas não sei o quanto dessa sua “jornada” é realmente relevante para o episódio; ainda assim, é mais um caso similar ao de One Crew Over the Crewcoo’s Morty, onde as piadas são rápidas e há tantas coisas acontecendo em uma cena que a confusão acaba resultando em algo ainda mais engraçado do que o esperado. 

Agora, a temporada vai entrar em uma pausa, e mesmo que ainda não esteja confirmada a data para o lançamento dos próximos episódios, vamos teorizar um pouco e listar algumas referências:

“Show Me What You Got!” | Referências e Teorias

  • Quando Rick descobre ter um pneu furado, mostra que sempre teve um alerta para a situação, mas nunca o usa, isso porque ele vem em um pacote com a voz de celebridades, a de Rick acaba sendo Christopher Walken. Essa parece ser uma menção aleatória até aquele ponto, mas depois, quando Beth está em sua nave, Rick a “paralisa no tempo” com controle remoto.

    Essa é uma referência ao filme Click, de Adam Sandler, onde um homem recebe um controle capaz de rebobinar e adiantar o tempo. No filme, Christopher Walken interpreta o personagem que entrega essa ferramenta para o protagonista. O nome do seu personagem? Morty. 
  • Assim que Morty mata a serpente astronauta, ele menciona como ela pode ser o “Buzz Aspirina”, então Rick o corrige dizendo que o correto é “Buzz Advil”. Essa é uma piada com o astronauta Buzz Aldrin, conhecido por pilotar a Apollo 11, em 1969, e ser considerado o “segundo homem a pisar na lua”. 
Rick and Morty
  • Se sentindo culpado por matar “Buzz Advil”, Morty visita uma loja para comprar um réptil substituto. Entre os produtos da loja, podemos ver (no canto superior direito) o “bom garoto” de propaganda Snuffles em uma embalagem de ração.

    Snuffles foi o cachorro de Morty que acaba atingindo alto nível de QI por conta de um capacete feito por Rick, no episódio Lawnmower Dog, da primeira temporada.
  • Enquanto Morty tenta roubar as naves da nave de Rick sorrateiramente, escutamos um comercial falando algo sobre um produto chamado “Plumbus”. Ele já foi mencionado algumas vezes, principalmente no episódio Interdimensional Cable 2: Tempting Fate, da segunda temporada, onde Justin Roiland passa o maior tempo improvisando comerciais de várias dimensões. A piada é que o público nunca sabe o que o produto faz, e a série brinca com isso dizendo nos comerciais que “todos sabem o que ele faz, então não há razão para explicar”. Você pode assistir o comercial na íntegra, lançado em 2015 no canal do Youtube da Adult Swim:
  • Voltando a falar sobre a caixa de tralhas de viagem no tempo, a “Time Travel Stuff”; quando Rick e Beth retornam de sua procura por Jerry, podemos ver a caixa na estante, onde sempre esteve, intocada. Mas quando uma invasão das cobras ocorre, a caixa está virada, derrubando seu conteúdo. Uma confirmação de que a série sabe o risco que corre em mexer com algo estabelecido desde a primeira temporada. 
  • Na realidade Exterminador do Futuro das serpentes, temos uma viagem aos anos 1985 de sua realidade, e é engraçado ver que nela também tiveram uma versão do filme De Volta para o Futuro, é só ver o pôster no M.I.T. daquela realidade. 
  • Depois de derrotar as cobras, Morty fica preocupado com as repercussões temporais, mas Rick o acalma dizendo que isso é problema dos policiais do tempo, então vemos um dos oficiais chamado Shleemypants, dublado pelo comediante Keegan-Michael Key. A raça de policiais do tempo já apareceu antes, no episódio A Rickle in Time, da segunda temporada.

    Além deles, uma outra alusão visual menor ao episódio A Rickle in Time pode ser vista, quando vários gatos flutuam no exterior do “4º Departamento de Polícia Tempo-Dimensional” (acho que se escreve assim), lembrando a piada literal sobre o dilema “gato de Schrödinger”. 
  • A cena pós-crédito responde o que aconteceu para que o Morty do futuro ficasse com um olho roxo. Por mais que seja apenas uma brincadeira, é curioso como isso pode ser um tipo de ligação com o Morty do Mau, conhecido por usar um tapa-olho nas primeiras temporadas. 
Rick and Morty

Agora é só esperar pela segunda metade da temporada. Enquanto isso, vamos continuar pensando sobre o gato do episódio anterior e o que ele pode representar para o final da temporada.

