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Jornada nas Estrelas: Picard (Maps and Legends, S01E02)

Chegamos ao segundo episódio de Jornada nas Estrelas: Picard, agora revelando mais informações e estabelecendo melhor o rumo que a série deve tomar. Em Maps and Legends, Picard continua sua investigação sobre Dahj, e mesmo não tendo a ajuda de quem mais precisa, decide resolver tudo com as próprias mãos. Enquanto isso, Soji, a “irmã gêmea” de Dahj, começa uma relação com o misterioso Narek. 

Hanelle M. Culpepper retorna no comando do segundo episódio, mantendo uma direção contida, mesmo que agora explore um pouco o formato, alternando entre presente e futuro durante um diálogo, por exemplo. Ainda assim, não é nada que chame atenção, sem contar que a direção de arte de Philip Lanyon, por mais polida que seja, não se esforça demais para manter um visual próprio e acaba caindo em território seguro, replicando a mesma textura e até os lens flares dos filmes de J.J. Abrams. 

Para o elenco, temos a introdução dos atores David Paymer, como Dr. Benayoun, um antigo amigo de Picard; além dele, Michelle Hurd, que fará a recorrente Raffi Musiker. Podemos ver como vai ser a dinâmica entre os atores Isa Briones e Harry Treadway, Soji e Narek, respectivamente, com grande tensão sexual e espionagem.

Picard

Ainda é cedo para dizer como todos os arcos dramáticos podem se complementar, mas parece que há mais conspirações do que imaginamos, o que é interessante, mas será que Alex Kurtzman, o responsável pela franquia atualmente, forçou alguma cláusula em todas as produções de Jornada nas Estrelas exigindo a presença ou algo similar à Seção 31? Isso porque a organização secreta da Frota Estelar está em evidência em Discovery, sem contar que receberá uma série própria estrelando Michelle Yeoh. Para algo secreto, a Seção 31 está recebendo bastante atenção.

Agora vamos para: 

MAKE IT SO – Referências, Teorias e Easter Eggs – SPOILERS!

  • O episódio abre no estaleiro Utopia Planitia, em Marte, no ano 2385. Uma voz anuncia a comemoração do Dia do Primeiro Contato. Isso nos situa na data 5 de Abril, e a data é referente ao dia em que os humanos fizeram contato com os vulcanos, no ano 2063, em Montana. Podemos ver o evento acontecer no filme Jornada nas Estrelas: Primeiro Contato.

    É nessa cena que podemos ver melhor os sintéticos em ação. Um deles, F8, é visto sendo corrompido e acabando violentamente com a vida dos trabalhadores do estaleiro. Não está claro ainda o responsável ou a razão para isso, mas talvez a própria Federação esteja envolvida nisso. 
  • Enquanto assiste às gravações da explosão que causou a morte de Dahj, os companheiros romulanos de Picard, Laris e Zhaban, consideram que esse tipo de trabalho secreto pode ser responsabilidade de uma organização ainda mais antiga que a Tal Shiar, chamada Zhat Vash.

    Tal Shiar é uma conhecida agência de inteligência romulana, mencionada pela primeira vez em A Nova Geração, recorrente em Deep Space Nine. Embora Zhaban considere Zhat Vash um mito criado pela Tal Shiar, Laris convence Picard de sua existência. 
  • Durante uma conversa, Soji diz para Narek que não estão em um Cubo Borg, mas sim um “Artefato”, isso porque “O cubo Borg é poderoso e onipotente” enquanto o Artefato está “perdido, separado de sua coletividade”. De acordo com essa informação e o fato de Soji sussurrar uma “mensagem de despedida” no ouvido de um dos Borgs descomissionados, parece que a personagem sabe muito mais do que imaginamos, e talvez Narek não seja o único com segredos. 
Picard
  • Voltando a Terra, Picard recebe a visita de um velho amigo, o Dr. Benayoun. Eles conversam sobre o pedido de Picard para assumir uma nave e continuar sua investigação. Benayoun menciona a nave USS Stargazer, onde Picard atuou por anos como capitão antes de assumir o comando da Enterprise.

