“Amor! A única coisa que minha armadura não aguenta”
Clancy comanda um podcast espacial chamado The Midnight Gospel, onde entrevista seres diversos de planetas em extinção. Com um simulador de multiversos, ele pode enviar um avatar com a sua consciência para estes planetas e gravar longas conversas, que podem ir de um simples questionamento sobre a legalização da maconha até uma viagem através dos sentidos, com debates sobre ética existencial e identidade. Mas para entender de verdade a proposta dessa nova animação da Netflix, que leva o mesmo nome do podcast de Clancy, é necessário conhecer um pouco dos bastidores.
Todos os episódios de The Midnight Gospel, a série, tem como destaque os diálogos, as entrevistas de Clancy, que na verdade são excertos retirados diretamente de um podcast real, o Duncan Trussell Family Hour. Duncan Trussell é um ator, comediante e dublador que costuma receber todo tipo de convidado em seu programa: celebridades como Dan Harmon, o criador de Community e Rick and Morty; o músico e professor espiritual, David Nichtern; ou até mesmo figuras como Damien Echols, condenado por homicídio em um famoso caso dos Estados Unidos onde três garotos foram mortos no que foi confirmado como um “ritual satânico”. Um dos exemplos faz uma ponta na animação, mas vou deixar você descobrir enquanto assiste.
A série é desenvolvida por Pendleton Ward, mais conhecido como o criador da animação Hora de Aventura. Mas deu para notar que a abordagem de The Midnight Gospel é restrita ao público adulto, principalmente por conta de toda a profanidade e violência. Mesmo que Hora de Aventura tenha momentos brilhantes de questionamentos envolventes, a nova produção de Ward segue uma linha mais voltada para as crises existenciais de Bojack Horseman, com uma dose do absurdismo encontrado em Rick and Morty.
Mesmo que a maior parte dos diálogos venha das conversas de Trussell e seus convidados, há uma narrativa própria na série. Assistimos às tentativas de Clancy em conhecer melhor seus vizinhos, conseguir novas amizades, colecionar artefatos de suas viagens e lidar com os defeitos de sua máquina, que precisa ser lubrificada constantemente (a semelhança de seu simulador de multiversos com um órgão sexual feminino faz parte da linguagem mais infantil e do humor escatológico de Ward, que se estende pela temporada representado em todo tipo de excremento que lhe vem à cabeça). Mas Clancy também tem alguns segredos e parece estar fugindo para novos mundos na intenção de esquecer o seu.
Considerando o formato, há uma estrutura base para a maioria dos episódios, colocando as entrevistas em primeiro plano, com uma animação de fundo que nem sempre parece estar conectada ao assunto das conversas entre o protagonistas e os seres que encontra no caminho, mas rende alguma piada visual engraçada ou cria um segundo debate que parece complementar de certa maneira o tema geral de um episódio. Como se não fosse o suficiente, sobra espaço para alguns números musicais aleatórios, algo que Ward trouxe de seus outros trabalhos, mas falaremos disso em breve. Parece loucura resumir tudo dessa maneira, mas é uma daquelas coisas que só seria capaz de explicar desenhando, confirmando como a animação pode ser um recurso narrativo tão poderoso.
E por falar em animação, se você estiver acostumado com os desenhos de traço mais infantil dos trabalhos anteriores de Ward, aqui temos algo similar, mas carregado de sangue e vísceras, o que não distrai demais da construção de mundo louca e cheia de referências e piadas do cenário. As cores também são mais vibrantes e garantem uma viagem psicodélica, inclusive por conta da movimentação, com menos fotogramas, que causa certo estranhamento em algumas sequências. Se ainda não ficou claro, até mesmo a data oficial de lançamento da série acabou caindo em 20 de abril (brincadeira entre os usuários de maconha, que usam o termo 4:20); então, você não está sendo guiado em uma jornada louca como essa sem motivo – o universo pode ser aleatório, mas as intenções de Ward e Trussell não.
Como mencionei antes, a temporada conta com ótimas músicas originais, um compilado de rock, metal, jazz e folk, com algumas letras bobas e ridículas, mas um pouco assustadoras se você prestar atenção no que algumas estão dizendo. Não temos nada no nível de Hora de Aventura, mas se quiser versões mais estranhas de Marilyn Manson, Tom Waits ou Beck, não vai se decepcionar.