Até a próxima! 🖖

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Séries Quadrinhos

Watchmen | See How They Fly – S01E09

Uma das maiores surpresas do ano é Watchmen. E eu não digo isso por terem feito mais um derivado do quadrinho original de Alan Moore e Dave Gibbons, também não é por ser no formato de série para HBO, o que realmente surpreendeu o público é como a adaptação funcionou bem. Aproveitando os temas e os debates políticos do quadrinho (sim, quadrinho TEM QUE TER POLÍTICA, não existiria Watchmen sem isso), o criador da série, Damon Lindelof, seguiu o caminho da renúncia por uma versão completamente submissa ao material original, mas ainda assim respeitando a linguagem de Moore, sem idealizar seus personagens, mostrando como realmente poderia ser um cotidiano entre mascarados. 

No último episódio da temporada (até agora, não há confirmação de continuações), intitulado See How They Fly, temos um clímax satisfatório, em um episódio que consegue revelar as peças que faltavam e entregar uma conclusão impactante. Ainda que rápido demais e algumas subtramas tenham perdido um pouco de seu fôlego e outras ficaram um pouco previsíveis por conta da presença de Dr. Manhattan, valeu a pena a jornada, e Lindelof merece alguns elogios por conseguir talvez a única adaptação de Watchmen que traga algo original e realmente compreenda a abordagem de Moore ao universo dos super-heróis, ao invés de apenas tentar manter os direitos do quadrinho nas mãos da DC por mais alguns anos. 

Sem mais delongas, vamos para: 

Sob o Capuz: Referências e Teorias (SPOILERS)

  • Estamos em 1985, assistindo Adrian gravar seu discurso sobre o plano da lula gigante para o futuro presidente dos EUA, mas enquanto ele está distraído com as filmagens, uma faxineira, Bian, consegue invadir o seu escritório, descobrir a senha de seu computador e encontrar várias amostras de sêmen. Ele coleta uma das amostras e usa uma seringa para se inseminar.

    Podemos ver a senha do computador de Adrian, “Rameses II, a mesma que Rorschach e Dan descobrem nos quadrinhos enquanto vasculham entre os livros do homem mais inteligente do mundo. Durante as gravações, podemos ver mais de Karnak, a instalação de Adrian na antártica, e reconhecemos algumas imagens dos quadrinhos, como os relógios e a série de TVs conectadas no salão principal.

    Pulamos para 2008 e Lady Trieu bate na porta de Veidt, em Karnak. Mesmo relutante em receber visitas, Adrian a deixa entrar. Durante sua conversa, várias revelações são feitas, como a ideia da cabine telefônica ter vindo de uma piada de Veidt, ou de todos os recursos de Trieu, um deles sendo um satélite orbitando Europa, e finalmente descobrimos sua motivação. Ela não quer salvar o mundo da Kavalaria, mas sim roubar o poder de Manhattan para si, tentando corrigir tudo que há de errado no mundo. É claro que nem mesmo Adrian considera o plano megalomaníaco de Trieu uma boa ideia. Como se isso não fosse o suficiente, Trieu revela que ser a filha de Adrian. 
  • Estamos de volta ao cativeiro de Veidt, em Europa, e pelo visto as coisas estão indo de acordo com o plano quando uma cápsula espacial desce dos céus para levar Adrian de volta ao planeta Terra. Mas antes de ir, ele precisa enfrentar o descontentamento do Guarda, que atira em Adrian, mas é surpreendido ao ver que seu mestre conseguiu pegar a bala no ar. Nos quadrinhos, Ozymandias faz a mesma coisa, capturando a bala da arma de Laurie. 

    Com a derrota do Guarda, que (sem surpreender o público) também é um dos Sr. Phillips, Adrian segue para a cápsula e faz sua jornada de volta para casa. Temos um salto temporal e estamos no presente, e vemos que a estátua de Adrian na casa de Trieu era LITERALMENTE ele, só que preservado para o momento em que o Relógio do Milênio funcionasse. No meio disso tudo, Bian confirma para Trieu que sabia ser a sua mãe. Essa é uma cena rápida, que infelizmente merecia mais espaço e atenção para ser revelada com calma, o que entra como exemplo da crítica sobre o episódio ser rápido demais. 
  • Retornamos à Tulsa; Temos um rápido vislumbre do reformado teatro Dreamland, agora comandado por Will Reeves, o avô de Angela. Quando os carros de Trieu param na cidade, podemos ver a banca de jornal novamente, onde Bian sempre comprava de tudo para sua Trieu. Ozymandias conversa com o jornaleiro e fica indignado como parte da população já o esqueceu.