    Mas o mais importante da conversa envolve o diagnóstico de Benayoun, onde ele conclui que há “uma pequena anormalidade no lobo parietal”. Em A Nova Geração, no episódio final duplo “All Good Things…”, Picard descobre sofrer de uma desordem neurológica chamada Síndrome Irumódica, que pode estar afetando a sua percepção temporal, já que ele afirma estar vivenciando eventos do futuro afetados diretamente pelas suas ações. 
  • Quando Picard visita a Federação, podemos ouvir a música da série clássica, com um arranjo mais atualizado. 
  • Depois de seu encontro frustrado com a Federação, Picard recebe a Dra. Jurati em sua casa. Enquanto espera, ela folheia um livro de contos do autor Isaac Asimov, intitulado “The Complete Robot”. Ainda que a edição tenha sido feita para a série, o livro é real, um compilado de todos os contos do autor de ficção científica sobre um de seus assuntos favoritos, robótica.

    É claro que além de ser uma referência para os fãs do gênero e do autor, essa pode ser uma alusão ao personagem Bruce Madoxx, o ciberneticista fascinado por Data. Madoxx já foi mencionado algumas vezes até agora, então podemos esperar sua presença em algum momento da série. 
Picard
  • Quando decide fazer sua viagem com uma nova tripulação, Picard é interrompido por Laris, que menciona William Riker, Geordi La Forge e Worf como possíveis aliados, mas Picard não aceita colocar seus amigos em risco. 
Picard

Esse foi mais um episódio de Picard, Maps and Legends.
O que tem achado da série até agora?

Até a próxima. Vida longa e Próspera 🖖

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Leviatã Desperta | “As Estrelas Estão Melhores Sem Nós”

Escrita por James S. A. Corey (pseudônimo da dupla Daniel Abraham e Ty Franch), a série de livros The Expanse fez tanto sucesso que acabou gerando uma adaptação seriada para o canal SyFy de mesmo nome (que depois foi cancelada e salva pelo serviço de streaming, Amazon Prime Video). Lançado originalmente em 2011, o primeiro livro da série se chama Leviatã Desperta, e é uma aula de construção de mundo e personagens.

A humanidade já conquistou o espaço, mas está dividida. Saltamos 200 anos em um futuro onde os conflitos entre habitantes da Terra, Marte e o cinturão de asteróides podem estourar a qualquer momento, e a tensão aumenta quando uma nave transportadora é destruída. Sem alguém para culpar, começa a corrida contra o tempo para descobrir o que está acontecendo, e o destino de todos pode estar na mão de uma pequena tripulação liderada pelo justo capitão James Holden e o abusado detetive Joe Miller. 

Leviatã Desperta é um livro grande, uma ópera espacial em um universo rico, e a quantidade de personagens, planetas e conceitos que precisam ser introduzidos justifica o tamanho da obra. Esse é apenas o primeiro livro, mas já faz um ótimo trabalho em executar uma narrativa sobre conspiração política de maneira inteligente; mesmo que ela esteja acontecendo em segundo plano, continua afetando a trama do início ao fim. 

Cada capítulo da obra segue a perspectiva de um personagem específico, e aqui temos uma atenção quase exclusiva aos pontos de vista de Holden e Miller, que também dão nome aos capítulos. O que poderia resultar em um desenvolvimento enfadonho acaba servindo não apenas como um bom exercício diferencial de narrativa, mas uma solução mais dinâmica de alavancar a trama, revelando informações aos poucos, aumentando a expectativa, alternando entre protagonista antes que corra o risco de entediar o leitor – o que nunca acontece. 

Leviatã Desperta

“Diga o que quiser sobre o crime organizado, pelo menos ele é organizado”

Não é apenas o formato que chama a atenção. Parte do dinamismo da escrita de Corey está nos diálogos, divertidos e ácidos, que deixam os personagens ainda mais reais e envolventes. Há também a dedicação dos autores em apresentar um mundo verossímil, com regras bem estabelecidas, não importa se é para algo maior como uma estação espacial ou trivial como um coquetel de drogas usado pela tripulação para não amenizar o impacto da força g

Para aqueles interessados em comparações entre o livro e a série de TV, a versão literária é tão elaborada que rendeu conteúdo para duas temporadas. Ainda que a série tenha sido inteligente em introduzir núcleos dramáticos e ótimos personagens logo no começo, a decisão de manter o foco narrativo do livro entre Holden e Miller acaba tirando o espaço de figuras como a excelente Chrisjen Avasarala, a líder das Nações Unidas da Terra. É claro que isso não afeta negativamente a versão original, já que são formatos e mídias diferentes, mas é curioso notar essa diferença.  