Embora pareça, na superfície, uma novelização de conversas descontraídas sobre temas delicados como a relevância das religiões, os riscos de se apoiar na esperança, as limitações da criatividade ou outros diversos questionamentos desse nível (é muito mais do que isso), a série se aproveita da jornada emocional do protagonista para executar momentos tocantes e explorar dúvidas essenciais para cada um de nós. Não se deixe enganar por elementos como barcos carregados pela energia positiva de gatos ou unicórnios que vomitam sorvete, The Midnight Gospel é uma experiência única através do espaço e da alma.
O trabalho do autor e ilustrador sueco Simon Stålenhag tem sido fascinante por conta de suas artes conceituais onde elementos futuristas são inseridos em suas fotografias, criando um cotidiano rodeado por máquinas e arquitetura que parecem ter saído de uma obra de ficção científica. Sua arte foi parar em alguns livros, como Things From The Flood e The Electric State; e também chegou aos videogames, onde contribuiu para o incrível visual do jogo No Man’s Sky. Mas a sua criação mais influente ainda é o seu primeiro livro de fotografias, Tales From The Loop, que rendeu um jogo de RPG e acabou de ser adaptado para uma série pelo serviço de streaming da Amazon, o Prime Video.
Inspirado nos livros de Stålenhag, que participa da série como roteirista e produtor executivo, Tales From The Loop conta com dez episódios e adaptação de Nathaniel Halpern, um dos responsáveis pela psicodélica e absurda série Legion, do canal FX. E uma das primeiras decisões a chamar atenção na série é o seu formato, que parece seguir uma linha mais antológica, o que não deixa de ser verdade, mas é uma definição limitada.
Seguimos a rotina dos habitantes de uma pequena cidade aparentemente pacata, mas localizada acima de uma instalação de pesquisa, onde se encontra uma máquina chamada The Loop, capaz de desvendar e explorar diversos mistérios do universo. Isso acaba afetando os habitantes, que experienciam situações inusitadas envolvendo inconsistências temporais, forças que desafiam as leis da física e outras coisas que poderiam ter saído de alguma obra de ficção científica.
Para observar a maneira como cada um é afetado pela máquina, a série carrega uma estrutura narrativa em que cada episódio segue o ponto de vista de um personagem diferente, mas todos acabam ligados de alguma maneira, não só por conta da cidade. Por isso que, ainda que pareça ser estabelecida como uma antologia, a história de Tales From The Loop adota uma linha narrativa que se complementa e, mesmo com o envolvimento de anomalias temporais, possui uma ordem cronológica, então indico que seja assistida em ordem.
Na maior parte da série, a trama gira em torno de duas famílias lidando com traumas diferentes, que sem saber, acabam conectadas por conta da máquina. É o máximo que posso dizer sem entregar mais detalhes, e vale a pena entrar de cabeça na série sem conhecimento prévio de alguns elementos porque ela traz revelações significativas, que ao contrário de outras produções do gênero, servem para construir um arco dramático mais importante que a própria ficção científica da cidade.
Essa preocupação diz bastante sobre a proposta da série, que usa de componentes retro futuristas e referências dos anos 70 e 80, além de menções a obras da cidade natal de Stålenhag, como o filme Mônica e o Desejo, do diretor sueco Ingmar Bergman, ilustrado na entrada de um cinema. Mas essas referências servem apenas para reforçar a ambientação e a belíssima direção de arte, deixando o drama dos personagens e o elemento humano como o principal objeto de estudo da série.
Enquanto alguns preferem simplesmente comparar a produção com sucessos como Stranger Things ou Black Mirror, considero Tales From The Loop algo próprio, com uma estrutura e atmosfera única, não só mais uma história sobre pequenas cidades afetadas por uma força misteriosa, o que é uma premissa bastante comum e pode ser vista desde o clássico Twin Peaks até a animação Gravity Falls. O importante não é a premissa, mas o que você faz com ela.
Os arcos dramáticos fazem com que a série tenha um ritmo mais lento, uma experiência introspectiva, com momentos de silêncio e um tom mais melancólico. Há episódios em que a trama principal não envolve diretamente as famílias, ainda assim contribui para a construção daquele mundo.
Cada episódio tem um ponto de vista completamente diferente do anterior, mas todos complementam a temporada introduzindo peças para um quebra-cabeça maior: em Loop seguimos uma garota tentando encontrar sua mãe, em Echo Sphere é apresentado um orbe influenciado pela passagem de tempo, e em Enemies descobrimos uma história de origem que não só nos informa sobre o presente como desenvolve um enredo sobre pessoas tentando corrigir o passado.
Episódios como Parallel e Stasis são os que mais se distanciam da trama principal, mas ainda assim tem seu próprio charme, principalmente Parallel, que começa como uma história sobre realidades paralelas e se transforma em um drama mais íntimo. Esses dois arriscam afetar a estrutura geral da temporada, mas não abandonam a proposta principal da série.