    Na conversa, Adrian confirma que “o fim está próximo”. Algo que Rorschach sempre carregava escrito em uma placa nos quadrinhos, enquanto andava pelas ruas sem seu uniforme.
  • É hora de checar como está o plano da Kavalaria. O grupo de supremacistas recebe visitas especiais, uma delas sendo John Keene, o pai do senador Joe, que entra no “evento” fazendo um sinal dos Ciclopes. Laurie assiste a reunião e escuta o discurso de Joe Keene sobre a “dura realidade dos brancos nos EUA”. Depois de obter sucesso capturando Manhattan, Keene tira sua roupa para entrar na câmara de teste, ficando apenas com uma cueca ridícula, bastante similar a utilizada por Manhattan nos quadrinhos.

    Além disso, finalmente tivemos o retorno de Looking Glass, infiltrado entre os membros da Kavalaria. E junto dele, entra Angela, que interrompe o processo tentando evitar um desastre, mas já é tarde demais e Lady Trieu está chegando.

Lady Trieu chega ao encontro da Kavalaria e consegue trazer seu Relógio do Milênio. Laurie reencontra Adrian, que a chama pelo nome original, Juspeczyk; Keene explode na câmara de teste depois de não ter feito todos os procedimentos corretamente. Trieu lê uma carta de Reeves para todos, deixando claro que foi ele quem entregou Manhattan para que ela pudesse, em troca, eliminar a Kavalaria.

Manhattan envia Looking Glass, Adrian e Laurie direto para Karnak, onde Adrian elabora um plano para deter Trieu usando sua chuva de lulas, dessa vez deixando-as congeladas, o que as torna mortais. Ainda assim, é tarde demais para salvar Manhattan, que teve todo seu poder drenado pela máquina de Trieu. Antes de ir, ele se despede de Angela e diz que a manteve ali para que ele não morresse sem ela ao seu lado.

Durante a cena, Manhattan diz estar sendo afetado pela jaula na qual foi capturado. Ele começa a falar coisas aparentemente aleatórias, mas são algumas falas retiradas diretamente do quadrinho. A primeira sobre “tudo que vemos dar estrelas são sua fotografia”, um dos pensamentos de Jon quando chega em Marte na HQ. Depois, ele menciona sobre baixar a temperatura e o nome Janey, que é uma referência ao nome Janey Slater, a namorada de Jon quando ele ainda era apenas um cientista, antes dos poderes de Manhattan.

  • Depois de sobreviver a chuva de lulas que destrói o Relógio do Milênio e enterra Lady Trieu em sua própria criação, Angela vai ao encontro de Will, que está cuidando das crianças dentro do teatro Dreamland. Os dois tem uma conversa franca e Will comenta como “você não pode se curar por trás de uma máscara. Feridas precisam de ar”.

    Quando a família sai do teatro, podemos ver que as letras remanescentes depois da chuva de lulas congeladas formam Dr. M, ou seja, Doutor Manhattan. 
  • Para terminar a história de Adrian, Laurie e Looking Glass, é revelado o paradeiro da Archie original, a nave pilotada por Coruja nos quadrinhos. Adrian a tirou da neve e manteve segura em Karnak. Ele chega a mencionar o sobrenome de Dan, Dreiberg, e menciona como a polícia usou o design original para criar as naves que vimos no começo da temporada. 
Watchmen
  • Chegando em casa, Angela coloca as crianças para dormir e oferece um quarto para Will. Ela limpa a bagunça deixada por Jon no episódio anterior, quando ele tenta cozinhar um omelete mas acaba quebrando alguns ovos. Isso faz com que Angela lembre de um diálogo entre os dois, do episódio A God Walks Into Abar, sobre uma possível transferência de poderes de Manhattan para outro organismo. Ela vai para a piscina, engole um dos ovos e tenta caminhar na água. A temporada acaba.

O que achou da temporada?

Parece que acertamos algumas coisas, mas será que isso é tudo? Além do desfecho ambíguo, alguns arcos dramáticos ficaram em aberto, e as várias menções ao Coruja podem ser mais do que apenas referências, talvez até um indício de possíveis tramas para uma segunda temporada. Mas vai saber.

No fim, Lindelof fez um ótimo trabalho em adaptar uma das maiores HQs da história, criando algo novo e envolvente. Vamos ver o que ele planeja em seguida, e se Watchmen retorna para mais um ano. É só lembrar que “nada acaba”

Até a próxima!

ps: Se você parou para ler o PeteyPedia depois do episódio, descobriu que a banda Nine Inch Nails (liderada por Trent Reznor, compositor da trilha de Watchmen) também existe no mundo da série. Mas ainda mais importante, já não precisa mais se preocupar com a identidade do Homem-Lubrificante. Era Petey mesmo.