Leviatã Desperta é uma forte introdução para um universo bem construído, personagens atraentes e uma trama conspiratória como poucas. Até o momento, apenas o primeiro livro foi lançado no Brasil, pela editora Aleph, e infelizmente não há uma data para trazer as continuações, mas essa permanece uma obra satisfatória, mesmo que deixe alguns ganchos para o livro seguinte. Vamos esperar. 

Leviatã Desperta

Ficha Técnica:
Título Original: Levathan Wakes
Editora Aleph, 2017
Tradução de Marcia Blasques
672 Páginas.

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Jornada nas Estrelas: Picard (Remembrance, S01E01)

Poucos nomes servem como símbolo de esperança e compreensão como Picard, um dos personagens mais importantes da ficção científica e da televisão, interpretado por Patrick Stewart na série Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, que teve sete temporadas entre os anos 1987 e 1994. Mesmo sendo mais aclamado na pequena tela, a última vez que vimos Jean-Luc Picard foi no filme Jornada nas Estrelas: Nemesis, de 2002, e desde então sentimos saudade do capitão da Enterprise.

Felizmente, quase duas décadas depois, tivemos a confirmação de que Patrick Stewart retornaria ao papel, estrelando uma nova série intitulada apropriadamente como Jornada nas Estrelas: Picard. No Brasil, teremos episódios todas as semanas através do serviço de streaming Prime Video, da Amazon, e já temos o primeiro, intitulado Remembrance, para analisar.

Há vários obstáculos no caminho que podem atrapalhar o desenvolvimento de Picard, incluindo a necessidade de atrair uma nova audiência para um personagem já estabelecido, sem contar que os fãs já possuem uma série da franquia Jornada atualmente, Discovery, com uma abordagem mais dinâmica e voltada para a estética dos filmes de J.J. Abrams, o que pode ser um problema, já que uma série focada em Picard parece demandar um tratamento mais introspectivo, com atenção maior aos diálogos e as atuações.

Picard

O resultado final é um híbrido entre a ação rápida da timeline Kelvin (criada para distinguir os filmes de J.J. Abrams, que apresentavam uma “linha temporal alternativa”) e da série Discovery, com toques de A Nova Geração, dando espaço para momentos de reflexão e silêncio. Talvez nem todos concordem com essa decisão, mas particularmente considero um compromisso necessário, desde que tenhamos um enredo e personagens consistentes.

Da mesma forma, Picard se beneficia dos avanços tecnológicos e o orçamento atual da televisão para entregar um visual cinematográfico, com uma câmera melhor, capaz de dar mais atenção aos detalhes, além de um tratamento melhor nas cores e uma estética limpa. A direção do primeiro episódio fica por conta de Hanelle M. Culpepper, que usa seu repertório em séries como Flash e a própria Discovery, para trazer um dinamismo para as sequências de ação, com coreografias mais elaboradas, como as empolgantes batalhas com Phasers. É um pouco estranho ver tanta ação em volta de Picard, mas faz parte do compromisso mencionado no parágrafo anterior. 

Começamos a série com um Picard aposentado, conhecido como o ex-almirante que abandonou a federação para liderar uma frota de resgate depois do surgimento de uma supernova que acaba destruindo o planeta Romulus. O que já era uma missão arriscada, logo transforma-se em tragédia depois de um grupo de sintéticos se rebelarem, causando também a destruição do estaleiro de Utopia Planitia, localizada em Marte. Além de ligar com as repercussões de suas ações, Picard conhece Dahj, uma jovem procurando refúgio ao lado do ex-almirante. 