É notável como tantos nomes talentosos acabaram envolvidos nesse projeto, como a atriz Rebecca Hall e o veterano Jonathan Pryce, além de ter Jodie Foster na direção de um dos episódios. E Shane Carruth pode não ser um nome conhecido da maioria, mas foi uma boa surpresa ver que ele tem uma participação especial no elenco, mesmo que pequena. Para quem não sabe, Carruth dirigiu alguns filmes independentes de ficção científica, como o complexo Primer e o excelente Upstream Color.
Para terminar a menção de pessoas que admiro envolvidas nesse projeto, até mesmo o compositor Philip Glass faz parte do episódio inicial da temporada, mas a trilha sonora dos outros episódios é feita por Paul Leonard-Morgan, e ele não fica pra trás com um arranjo que atribui uma sensação quase nostálgica para a fotografia adaptada de Stålenhag.
Tales From The Loop é uma série que segue os moldes de outros grandes sucessos, mas se destaca na execução, apresentando mundos e personagens diversos sem depender de suas referências, explorando o que há de mais complexo na ficção científica, o ser humano.
A confirmação de uma nova série no universo Jornada nas Estrelas costuma ser recebida como uma boa notícia, e parece que teremos várias opções para entreter os fãs da franquia, seja com novas temporadas de Discovery, um spin off sobre a Seção 31, ou a animação Lower Decks, focada nos membros da tripulação que costumam ser representados como coadjuvantes. Mas nenhuma dessas novidades chamou tanta atenção quanto o retorno de Jean-Luc Picard, um dos capitães mais adorados da franquia e protagonista da série Jornada nas Estrelas:A Nova Geração (The Next Generation).
Interpretado por Patrick Stewart, Picard tinha a difícil tarefa de continuar o legado do carismático James T. Kirk (William Shatner) como o novo líder da franquia, o que conseguiu ao ponto de criar uma identidade forte o suficiente para dividir alguns fãs sobre qual seu capitão preferido. Outros personagens como Sisko, Janeway e Archer também assumiram o posto de capitão em seu próprio spin off derivado de Jornada nas Estrelas, mas o debate entre Kirk e Picard é recorrente. Ainda que Kirk seja importantíssimo para mim e sua “diplomacia de cowboy” tenha me divertido bastante, admito que Picard roubou meu coração com uma atitude menos extravagante e usando o discurso como a maior arma.
Há vários obstáculos no caminho de uma nova série estrelada por Picard, incluindo a necessidade de atrair uma audiência inédita para um personagem estabelecido, sem contar que os fãs já possuem uma série da franquia Jornada atualmente, Discovery, com uma abordagem mais dinâmica e voltada para a estética estabelecida por J.J. Abrams nos filmes da linha temporal Kelvin (criada para distinguir os filmes de Abrams, situados em uma “realidade alternativa”, dos clássicos da linha Prime). Isso pode ser um problema, já que uma série focada em Picard parece demandar um tratamento mais introspectivo, com atenção maior aos diálogos e as atuações, se nos basearmos na abordagem da série Nova Geração.
O resultado é um híbrido entre a ação rápida da timeline Kelvin e da série Discovery, com toques de A Nova Geração, dando espaço para pequenos momentos de reflexão e silêncio (pequenos mesmo, infelizmente). Talvez nem todos concordem com essa decisão, mas particularmente considero um compromisso necessário, desde que tenhamos um enredo e personagens consistentes.
Da mesma forma, Picard se beneficia dos avanços tecnológicos e o orçamento atual da televisão para entregar um visual cinematográfico, com uma câmera dinâmica, capaz de dar mais atenção aos detalhes, além de um tratamento melhor nas cores e uma estética limpa. Ao longo dos dez episódios tivemos coreografias mais elaboradas, não só nas empolgantes batalhas com Phasers, mas nos confrontos espaciais com a presença de novas naves e algumas naves clássicas remodeladas. É um pouco estranho ver tanta ação em volta de Picard, mas faz parte do compromisso mencionado no parágrafo anterior, então é compreensível.
Começamos a série com um Picard aposentado, conhecido como o ex-almirante que abandonou a federação para liderar uma frota de resgate depois do surgimento de uma supernova que acabou destruindo o planeta Romulus (uma ligação com os filmes da linha Kelvin). O que já era uma missão arriscada, logo transforma-se em tragédia depois de um grupo de sintéticos se rebelarem, causando a devastação do estaleiro de Utopia Planitia, localizada em Marte. Além de lidar com as repercussões de suas ações, Picard conhece Dahj, uma jovem procurando refúgio ao lado do ex-almirante, mas as coisas pioram quando ela é procurada por uma entidade misteriosa chamada Zhat Vash, organização secreta envolvida com a Tal Shiar, liderada por agentes romulanos.