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The Expanse S04 | Explorando Nova Terra

Depois de ser cancelada injusta e prematuramente pelo canal SyFy quando acabou de entregar uma ótima terceira temporada, The Expanse conseguiu um novo lar no serviço de streaming da Amazon, o Prime Video. O mais impressionante não é apenas o fato de ter sido renovada para uma quarta temporada, mas por continuar com uma base de fãs forte e críticas positivas sendo uma série de ficção científica mais “pesada” no meio de tantas produções de maior nome. 

Com essa mudança, alguns poderiam ficar preocupados com o rumo tomado pela série, ainda mais com a redução de episódios por temporada, indo de treze para dez (como foi em seu primeiro ano), ou ter que mexer nos cenários e agendas de elenco. Felizmente, a maioria dessas preocupações foram desnecessárias e tivemos um ótimo retorno para uma das melhores séries da atualidade. 

Com o surgimento do Anel, um portal criado por conta da Protomolécula, tudo está diferente. Alianças improváveis e uma “corrida espacial” fazem com que a situação fique mais complexa do que o imaginado. Através do portal, foram descobertas novas possibilidades, milhares de planetas potencialmente similares ao nosso. O primeiro deles é Ilus IV, chamado de Nova Terra pelas Nações Unidas, formado por um gigantesco continente e ilhas separadas por um oceano, mas o problema está nas diferentes nações e facções que assumem o território sem compreender os mistérios envolvendo sua existência. 

The Expanse

Para contribuir com a exploração e decidir a disputa pelo território é designada a tripulação da Rocinante. Holden, Naomi, Amos e Alex estão de volta, mas ainda que a ameaça da Protomolécula pareça estar chegando ao fim, eles continuam em risco. Enquanto isso, do outro lado do Anel, Bobbie lida com dilemas familiares e éticos, Dummer e Ashford mantém a diplomacia entre os belters (habitantes do cinturão) e os inners (habitantes dos planetas do sistema solar: terráqueos e marcianos, na maioria dos casos), e Avasarala enfrenta novos desafios, não só em sua vida política, mas pessoal. 

Para a quarta temporada, a quantidade de episódios reduzida acabou contribuindo para uma temporada mais concisa, usando a corrida contra o tempo para criar sequências de ação muito bem executadas, como a retirada de todos os ocupantes de Ilus, que resultou em uma cena angustiante por conta da música e os efeitos especiais do desastre “natural” que atinge o planeta. Por conta da maior parte da temporada se passar em alguns pontos de Ilus, além da tensão constante, o drama é muito bem desenvolvido. 

Mas não é sempre perfeito. A alternância entre núcleos dramáticos, indo do impasse militar por conta dos representantes de cada nação procurando território em Ilus para os jogos políticos de Avasarala e as descobertas de Bobbie, pode dar a sensação de tramas paralelas um pouco deslocadas, talvez por conta dos temas sobre dilema, traição e orgulho não se aplicarem em todos os arcos de personagens. Esse é apenas um detalhe quando consideramos o enorme trabalho da série em desenvolver cada um desses núcleos com cuidado, sem deixar de lado a atenção aos detalhes que vem acompanhando The Expanse desde o início. 

The Expanse

Com a mesma (ótima) qualidade de roteiro, a quarta temporada continua surpreendendo com novas revelações, seguindo em frente com a narrativa e introduzindo novos personagens, como o chefe de segurança Adolphus Murtry, interpretado por Burn Gorman, que colabora para deixar a situação em Ilus ainda pior com uma sede de vingança depois de perder parte de sua tripulação, aparentemente por conta dos belters que chegaram antes. Ainda que pequenas instâncias de conveniência atinjam o roteiro, sobretudo quando um tipo de cegueira coletiva atinge os ocupantes de Ilus, não é algo que distraia o público. 

Por falar no elenco, é bom saber que ainda temos Thomas Jane retornando como Miller por mais uma temporada, para perturbar a mente de Holden com suas teorias e pistas. Shohreh Aghdashloo é uma atriz magnífica, facilmente a melhor da série, e não deixa de lado seus insultos e a boca suja, ainda mais suja com as liberdades que a série teve depois de assinar com a Prime Video. Se na última temporada Cara Gee foi um dos destaques, dessa vez David Strathairn, intérprete do comandante Ashford, tem seu merecido espaço para brilhar.