Não há uma série sem Patrick Stewart, e o ator entrega tudo com uma performance mais contida e melancólica, um homem arrependido com uma vida solitária, acompanhado apenas de seus dois ajudantes romulanos e um cachorro, apelidado de Número Um. Mesmo mais velho, Stewart não esquece como é interpretar o personagem, que até em seu ponto mais baixo, serve como uma luz no meio de todo o embate político e a possível ameaça envolvendo as origens de Dahj, interpretada por Isa Briones.

Picard

No elenco também somos apresentados ao personagem de Alison Pill, a cientista Agnes Jurati, que auxilia Picard em uma busca sobre o passado de seu amigo, Data, papel reprisado por Brent Spiner. No fim, conhecemos também Narek, personagem de Harry Treadaway. Como é apenas o primeiro episódio, o que temos é uma grande introdução ao universo da série, sem muito espaço para o desenvolvimento dos personagens, então ainda é cedo para avaliar como cada um está indo, se bem que até o momento todos parecem bem confortáveis, principalmente os veteranos Stewart e Spiner. 

Com a bela composição musical de Jeff Russo, conhecido por seu trabalho em Fargo, Legion e – mais uma vez – Discovery, ótimos visuais e uma trama promissora, Remembrance é um ótimo ponto de partida para essa nova jornada. 

Agora, vamos para a parte em que analisamos alguns aspectos específicos do episódio:

MAKE IT SO – Referências, Teorias e Easter Eggs – SPOILERS!

  • O episódio começa com a música Blue Skies, de Ervin Berlin. Para os fãs de Jornada, a música ficou mais conhecida por conta do filme Nemesis, quando Data cantou a música durante o casamento de William T. Riker e Deanna Troi. A importância da música para o episódio está ligada diretamente a importância de Data para a trama, já que ele é, aparentemente, o pai de Dahj.

    Enquanto a música toca, assistimos Picard jogando poker com Data, mas no fim descobrimos que é tudo um sonho. As partidas de poker eram comuns entre os membros da Enterprise em A Nova Geração, e mesmo sumindo por um tempo, Picard decidiu voltar para participar dos jogos no último episódio da série.
  • Na sequencia, podemos ver um pouco mais de Chateau Picard, a vinícola da família Picard, agora comandada pelo ex-almirante, que passeia ao lado de seu cão, Número Um, uma referência ao seu antigo primeiro imediato, William T. Riker, que ele chamava por Número Um.

    Voltando para casa, Picard pede para o replicador de comida o seu chá favorito, Earl Gray. Dessa vez, descafeinado.
Picard
  • No mesmo dia, Picard recebe uma equipe de reportagem em seus aposentos. Eles debatem a missão de resgate pela qual foi responsável, e é visível que a federação e algumas pessoas de alta patente não ficaram felizes com a ação.

    A destruição de Romulus é um ponto importante para o universo de Jornada por conta da criação da linha temporal Kelvin (explorada nos filmes Star Trek, Star Trek: Além da Escuridão e Star Trek: Sem Fronteiras), resultado direto dos eventos envolvendo a supernova. 
  • Em mais um de seus sonhos, Picard caminha pela sua vinícola e encontra Data, pintando um quadro. Esse é um dos hobbies que o personagem adota durante A Nova Geração, como uma maneira de expressar artisticamente.

    Ao acordar, Picard visita o prédio de “Arquivos da Frota Estelar”, onde ficam guardados documentos e outros objetos de seu tempo atuando como capitão da Enterprise. A sala está recheada de referências, como uma réplica da Enterprise, um Bat’leth (arma de batalha Klingon) e o banner de comemoração “Captain Picard Day”, do episódio The Pegasus, quando as crianças da nave decidem fazer uma festa celebrando o capitão.

    Mas a grande revelação da cena é uma das pinturas de Data, onde Dahj pode ser vista, e a obra é intitulada “Filha”. No episódio The Offspring, de A Nova Geração, em uma das tentativas do personagem em se aproximar da humanidade, Data cria uma “filha” chamada Lal. O experimento não dá certo e ela precisa ser desativada, mas o androide mantém sua memória e faz uma pintura dela. 
  • Continuando sua investigação, Picard vai ao instituto Daystrom, onde conversa com a doutora Jurati. Ela revela como tem mantido as partes do andróide B-4, uma versão inferior de Data, atualizado com suas memórias depois de se sacrificar pela tripulação em Jornada nas Estrelas: Nemesis.