Ainda que tenha algumas vantagens em comparação à Nova Geração, Jornada nas Estrelas: Picard sofre em outros departamentos, principalmente no enredo e na estrutura narrativa, algo que a franquia costuma trabalhar com muito cuidado. Muitos fãs costumam colocar a culpa de algumas inconsistências do universo Trek no atual responsável pela franquia, o produtor executivo Alex Kurtzman, uma figura que esteve por trás dos filmes de J.J.Abrams e supervisiona todas as novidades envolvendo Jornada nas Estrelas.
Independente do responsável (vamos ser honestos, é o próprio Kurtzman), estou aqui para questionar alguns pontos da trama e elementos narrativos que poderiam ser melhor aproveitados ou simplesmente abandonados por completo, mas também devo dar crédito onde ele merece ser dado.
Mais tripulantes, mais problemas
Patrick Stewart é uma figura forte o suficiente para sustentar a popularidade de uma série, mas precisamos aceitar que ele está mais velho e não pode estar sozinho em uma trama sobre exploração espacial, ainda mais uma cheia de ação como a franquia tem sido nos últimos anos (queira ou não).
Para ajudá-lo, a série traz alguns personagens interessantes, como o sedutor capitão Christóbal Rios (Santiago Cabrera), a ex-membro da federação Raffi Musiker (Michelle Hurd), a ciberneticista Dra. Agnes Jurati (Alison Pill) e o romulano guerreiro Elnor (Evan Evagora). Além deles, temos o retorno de personagens estabelecidos, como Sete de Nove (a excelente Jeri Ryan), de Jornada nas Estrelas: Voyager; o borg Hugh (Jonathan Del Arco) e o andróide Data (Brent Spiner), mesmo que através de visões e flashbacks.
Algumas dessas adições foram muito boas, introduzindo novos componentes que enriquecem o universo da franquia, como a personagem Rios, sua nave La Sirena e os vários tripulantes holográficos, cada um carregando um pouco da personalidade do capitão. O conceito de uma Holomatrix, com um “Holograma Médico de Emergência” (EMH), não é novidade, principalmente porque já tivemos o ótimo Doutor da nave USS Voyager, mas a interação do capitão com suas outras versões criou alguns dos momentos de alívio cômico mais genuínos na série, isso por conta da atuação de Cabrera.
Raffi e Elnor são antigos conhecidos de Picard quando começamos a série, mas enquanto Raffi recebe uma subtrama pouco explorada envolvendo seu filho, com o qual não se comunica mais, Elnor é uma proposta atraente mas sem desenvolvimento algum (seu único propósito é surgir em cenas onde a ação é necessária, como um deus ex machina na maioria das vezes).
A Dra. Jurati é um caso mais complicado. Ela é a personagem mais passiva da temporada, geralmente reagindo e fazendo pequenos comentários tímidos, mas sua presença na aventura pareceu estranha desde o princípio. Com uma motivação fraca, a revelação de que ela estava infiltrada na missão de Picard para atrapalhar seus planos foi um dos pontos mais previsíveis da série. Para piorar, ela é responsável pela morte de Bruce Maddox, personagem pouco presente – mas importante – em Nova Geração; e mesmo depois de admitir o crime, termina a temporada como se nada tivesse acontecido, livre, leve e solta ao lado de seu novo namorado, Rios. Devo admitir que esse é um dos casais mais sem química que já vi, mas quem sou eu para julgar?
Vale mencionar aqui que algumas pessoas já estão incomodadas com uma rápida sequência em que Sete de Nove e Raffi parecem estar trocando carícias por alguns segundos, e mesmo que eu considere Raffi um pouco cliché (com sua atitude indiferente e piadas sarcásticas), convenhamos que a base de fãs de Jornada nas Estrelas conta com uma parcela pouco liberal, o que não faz sentido considerando o quanto a franquia lutou para derrubar preconceitos de gênero.
Alguns personagens ainda não foram mencionados, isso porque eles vão estar presentes em breve. Vamos continuar.
Desejo de morte
Ao tentar estabelecer um tom “sombrio” para Jornada nas Estrelas: Picard, a série tenta executar cenas com mais violência e sangue, o que nunca foi uma prioridade para a franquia, mas aparentemente consideram necessário que todos assistam a gráfica morte de Icheb, personagem presente em Voyager que teve um arco trágico como um ex-borg tentando se adaptar ao mundo e aprender como ser tão talentoso quanto sua líder, Sete de Nove.
