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O Céu da Meia-Noite (2020) | George Clooney retorna ao espaço (ou quase).

Com uma filmografia competente, George Clooney já provou há um bom tempo que não é apenas o rosto bonito que começou a chamar a atenção por sua participação na série E/R (no Brasil conhecido por Plantão Médico), criada por Michael Crichton, o mesmo responsável por Parque dos Dinossauros e O Enigma de Andrômeda. Clooney logo começou a pegar papéis mais desafiadores e se destacar em filmes como E Aí, Irmão, Cadê Você, o que o deixou cada vez mais famoso e interessado em dirigir seus próprios filmes. Admito não ser fã da maior parte de seu trabalho por trás da câmera, mesmo considerando Boa Noite e Boa Sorte um ótimo filme, e é por isso que quando soube do lançamento da ficção científica O Céu da Meia-Noite, fiquei interessado no que ele poderia fazer em um território no qual já atuou, mas nunca dirigiu.

Adaptação do livro Good Morning, Midnight, de Lilly Brooks-Dalton, O Céu da Meia-Noite é ambientado em um futuro pós apocalíptico, no qual parte da humanidade foi extinta por conta de um cataclismo misterioso. Enquanto todos planejam uma evacuação do planeta, o cientista Augustine (Clooney) decide ficar para trás e cuidar da base de pesquisa no Ártico, onde trabalha sozinho procurando por possíveis planetas habitáveis.

Sem saber dos eventos que acabaram de acontecer na Terra, a astronauta Sully (Felicity Jones) e sua tripulação estão retornando para casa depois de sua missão de exploração espacial, o que obriga Augustine a tentar avisá-los, mas para isso ele precisa enfrentar os riscos do Ártico, além de cuidar de uma criança deixada para trás durante a retirada do planeta. 

A atriz Felicity Jones no filme O Ceu da Meia Noite

Vamos tirar logo do caminho o que realmente funciona nessa obra, que é todo o apelo visual. Mais uma vez colaborando com Clooney na direção de arte está Martin Ruhe, com um bom olho para composição de algumas sequências de tensão bem arquitetadas, principalmente as tomadas espaciais, que podem evidenciar o CGI, mas há movimentos de câmera “impossíveis” que conseguem diminuir a sensação de estranhamento, exatamente por compreender que a melhor maneira de filmar uma cena inteira com uso pesado de efeitos visuais seria simplesmente trabalhá-la quase completamente na pós-produção.

Mas isso entra mais no departamento de efeitos visuais, que fez o trabalho mais consistente e sem exageros, apenas uma atenção maior para coisas como a textura do casco das naves, por exemplo. Isso pode parecer pouca coisa, mas faz uma enorme diferença em alguns filmes e evita tirar completamente o espectador da experiência.  

Ainda sobre a direção de arte, por mais bonita, essa também cai em um problema bem comum de filmes do gênero, que é uma fotografia quase monótona, com estruturas e um visual limpo demais, quase sem identidade. Parece algo contraditório, mas é uma pena ver filmes com a possibilidade de explorar visuais bem mais criativos por conta de sua premissa de ficção científica, mas não parecem ter a coragem de seguir isso até o fim – ou seja, visuais bem feitos de um ponto de vista técnico, mas sem uma personalidade capaz de dar uma voz única para o filme; o que não é uma obrigação, mas faz falta quando os visuais são o elemento de maior destaque da obra.

Quanto ao enredo de Martin L. Smith, imaginei que ele fosse trabalhar a premissa batida de O Céu da Meia-Noite com uma execução tão boa quanto a que fez em outros roteiros, como o do inventivo Operação Overlord. O conceito do cientista solitário em procura de humanidade e redenção, toda a ambientação pós apocalíptica de cataclismas ou astronautas explorando possíveis planetas para habitar são alguns dos elementos mais comuns do gênero, o que é totalmente válido aqui, mas se você não procura sair de uma estrutura formulaica, ficamos apenas com um filme previsível e a sensação de estarmos assistindo uma colagem de outras obras bem melhores que poderíamos estar vendo no lugar (Não gosto de fazer muitas comparações quando faço uma crítica, mas A Chegada, Ad Astra e o próprio Gravidade, onde Clooney atuou, são exemplos de filmes que abordam temas similares, porém com melhor atenção ao drama, essencial para narrativas como essa).

George Clooney estrela a FC Ceu da Meia Noite
George Clooney

Por falar no drama, há um sério problema de caracterização dos personagens, que mesmo mencionando e até mostrando pequenos vislumbres de suas vidas passadas, não conseguem carregar peso algum. Com exceção de Augustine, interpretado por um Clooney abatido, o resto dos personagens não parecem possuir algo além de características básicas e arquétipos, como “o pai que sente falta da família” ou “a jovem inexperiente”. Até mesmo Felicity Jones, que estava grávida durante as gravações e pôde adaptar isso em sua personagem, não recebe muito com o que trabalhar, e na maior parte da rodagem do filme parece apenas entediada e confusa.

Essa falta de personagens melhor definidos fica difícil de ignorar quando o terceiro ato decide se apoiar em um desenvolvimento mais emotivo, que ao invés disso, acaba soando melodramático. Também não ajuda o fato do longa dividir-se em dois núcleos dramáticos, que mesmo ligados de forma direta, não trazem paralelos capazes de fortalecer seus temas principais, o que cria um ritmo inconsistente enquanto alterna entre essas duas linhas narrativas. Como se não fosse o suficiente, quando o filme realmente procura uma conexão na esperança de entregar um final surpreendente e enternecedor, somos deixados com uma reviravolta tão previsível que seria mais inesperado se ela não existisse.

Talvez Clooney precise continuar assistindo mais alguns filmes do gênero como referência (desde que fique longe da versão norte-americana de Solaris, também estrelada por ele). O Céu da Meia-Noite busca uma abordagem introspectiva e tocante, mas o resultado acaba sendo uma experiência cansativa e uma ficção científica cheia de escolhas óbvias, que não procura fugir da fórmula, mas também não se esforça o suficiente para se destacar.