    Durante a conversa, Jurati menciona Bruce Maddox. No episódio The Measure of a Man, da segunda temporada, Maddox é um ciberneticista interessado em desmontar Data para estudar seus componentes e criar novas versões do androide, mas não tem sucesso. 
  • No fim do episódio, somos introduzidos a uma instalação dos Romulanos e ao personagem Narek. Mas com a câmera se distanciando, descobrimos que ela está localizada dentro de um cubo Borg desativado. 
Picard

O que achou do episódio?

Picard está de volta e a série parece mais promissora do que alguns imaginaram, principalmente depois de acabar com algumas teorias que estavam preocupando os fãs. 

Semana que vem tem mais, até lá. Engage! 🖖

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Cinema

O Homem da Terra (2007) | O mistério do passado

Jerome Bixby é um dos nomes mais importantes para a história da ficção científica na TV, escrevendo roteiros para alguns episódios clássicos de Jornada nas Estrelas, como “Mirror, Mirror”, ou de Além da Imaginação, com o excelente “It’s a Good Life”. Bixby esteve envolvido em poucos projetos desde então, mas seu nome voltou a chamar atenção com a chegada de O Homem da Terra, um filme de baixo orçamento lançado em 2007, com direção de Richard Schenkman.

Com uma premissa bem simples, O Homem da Terra apresenta um grupo de professores em sua última reunião de despedida para um de seus amigos, John Oldman, que decidiu se aposentar. Antes que vá embora, Oldman tem uma confissão que pode mexer não só com a relação deles, mas com tudo em que acreditam. 

O primeiro elemento a chamar atenção no filme é a sua direção. Por conta do orçamento modesto, Schenkman decidiu empregar duas câmeras digital Panasonic DVX100, uma das mais usadas por outras produções independentes (Império dos Sonhos, de David Lynch, foi uma delas), principalmente documentários ou séries no Youtube.

O Homem da Terra

O resultado é um visual um pouco mais escuro e granulado, que pode distrair nos primeiros minutos, isso sem contar alguns problemas com a re-dublagem de algumas cenas, principalmente as tomadas noturnas e exteriores, que provavelmente deviam ser mais barulhentas e precisavam ser inseridas na pós produção. Ainda assim, essas distrações deixam de ser evidentes quando consideramos que a verdadeira conquista da obra está no elenco e no roteiro. 

Com debates filosóficos e existencialistas sobre a história da humanidade, construção de memória e identidade em si, o roteiro de Bixby rouba toda a atenção, criando uma narrativa de ótimo ritmo, revelando aos poucos informações sobre o protagonista e cada um de seus companheiros, que passam a maior parte do filme sentados em sua sala, bebendo uísque em copos de plástico. Mesmo que a história contada por John Oldman seja fascinante o suficiente, um grande acerto do filme é seu elenco. 

David Lee Smith interpreta o sereno professor John Oldman, e ele faz um bom trabalho em instigar não só os seus colegas, como o espectador. Mesmo que ele seja o protagonista, temos alguns nomes mais conhecidos dos fãs de ficção científica e horror, como John Billingsley, de Jornada nas Estrelas: Enterprise; Tony Todd, do clássico A Noite dos Mortos-Vivos e William Katt, da série Super-Herói Americano

O Homem da Terra

O Homem da Terra é um daqueles filmes lançados sem expectativa ou aclamação alguma, que logo virou uma obra cultuada por muitos fãs de ficção científica, fascinados pelos conceitos que o gênero pode abordar e os debates que ele carrega. Pequeno em tamanho, mas grande em conteúdo.

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Literatura

Eles Herdarão a Terra | Racontos sobre a solidão

Depois de lembrar os primórdios da ficção científica produzida no Brasil através de Machado de Assis, com a obra Sobre a Imortalidade de Rui de Leão, a editora Plutão realmente começa a explorar a pluralidade de vozes do país com a série Ziguezague. Com a proposta de entregar obras que contribuíram para a formação do gênero por décadas, somos apresentados a “Primeira Onda” da ficção científica nacional com Eles Herdarão a Terra, de Dinah Silveira de Queiroz. 