É uma pena ver que aqui o reduziram a uma rápida cena em que tem seu olho arrancado e é deixado em uma mesa de cirurgia para morrer, uma conclusão deprimente para alguém que representava um pouco da visão otimista do futuro que fez a franquia ser tão adorada. E isso é tudo, Icheb foi arrastado de volta para Jornada com o único propósito de ser uma morte chocante o suficiente para motivar Sete de Nove a seguir em uma vingança que dura… um episódio.
E o extermínio de personagens já estabelecidos não se limita ao borg Icheb. Por algum motivo, Hugh também é morto em um confronto com uma das principais antagonistas da temporada, a romulana Narissa Rizzo (Peyton List). Hugh é um dos símbolos mais importantes para a história dos Borg, o primeiro do coletivo a adquirir uma identidade, destaque de mais de um episódio de Nova Geração, ele representa o que todos os borg podem ser. Infelizmente, em Picard ele serve como uma participação especial para agradar os fãs de longa data e fonte de explicação para algumas pontas soltas da trama, e no fim segue o mesmo rumo de Icheb, em uma morte menos violenta, mas igualmente desnecessária.
As críticas sobre a forma que a série parece “matar seus personagens” apenas como um recurso para impactar o público, tem sido uma preocupação desde o momento em que a Dra. Jurati mata Bruce Maddox no mesmo episódio em que ele foi introduzido.
Mas nem tudo é negativo. Tirando todas as mortes (nunca escrevi tanto a palavra morte, e nunca imaginei escrever em um texto sobre Jornada nas Estrelas) desnecessárias, a série teve uma saída inteligente para utilizar a personagem do tenente-comandante Data, aqui atuando como uma representação das frustrações de Picard e a memória de alguém que entendia e acreditava em sua integridade. A decisão de finalmente dar um descanso para a consciência de Data, que teve seu corpo destruído após se sacrificar no filme Jornada nas Estrelas: Nêmesis, foi um dos grandes acertos da temporada.
Antes de sair deste tópico, não vou deixar de mencionar a “morte” do próprio Jean-Luc Picard, que depois de sofrer por anos sabendo de sua inevitável síndrome cerebral (Irumodic Syndrome), acaba sucumbindo. Mas através de uma saída conveniente do roteiro, Picard sobrevive recebendo um “novo corpo” desenvolvido pelo Dr. Altan Inigo Soong, o filho de Noonian Soong, responsável pela criação de Data. Ainda não sei como me sinto sobre isso, então melhor mudar de assunto.
Eu, Borg?
Antes mencionei um problema com a estrutura narrativa da temporada, e não foi à toa. Além do desconforto de toda a violência desnecessária (já tivemos cenas pesadas na franquia, mas o olho arrancado de Icheb parece ter saído de algo como Jogos Mortais) e as mortes para chocar o público, Picard tenta inserir constantemente referências e easter eggs para os fãs de Nova Geração.
Não há problema algum nisso, eu mesmo adoro perceber alguma menção ao resto do universo de Jornada, seja nos diálogos ou no visual, mas parece que os produtores de Picard queriam demais introduzir de uma vez todos os elementos que fizeram do personagem tão famoso, entre eles a sua relação com os borg, uma parte essencial da história de Jean-Luc, mas que aqui se resume em um ponto solto da trama que realmente não se conecta com os demais.
Parte da primeira metade da temporada envolve Picard e sua nova equipe a procura da androide Soji (Isa Briones), que está localizada em um Cubo Borg abandonado chamado de Artefato, transformado em laboratório de pesquisa pelos romulanos. Eles estão usando o local para estudar os borg com a ajuda de Hugh.
Um dos romulanos é o misterioso Narek (Harry Treadaway), que rapidamente seduz Soji para investigá-la. Eles desenvolvem um relacionamento, mas Narek é constantemente alertado por sua irmã, Narissa, sobre a importância da missão e como não deve se distrair. A relação entre Narek e Narissa carrega um caráter quase incestuoso (isso pode ter a ver com a visão do produtor Alex Kurtman, explico mais pra frente) nunca justificado.
Quando Picard finalmente chega ao Artefato, tem uma rápida conversa com Hugh, mas logo precisa fugir por conta de Narissa, que está caçando Soji. A interação entre Picard e Soji é rápida e se limita ao cliché do “protagonista pedindo que alguém em apuros confie nele sem motivo algum”. Com a ajuda de Hugh, eles conseguem fugir para o planeta Nepenthe, onde Will Riker (Jonathan Frakes) e Deanna Troi (Marina Sirtis) moram. Hugh, Elnor e Sete de Nove permanecem no Artefato para tentar impedir Narissa de destruir os borg remanescentes que permanecem em descanso e desconectados do coletivo.