The expanse

Mesmo com o orçamento modesto, a série sempre se destacou por efeitos especiais mais do que competentes, e agora que recebeu um melhor investimento, pode exibir grandes sequências de ação espacial, com naves manobrando no fogo cruzado ou as grandes arquiteturas reveladas pela Protomolécula. O design de produção nunca foi tão complexo e a fotografia nunca foi tão bela quanto nessa temporada, principalmente em Nova Terra, com planos abertos revelando sua geografia, dando atenção aos seus desertos e estruturas.

The Expanse termina mais um ano trazendo ficção científica de qualidade, não só por conta de sua precisão científica ou ótimos visuais, mas também pela combinação perfeita entre elenco e roteiro, o que sempre funciona se bem feita, e a dessa série funciona como poucas. 

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Rick and Morty | Claw and Hoarder: Special Ricktim’s Morty – S04E04

Spoilers do episódio. Leia a resenha dos anteriores aqui!

Rick and Morty é conhecida por brincar com o nosso conceito de narrativa, principalmente explorando gêneros diversos com a intenção de tecer alguma crítica ou apenas se aproveitar do formato para criar sua própria história.

Em seu episódio anterior, One Crew Over the Crewcoo’s Morty, os roteiristas se apropriaram de uma trama com todos os elementos de um filme de assalto para explicar a falta de criatividade de algumas pessoas que tentam criar algo dentro do subgênero, e essa semana, com Claw and Hoarder: Special Ricktim’s Morty (trocadilho com o título da série Law and Order: Special Victims Unit), a série decide mexer com os conceitos de fantasia e jogos de tabuleiro, principalmente Dungeons & Dragons.

Para quem não sabe, Dan Harmon tem o costume de fazer piadas com a lista de regras e limitações de qualquer história, então seguir todas as instruções de uma partida de RPG acaba sendo um desafio para ele, que vive pensando em como transformar tudo em uma narrativa, ao invés de apenas seguir com o que foi estabelecido e é proposto pelo Mestre (quem narra uma partida de D&D).

Ao longo do episódio, assistimos Rick brincar com isso ao comentar como sua “magia”, a tecnologia, é melhor porque é real, ou como personagens misteriosos surgem de qualquer canto e poderes curiosamente convenientes podem surgir para ajudá-lo em uma missão. 

Community
Community

Essa não é a primeira vez que Harmon aproveita o sistema de D&D em suas séries, tendo feito os episódios Advanced Dungeons & Dragons, da segunda temporada, ou Advanced Advanced Dungeons & Dragons, da quinta, na sua comédia Community. Quem assiste todas as suas críticas ao formato acaba achando que ele não gosta do jogo, mas Harmon gosta tanto dele que desenvolveu uma animação chamada HarmonQuest, onde convida celebridades para jogar uma partida de RPG narrada pelo seu amigo, Spencer Crittenden.

Em Claw and Hoarder, Morty cobra o favor que pediu à Rick como condição para participar de mais uma missão, e mesmo relutante, Rick cumpre sua promessa: arranja um dragão para Morty. Mas para conseguir isso, você precisa fazer um contrato com um mago, então Morty assina com seu próprio sangue. Assim, Morty e Balthromaw, o dragão, tentam uma relação, mas as coisas não parecem estar indo tão bem entre eles, até que Rick acaba se envolvendo onde não queria. Paralelamente, Jerry começa a conversar com um gato, o que rende algumas situações aparentemente aleatórias, provavelmente estabelecendo algo para o futuro. 

Mais uma vez, na temporada, assistimos Rick construir uma relação “peculiar” com uma nova personagem, dessa vez uma parceria que acaba ficando íntima demais, até para os padrões do cientista que já viu e fez de tudo, incluindo fazer sexo com a população de um planeta inteiro simultaneamente (Auto Erotic Assimilation, da segunda temporada). Essa relação cria uma cisão entre Rick e Morty, que com a ajuda de Summer, precisam procurar o mago responsável pelo contrato do dragão.

Rick and Morty

A jornada deles é cheia de piadas sobre jogos de estratégia, brincando com personagens aleatórios, situações ex-machina ou poderes que não fazem sentido, mas uma das zombarias recorrentes é a comparação de magos e dragões com cafetões e prostitutas, algumas das partes mais engraçadas do episódio. Além dessas piadas, a produção da série aproveita para brincar com a cultura de cancelamento, mostrando que Summer sabe a necessidade de Rick em estar sempre certo, então tentar sujar sua imagem é uma das maneiras mais fáceis de chantagear o avô. 