Apresentando cinco contos (ou “racontos”, como Queiroz prefere chamá-los), Eles Herdarão a Terra alterna entre a ficção científica, ensaio político e relato sobrenatural, e por mais que sejam, em certo nível, abordagens distintas, o principal tema abordado pela autora é a solidão, presente em cada um dos contos.

Estamos numa época em que a solidão humana ganhou uma perspectiva capaz de produzir verdadeiras alucinações.

Com a intenção de abordar o absurdo, as histórias são divididas em três categorias: “Antecipação”, “Cotidiano” e “Sobrenatural”. A primeira é a mais rica em conteúdo, com narrativas um pouco maiores e detalhadas, sendo elas “A Universidade Marciana”, “O Carioca” e o conto que dá nome ao livro. Em seguida, com “Partido Nacional”, Dinah brinca com o “proverbial derrotismo brasileiro”. No fim, usa o conto “A Mão Direita” como ferramenta do absurdo além da compreensão humana. 

Mesmo que “Partido Nacional” seja uma sátira política curiosa em sua premissa e desenvolvimento, ou “A Mão Direita” traga uma escrita mais rebuscada, o verdadeiro destaque da coletânea são os três contos de ficção científica. 

Dinah Silveira de Queiroz
Dinah Silveira de Queiroz

Em “A Universidade Marciana”, Dinah aborda o primeiro contato com um olhar mais íntimo e introspectivo, questionando as motivações e as consequências de encontrarmos nova forma de vida. Ambientada em um Rio de Janeiro distópico, onde a “enchente fez unir o mar à lagoa Rodrigo de Freitas”, temos também uma forte presença da igreja, principalmente na figura do papa, que recebe todos no Vaticano para estudar melhor a situação. Esse teor religioso está tão presente nos contos de Queiroz quanto a solidão que aflige os seus personagens.

“Estávamos, então, no limiar da Era Interplanetária, mas a ciência ensinara, durante esse tempo todo, que só a Terra era habitada” 

Para “O Carioca”, Queiroz aborda os avanços no campo da cibernética, mas mesmo que a história introduza um cientista construindo o primeiro robô “viajante a Marte ou Vênus” (robô que dá nome ao conto), o verdadeiro apelo dramático da trama está na relação entre esse cientista e sua vizinha, uma viúva que acaba criando uma relação de afeto com as máquinas em seu apartamento. 

Chegando no principal conto da obra, “Eles Herdarão a Terra”, somos arrastados ao lugar perfeito para explorar a solidão que fascina Queiroz: um farol, localizado à vista de Guaratiba, outro ponto do Rio de Janeiro. É lá que Marcos trabalha, ao lado de seu velho pai, até que sua irmã, Tudinha, os visita. As coisas ficam estranhas assim que uma figura misteriosa surge com revelações assustadoras sobre o futuro da humanidade. 

O livro também tem espaço para algumas referências, não só literárias, como a menção de vários autores da Academia Brasileira de Letras, da qual a própria Dinah fez parte, mas também da ficção científica e de eventos como a famigerada transmissão de Orson Welles para a rádio CBS, em 1938, quando decidiu narrar o livro Guerra dos Mundos, ao vivo, e causou certa comoção (ainda que parte dela seja fabricada para aumentar o impacto da história). 

“Sempre haverá quem sustente que tudo partiu de um mero espetáculo de ficção científica, gênero muito popular então, mas agora totalmente esquecido”

Com uma narrativa lenta, mas carregada de tensão, essa é uma coletânea relativamente curta, principalmente considerando que apenas três contos são realmente ficção científica, mas ainda é atraente conhecer melhor o trabalho de Queiroz e suas diferentes vozes refletindo sobre a solidão carioca. Eles Herdarão a Terra é mais um resgate necessário feito pela editora Plutão, que não deixa de surpreender. 

Eles Herdarão a Terra

Eles Herdarão a Terra (1960), de Dinah Silveira de Queiroz.

163 Páginas; Editora Plutão, 2019

O livro também conta com um prefácio de Ana Rüsche, e a arte gráfica de Paula Cruz.