Sete de Nove tenta se comunicar com o Artefato e acordar os borg, mas eles são ejetados para o espaço por uma Narissa furiosa. Vendo que não há mais o que se fazer com o Artefato, a subtrama do cubo borg é abandonada e parece ter servido apenas para introduzir Narek e Soji, mas nenhum dos dois tem uma forte ligação com os borg, um é romulado e a outra é androide, então eles trabalharem no Artefato é apenas circunstancial. O retorno de Hugh não tem peso significativo na trama, nem sua morte é o suficiente para afetar o resto da história já que os próximos episódios correm para apresentar Coppelius, o planeta natal de Soji e os vários sintéticos do Dr. Altan Inigo Soong.
Em Coppelius, mais subtramas envolvendo traição e conspiração tomam conta da maior parte da história, e agora que Narissa parece ter sido derrotada por Sete de Nove (depois de ser derrubada de uma altura que mataria qualquer um; mas não há limites para as formas mirabolantes na qual os roteiristas podem trazer personagens de volta), Narek aparentemente muda de lado e a irmã de Soji assume o posto de antagonista.
O pior de dois mundos
Alex Kurtman é um problema. Não o considero uma ameaça para a popularidade da franquia, na verdade acho que Jornada nas Estrelas tem chegado com cada vez mais força para novos públicos, e é ótimo ver esse sucesso na TV. Enquanto alguns fãs reclamam sobre a representatividade de minorias e exigem menos foco em debates políticos, o que não faz sentido algum já que esses tópicos são praticamente intrínsecos da franquia (falamos sobre isso em outro texto), acredito que o maior problema enfrentado por Jornada está na narrativa.
Em entrevista para a Variety em 2019, o produtor executivo Alex Kurtman fez questão de mencionar como a série Game of Thrones o influenciou durante o desenvolvimento de Jornada nas Estrelas: Picard. Além das duas séries não parecerem semelhantes, seja por temas ou gênero, o sucesso da HBO carrega um tom mais sério e realista, o que não é novidade para Jornada, mas GOT preza por enredos carregados de conspiração, traição e reviravoltas. E é exatamente o que Kurtman procura para suas novas produções, tentando “subverter expectativas” (suas próprias palavras), não importa o quanto isso possa afetar negativamente a trama, a prioridade é surpreender à qualquer custo (agora são as minhas palavras).
“Ninguém reclama por ter que pagar para assistir Game of Thrones. Podemos fazer o mesmo” (Kurtman, 2019)
Pode não parecer, mas podemos ver algumas influências de Game of Thrones em Discovery e Picard, como a relação aparentemente incestuosa entre Narek e Narissa, claramente inspirada em Jamie e Cercei Lannister; até mesmo a sequência em que Lorca luta contra um guarda raivoso da Imperatriz Georgiu é bastante similar ao famoso combate entre Oberyn Martell e o Montanha na quarta temporada de GOT.
Não só a coreografia parece “pegar emprestado” alguns movimentos, como a motivação para o guarda estar tão nervoso envolve a morte de sua irmã pelas mãos de Lorca, assim como Martell procura vingança pelo Montanha ter matado a sua irmã. Como se já não fossem coincidências o suficiente, a conclusão da batalha em Discovery não surpreende quem já assistiu a de Game of Thrones. E esses são apenas alguns casos soltos.
Na mesma entrevista, Kurtman se orgulha por inserir elementos como nudez Klingon (esse assunto também não é novidade, e já tivemos casos onde a nudez foi um problema, principalmente na sexualização desnecessária de algumas personagens, como T´Pol em Enterprise) e palavrões: “Usamos a palavra ‘f*ck’, a propósito”.
O que acabei de mencionar não é exatamente um problema com a narrativa, mas um indício de como Discovery e Picard planejam “subverter as expectativas” do público através da violência, sexo e linguagem vulgar, e é assim que a narrativa é afetada negativamente, por dar destaque para o choque, deixando de lado o que realmente fez de Jornada nas Estrelas uma franquia única, com debates envolventes e questões que eram realmente levadas a sério, não só introduzidas com o propósito de surpreender todos com o quão corajosos eles são em colocar uma almirante da frota estelar ofendendo Picard com a palavra “Sheer Fucking Hubris” (algo como “Que arrogância de merda”) ou uma romulana perguntando para seu próprio irmão se ele “f*deu” outra personagem ¯\_(ツ)_/¯
Para onde vamos, afinal?
