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Ghost in The Shell | Sussurros sobre Identidade

Masamune Shirow lançou em 1991 o mangá The Ghost in The Shell, com temas e personagens complexos que merecem ser conhecidos, mas a obra só ficou realmente conhecida e aclamada pela crítica depois de sua adaptação cinematográfica, em 1995, dirigida por Mamoru Oshii.

Ghost in the Shell (Kôkaku Kidôtai no original; O Fantasma do Futuro no Brasil) não é apenas uma referência em animação ou no subgênero cyberpunk, é uma grande obra da sétima arte. Seus elementos narrativos e os temas carregados de debate existencial criam um longa que pode ser assistido e dissecado várias vezes, e felizmente isso não se torna uma tarefa cansativa por conta do incrível trabalho de direção de arte que desenvolveu alguns dos visuais mais impressionantes que você vai ver em qualquer anime.

Motoko Kusanagi é uma ciborgue à serviço do Setor 9, um departamento de inteligência “responsável pela segurança nacional” (sem contar todas as outras funções que são confidenciais), com liberdade para atuar de forma violenta, se necessário. Motoko utiliza, além de sua inteligência, armas e seu próprio corpo aprimorado para capturar qualquer figura que possa ser considerada uma ameaça, seja física ou virtual. Ao lado de seus parceiros de trabalho, Batou e Togusa, Kusanagi procura pelo Mestre dos Fantoches, uma inteligência artificial (mesmo que ela não se considere e o conceito seja um pouco mais complexo do que isso) que anda cometendo atos terroristas com um objetivo ainda incerto.

Ghost in The Shell (ou GITS)é carregado de símbolos. Um dos principais é a própria cidade, um ambiente futurista modelado a partir de Honk Kong. Oshii aproveita o neon e a arquitetura, no entanto insere elementos menos deslumbrantes, como os escombros do que ficaram para trás em alguma catástrofe natural. A cidade respira, quase como um personagem próprio, mas não de forma alegre, aqui a solidão está em cada composição, com as pessoas em movimento constante e as construções gigantes e restritas. O filme representa isso através de uma sequencia de imagens apresentadas em um ritmo inalterado e a ausência dos sons daquele universo — o que temos é a excelente música de Kenji Kawai, uma melodia tribal com uma percussão e voz quase estarrecedora que não saem da cabeça.

Motoko e Batou em ação.

Mamoru Oshii já esteve envolvido em outras produções como esta, cheias de conceitos e visuais enigmáticos, como Angel´s Egg, de 1985. Em GITS ele abre debates de cunho filosófico, com temas como homogeneidade e consciência. Motoko é uma personagem tão complexa quanto o enredo da animação. A agente tem o costume de mergulhar e arrisca morrer por conta de alguma falha do sistema, mas ainda assim continua nadando, e são nestes momentos em que temos uma das rimas visuais mais poderosas do filme, quando a ascensão de Motoko à superfície é um espelho do seu nascimento, logo na cena de abertura, sendo erguida do tanque aquático onde foi projetada. A personagem diz que ali ela sente “medo, frio e solidão, mas também esperança”.

O filme abre uma conversa intensa sobre mente e corpo, mas o que mais preocupa Motoko é sua identidade: “Acho que ciborgues tem uma tendência paranoica sobre sua origem. As vezes suspeito não ser quem sou”. Ainda que a nossa individualidade esteja em questão, o filme não deixa de mostrar a importância da diversidade em uma sociedade que não consegue distinguir o real do artificial, e isso fico bem claro na forma de Togusa, o oficial da força policial que é admitido na missão de Motoko e Batou por sua particularidade: ao contrário de seus companheiros, Togusa não possui aprimoramentos que passam do superficial, ele é o mais “humano” da equipe. A experiência de cada ser vivo é uma contribuição para a consciência coletiva, as diferenças são uma vantagem, todos temos uma maneira única de ser e lidar com as coisas.

O que é verdade para um grupo também é verdade individualmente. Quando se é especialista demais, torna-se fraco.

A obra também aborda a parte mais assustadora da mente através do Mestre dos Fantoches. Um de seus primeiros atos é brincar com a realidade de suas vítimas, como o lixeiro que acredita estar fazendo tudo por sua mulher e filha, mas descobrimos que ele é solteiro e nunca foi pai. O Mestre dos Fantoches fez com que sua vítima aceitasse uma realidade que não era a sua. Os conceitos de realidade e consciência se confundem e isso faz com que todos fiquem ainda mais preocupados com o que o antagonista pode fazer.

Ghost In The Sell

Ghost in the Shell é uma das animações mais influentes do cinema japonês, ecoando em outras mídias e formatos, seja na abordagem de temas ou visuais, como podemos ver no cinema com Matrix (1999)ou nas séries, com Westworld (2016 — Atual). Há muito para ser dissecado de cada diálogo ou da direção de arte, seja detalhes mais óbvios ou pequenas rimas que fazem o constante retorno ao filme uma experiência cada vez melhor.

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