O lado mais estranho do episódio fica por conta de Jerry, que ao lado de um gato falante, segue em uma viagem para Flórida porque, nas palavras do gato, “lá é um lugar onde as pessoas não fazem perguntas”. Enquanto o humor fica por conta da bizarrice que é ver Jerry aproveitando uma partida de vôlei ao lado de um gato que acabou de conhecer, e NINGUÉM se incomodar com o fato do animal poder falar, essa trama na verdade estava servindo para estabelecer algo que pode se tornar o clímax da temporada, isso porque Rick descobre o segredo do gato, o que não é revelado para nós, mas foi aterrorizante o suficiente para fazer com que Rick passe mal e tente se matar depois do que viu.

Rick and Morty

Em certo momento, Rick verifica suas mensagens e, em um dos vários casos de metalinguagem da série, diz que Jerry e o gato são uma preparação para um “grande final de temporada”. Talvez o segredo do animal seja ainda mais importante do que imaginamos. Mas ainda é cedo demais para especular.

A cena pós crédito do episódio revela o dragão de Morty, que agora não possui mais uma união com ele ou Rick, conhecendo o felino falante, que não mais conversa com Jerry. Os dois parecem se entender, então o gato pergunta quanto tempo demoraria um vôo dali para Flórida. 

Mesmo tendo poucas referências, listo aqui algumas que consegui pegar ao longo do episódio:

  • No começo, quando Jerry comenta sobre o gato falante, Rick diz que essa parece ser só uma história secundária, sem ligação alguma com ele, como “aquela vez em que foi parar em Plutão”. Esse diálogo é uma referência ao nono episódio da primeira temporada, Something Ricked This Way Comes, no qual um debate sobre Plutão ser ou não um planeta acaba fazendo com que Jerry vá parar lá e conheça sua população.
Rick and Morty
  • Durante uma conversa entre Balthromaw e Morty, podemos ver ao fundo duas covas no quintal da família. São nelas que Rick e Morty enterraram seus próprios corpos depois de destruir sua dimensão e tomar conta de outra para viver, no sexto episódio da primeira temporada, Rick Potion #09.
Rick
  • Na sequência em que Rick invade a toca de Balthromaw, podemos ver entre seus tesouros coisas como uma lancheira de Duckman, uma animação adulta sobre um pato detetive; a primeira edição da revista Detective Comics, famosa por incluir a primeira aparição de Superman; um boneco idêntico ao co-criador da série, Dan Harmon; mas a que mais impressiona Rick é uma cópia em vinil do primeiro álbum do rapper Future, assinado utilizando uma mistura de duas drogas que fazem parte da letra de uma de suas músicas, “Mask Off”. Na cena seguinte, podemos ouvir a música enquanto Rick e Balthromaw invadem um zoológico e drogam os animais.
Rick

Parece que estamos tendo, aos poucos, indícios do que está por vir nessa temporada. Talvez uma nova ameaça promete acabar com a paciência de Rick. Vamos continuar assistindo para descobrir. Até lá!

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The Expanse S03 | É lutar ou fugir

Continuando com uma das melhores séries da ficção científica atual, a terceira temporada de The Expanse mergulha em debates políticos e fica cada vez mais perto da guerra iminente entre a Terra e Marte. A temporada também é marcada por alguns saltos temporais que avançam a trama de uma maneira orgânica, e isso apenas beneficia a narrativa, que precisa lidar com as consequências a longo prazo dos encontros da Rocinante. 

Aqui abordamos a segunda metade de Caliban’s War e grande parte dos eventos de Abaddon’s Gate, o segundo e terceiro livros da série The Expanse, respectivamente. E ainda que as conspirações continuem fortes, podemos ver que o principal tema da temporada é a traição e suas consequencias, não importa se para algo no qual acredita ser o melhor para todos, como Naomi faz com seus amigos; ou o melhor para seu próprio nome, como Sadavir Errinwright, que tem seus planos envolvendo a proto molécula revelados. 

Agora temos novas adições ao elenco, como a Dra. e Reverenda Anna Volovodov, interpretada por Elizabeth Mitchell, que traz uma personagem mais centrada e aparentemente imparcial, mas ela logo se mostra mais do que apenas uma figura pública; e além de novidades, há espaço para retornos, mesmo que sejam em forma de visões, e é ótimo ver Thomas Jane no papel de Miller novamente. A maneira na qual foi inserido no contexto atual da série foi uma das decisões inteligentes dessa temporada.

Mas dando destaque para o elenco recorrente, vale sempre mencionar o quão incrível é a interpretação de Shohreh Aghdashloo como a irreverente Chrisjen Avasarala, capaz de roubar a cena de qualquer um. Mas duas personagens tiveram um grande destaque na temporada e exigiram um comprometimento maior, e essas são Naomi Nagata (Dominique Tipper) e Camina Drummer (Cara Gee).