Jornada nas Estrelas nunca teve medo de tocar em assuntos delicados, debatendo política, racismo, gênero e o que fosse necessário. Isso era o suficiente para construir uma história envolvente, que fizesse o público realmente refletir sobre seu papel nessas questões. Mas é difícil termos uma conversa significativa e necessária quando a principal preocupação da franquia passa a ser a “subversão de expectativas” e a corrida para chegar na próxima reviravolta superficial.
O formato serializado de Picard pode ser um dos responsáveis por termos tantas revelações, mortes e mudanças no foco narrativo, isso porque ao contrário do formato clássico, onde cada episódio trazia uma história contida, agora temos dez episódios com um arco principal que precisa ser constantemente abastecido com intrigas e surpresas para manter o público investido. Talvez eu esteja atribuindo a culpa no formato com certo exagero, mas não é como se a afirmação não tivesse algum nível de veracidade.
E depois de tudo, parece que odiei Picard, mas fiz questão de ressaltar os aspectos positivos, principalmente nos primeiros parágrafos desse texto. Ainda há muito o que eu gostaria de mencionar por aqui, como as participações especiais, a forma como os vilões foram representados, as referências, entre outras coisas, e talvez eu volte a falar sobre Picard em outro momento. Por enquanto, vamos ficar na torcida para mais novidades sobre as futuras séries da franquia (estou ansioso para Lower Decks), e aproveite para comentar com as suas considerações sobre essa primeira temporada de Jornada nas Estrelas: Picard.
Atenção: há spoilers das duas primeiras temporadas da série Westworld e do filme original que a inspirou. Leia por sua conta e risco, sabendo que esses prazeres violentos trazem fins violentos.
Poucas adaptações atingem o sucesso em sua transição do cinema para as séries como Westworld, indo da ficção científica carregada de ação ao drama existencial. Similares em vários aspectos, as duas versões também divergem drasticamente em outros, o que traz de volta o eterno debate sobre a importância de adaptar um material para novos veículos e cenários sociais, mas para tal precisamos de contexto.
Westworld: Onde Ninguém tem Alma (título brasileiro) chegou aos cinemas em 1973, com roteiro e direção de Michael Crichton, um nome bastante respeitado pelos fãs de ficção científica, responsável por obras literárias como O Enigma de Andrômeda e O Parque dos Dinossauros, que logo viriam a ser adaptados para o cinema.
A obra trouxe um conceito intrigante, imaginando um parque de diversões interativo onde você pode criar a experiência de épocas diferentes, como viver os tempos do velho-oeste, por exemplo. Para isso, uma companhia chamada Delos preenche esses parques com robôs de aparência humana realista capazes de interagir com os visitantes, até mesmo de forma íntima.
O filme foi um sucesso de crítica e bilheteria, rendendo uma continuação, Futureworld (intitulado no Brasil como o desnecessariamente longo Mundo Futuro: Ano 2003, Operação Terra) em 1976, mas esse não contava com o envolvimento de Crichton. Para continuar a franquia, a primeira tentativa de levar a história para a TV aconteceu em 1980, com Beyond Westworld. Servindo como um spin off do filme original, a série foi rapidamente cancelada, tendo produzido apenas cinco episódios.
Por um tempo, a animação do público para novo material da franquia diminuiu, até que em 2013 o canal por assinatura HBO confirmou uma nova série inspirada no filme, dessa vez comandado pelo casal Jonathan Nolan e Lisa Joy, com produção de J.J. Abrams, intitulada apenas Westworld. A estréia aconteceu em 2016, com uma temporada tão elogiada pela crítica quando o filme original, talvez até mais. E é por isso que pretendo debater um pouco os principais pontos divergentes entre o filme clássico e a adaptação seriada da HBO, que para muitos (incluindo o autor desse texto) consegue superar sua versão original em vários aspectos.
A série começa com a vantagem de ter um orçamento visivelmente superior ao filme original. Enquanto o longa sofreu nas mãos do estúdio MGM para conseguir $1,25 milhões, a HBO arrecadou estimados $100 milhões para sua temporada de estréia. É curioso como mesmo dividindo igualmente o valor entre cada um dos dez episódios da série, ainda há um investimento maior que o do filme. Mas o valor da série não era apenas monetário, ela veio com uma equipe mais profissional (Crichton ainda era um diretor iniciante quando seu filme foi lançado), carregando uma direção de arte belíssima, assim como figurino e cenografia, sem contar a excelente música de Ramin Djawadi.