The Expanse

As duas estiveram em um dos núcleos dramáticos mais importantes, lidando com suas decisões com extrema cautela, sabendo que qualquer passo em falso pode estragar o que construíram no caminho. A relação de Naomi com Holden (Steven Strait) acaba se fragilizando, assim como Dummer e Ashford (David Strathairn), e felizmente Tipper e Gee são ótimas atrizes, principalmente considerando a carga emocional que conseguem entregar enquanto precisam manter seu sotaque belta

Deixando o elenco de lado, um departamento que não deixa de me surpreender é o de efeitos visuais, que aperfeiçoou suas sequências de “embate” espacial e mostra uma enorme evolução, arriscando deixar a câmera por mais tempo em elementos que necessitam completamente do CGI para sua execução. 

Mas um elemento que não canso de elogiar é o roteiro, que continua sagaz, com ótimos diálogos, sem medo de construir tensão e entregar revelações que podem alterar completamente o status quo da série. Ainda que tenhamos uma pequena subtrama envolvendo um membro de uma equipe de filmagens, à bordo da Rocinante, que acabou ficando previsível demais, ou episódios em que alguns eventos pareciam um pouco desconexos (talvez culpa maior da montagem, não do roteiro), o texto da série está fazendo um trabalho como poucos de trazer uma produção de hard scifi que merece ser levada a sério. 

The expanse

Com um drama bem estabelecido, trama envolvente e efeitos visuais incríveis (mesmo sem um orçamento gigante), The Expanse merece ser assistida por qualquer fã de ficção científica, e mesmo que o próprio canal SyFy não acredite nisso, a série felizmente foi renovada para uma quarta temporada, pela Prime Video

Continuamos a jornada com Pinus Contorta Rocinante!

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Star Trek: The Motion Picture | O começo de uma nova jornada

Uma década depois do cancelamento prematuro da série clássica em 1969, Jornada nas Estrelas atingiu um espaço onde jamais esteve antes, as salas de cinema. Star Trek: The Motion Picture (ou Jornada nas Estrelas: O Filme) foi uma produção cercada de elementos e decisões curiosas que deixaram alguns fãs confusos, mas a alegria de ver a Enterprise e sua tripulação de volta são o verdadeiro motivo para deixar todos ansiosos durante seu lançamento.

A produção já começou com o pé esquerdo, enfrentando vários problemas, como os atrasos causados pela reconstrução de alguns cenários e modelos da série que agora deveriam fazer parte de um filme com grande orçamento. Além disso, também havia o impasse envolvendo o elenco, como William Shatner e Leonard Nimoy, que tentavam se distanciar dos seus personagens, Kirk e Spock, respectivamente, mas acabaram aceitando participar do filme. 

Situado quatro anos depois dos eventos do último episódio da série clássica, Turnabout Intruder, James T. Kirk é designado para a Enterprise mais uma vez, que precisa lidar com um objeto vindo em sua direção e acabou de destruir três naves Klingon. Kirk tenta reunir a sua tripulação enquanto conhece novos rostos, incluindo o atual capitão da nave, Decker, que agora precisa deixar seu posto para o veterano. Como se não fosse o suficiente, temos o surgimento de V’Ger, uma entidade misteriosa que pode botar a galáxia em risco. 

Star Trek

A direção do longa ficou por conta de Robert Wise, conhecido por editar o clássico Cidadão Kane, de Orson Welles, e dirigir os musicais Amor, Sublime Amor e A Noviça Rebelde. Lendo os exemplos listados, você não imaginaria que ele fosse o diretor certo para um filme de Star Trek, mas Wise já tinha em sua filmografia outra ficção científica, O Enigma de Andrômeda, que dirigiu no começo da década de 1970. Ainda assim, ele realmente não era a pessoa certa considerando que não assistia a série, mas aceitou o desafio independente disso. Felizmente, Jornada nas Estrelas: O Filme tem vários méritos, para muitos por uma perspectiva técnica, mesmo que nem todos os fãs sejam apaixonados pela obra, que tem uma abordagem completamente diferente do que se esperava da franquia. 

A primeira coisa que você nota no filme é o seu ritmo vagaroso. Uma das principais reclamações de alguns é a duração de algumas cenas, principalmente a famigerada tomada na qual Kirk reencontra a Enterprise, onde temos mais de cinco minutos da câmera explorando cada canto da nave, e estou falando apenas do exterior, e fica mais engraçado notar como no roteiro isso tomou apenas duas páginas.

Star Trek

A comparação mais óbvia que se pode fazer com outra obra é 2001: Uma Odisseia no Espaço, do diretor Stanley Kubrick. Isso não se dá apenas pelo ritmo, mas pelo tom, mais sério e contemplativo, e pelo apelo visual – por vezes o filme chega a executar cenas de tal maneira que fica impossível não comparar diretamente ao filme de Kubrick, como as tomadas das naves e estações espaciais em descanso no vazio do universo, a quase escassez de diálogos e até mesmo uma sequência onde Spock adentra a entidade V’Ger.

O filme contou com consulta técnica da própria Nasa e dos Institutos de Tecnologia da Califórnia e Massachusetts, sem contar o escritor Isaac Asimov, que usou seu vasto conhecimento sobre ficção científica para colaborar com conceitos que fossem não só acurados cientificamente, mas envolventes para o grande público, e isso fica visível quando assistimos a Enterprise sofrendo por passar em um buraco de minhoca desbalanceado, criando um efeito que faz a imagem da tripulação se dissolver aos poucos. 

Além dos efeitos visuais de computação, o longa conta com mais de cem Matte Painting,  uma técnica de pintura de cenários que pode distrair em algumas instâncias, mas é impressionante quando bem incorporado com as filmagens normais. Podemos ver a mais evidente delas no planeta Vulcano, quando Spock passa pelo ritual de kolinahr, ou em uma das várias tomadas da Enterprise. Essas pinturas combinam bem com o visual quase abstrato de algumas sequências, contribuindo com cores vibrantes e uma arquitetura incomum, criando uma atmosfera que distingue completamente esse filme dos outros da franquia. 

Star Trek

Outro aspecto importante para a obra é a sua música. A composição épica de Jerry Goldsmith é tão poderosa que o próprio Gene Roddenberry decidiu utiliza-la como o tema de abertura de Next Generation, o primeiro spin off da série clássica (a animação de 1973 é uma continuação), estrelado por Patrick Stewart como o Capitão Picard. O diretor Robert Wise também foi um dos que adorou trabalhar ao lado de Goldsmith, chegando a dizer que foi uma das melhores colaborações de sua carreira. 

Mas é claro que há problemas que não dá pra relevar, como a péssima escolha de figurino, que deixou o elenco tão desconfortável e nervoso a ponto de jamais voltarem a utilizar as peças em qualquer outro lançamento da franquia, mesmo que o traje dos engenheiros seja similar no filme seguinte, A Ira de Khan

Saindo um pouco da parte técnica, o filme mostra uma relação um pouco mais fria entre os membros da Enterprise clássica, tirando ocasionais diálogos onde mostram como sentiram falta um do outro, ainda assim não há tantos momentos de intimidade e descontração como nos filmes por vir. Temos um foco maior na relação Kirk e Decker, o atual capitão da nave que acaba aceitando uma posição inferior por conta da influência de Kirk na Federação. 

Star Trek

Essa mudança no comando cria um desconforto entre os dois, e acaba sendo o principal tema do longa, até que surja a figura de V’Ger, uma entidade que tomou o corpo da tenente Ilia, uma antiga paixão de Decker. Ao contrário dos filmes seguintes, onde Kirk lida com a passagem de tempo e sua relevância na frota estelar, Star Trek: The Motion Picture é uma batalha interna para afirmar sua própria liderança e confiança nos novos membros da tripulação.

Para os fãs da série clássica, há várias referências, desde alguns sons e trilhas e até diálogos que fazem menção a algum episódio específico, como quando McCoy menciona que “faz tempo que não ajuda no parto de um bebê”, uma piada com Friday’s Child, da segunda temporada. É curioso também como a existência de V’Ger criou várias teorias por conta da criação dos Borg, em Next Generation. Isso se dá por conta das similaridades entre os dois: É dito que V’Ger vem de “um planeta populado por máquinas vivas. Tecnologia avançada”, e ela menciona que seu propósito é apenas observar e compreender as coisas. Essas características podem facilmente serem confundidas com as dos Borg, e a linha de diálogo de Spock em que “qualquer tentativa de resistência seria inútil” acaba corroborando ainda mais para a teoria. Mas nada disso é confirmado. 

Jornada nas Estrelas: O Filme acaba sendo a experiência mais próxima da proposta original de Roddenberry, com um foco na exploração e o maravilhamento diante de novas descobertas; o longa também possui mais representatividade (há uma cena em que Kirk conversa com a tripulação da nave e podemos ver várias formas de representação cultural, incluindo indígena, que nunca foi bem retratada na série clássica) e momentos de introspecção. Pode não ser o favorito de muitos, mas é um dos mais originais em todos os aspectos, e esse é apenas o primeiro filme de uma franquia longa e próspera. 

Em seguida: A IRA DE KHAN.