Similaridades e Referências
É difícil resistir a tentação de colocar algumas referências ao material original em qualquer adaptação, e Westworld não é exceção. Uma das primeiras similaridades envolve a dupla de protagonistas do longa, Peter Martin (Richard Benjamin) e John Blane (James Brolin), que decidem se aventurar no mundo do velho oeste, mas enquanto Martin parece relutante em se entregar totalmente à experiência, Blane é um veterano confiante e ajuda seu amigo a aproveitar o lugar da melhor maneira. Esses dois possuem traços que podemos associar facilmente aos personagens William (Jimmi Simpson) e Logan (Ben Barnes) na versão da HBO, respectivamente.
A principal diferença na adaptação é que William tem uma ligação maior com Logan, sendo seu cunhado e possível herdeiro dos negócios da família, que possui investimentos no parque temático. Para criar uma conexão ainda maior, a versão mais velha de William, apelidada de Homem de Preto (Ed Harris), é uma clara referência ao principal antagonista do filme, o Pistoleiro, interpretado por Yul Brynner. Se no filme ele é um robô intimidador, na série passa a ser humano – mas não menos assustador.
Outro personagem importante para a série é Maeve, dona de um bordel chamado Mariposa. Também temos um bordel na versão cinematográfica, mas não com o mesmo nome, e ele é comandado por uma Miss Carrie, papel desempenhado por Majel Barrett, mais conhecida pela franquia Jornada nas Estrelas. Além de manter alguns personagens, mesmo que alterados, a série segue com o nome Delos para a companhia que financia e contribui para a criação de vários parques.
Há muitas referências ao longo da produção da HBO, mantendo alguns conceitos e elementos, como a sala de customização, onde você deixa sua roupa para trás e assume um traje mais apropriado com a temática do parque de sua escolha. No filme, o momento em que os protagonistas trocam de roupa serve como um olhar mais mundano dos bastidores, enquanto a série transforma uma simples decisão entre a cor de um chapéu em desenvolvimento de personagem, prevendo a eventual mudança de caráter entre William e o Homem de Preto.
Pequenos detalhes do filme foram usados na série, como a informação de que os robôs podiam ser identificados pela mão (no longa, elas entregam os robôs; na série isso é mencionado como “um problema antigo que a empresa não tem mais com suas criações”) ou a cena em que o Dr. Robert Ford (Anthony Hopkins), o criador do parque na versão para a TV, controla uma serpente com um comando de voz, espelhando uma sequência do filme em que John Blane é atacado pelo mesmo animal.
Por falar em Ford, a presença de Anthony Hopkins no elenco já é indício de algo grandioso, então é claro que seria uma oportunidade perdida não deixá-lo roubar um pouco a cena com longos monólogos e debates filosóficos com seu companheiro de trabalho, Bernard (Jeffrey Wright). Pelos nomes Ford e Bernard podemos ver também a forte influência da literatura, já que o nome dos dois foi tirado do clássico da ficção científica, Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley.
Entrando em Westworld
Três parques são introduzidos no longa original e as temáticas são Medieval (no contexto europeu), Império Romano e, o principal, Velho Oeste, Westworld. Ainda que pareça pouco em comparação com a série (que já mencionou ter o dobro de parques), estamos falando de um filme de aproximadamente uma hora e meia, então a decisão foi desenvolver apenas os mundos Velho Oeste e Medieval, e mesmo assim, o Medieval pode ser considerado quase irrelevante no longa.
Depois de introduzido, tudo que fazemos no parque Medieval é seguir um casal em algumas cenas cômicas e sem conexão alguma com o drama dos verdadeiros protagonistas, Peter e John. É uma ótima proposta tentar nos colocar em novos mundos, mas o filme não parece saber como equilibrar as narrativas que realmente importam, e isso rende um ritmo bastante cansativo.
O filme alterna entre esses dois parques, mas também dá um pouco de atenção aos bastidores, mostrando a equipe de pesquisa e vigilância em sua sala branca comandando tudo. Talvez mais dessa equipe e menos do mundo Medieval pudesse entregar uma trama objetiva e sem excesso de tramas desnecessárias.
Quanto à série, é mencionada a existência de mais de um parque, mas a primeira temporada sabe que os personagens são mais importantes, então ela dá atenção exclusiva ao Velho Oeste. É apenas em sua segunda temporada que Westworld arrisca revelar dois novos parques: Shogun World, inspirado no japão feudal; e The Raj, recriando a Índia dominada pelos ingleses.
Questionando a natureza das adaptações
Adaptar não é apenas mudar alguns nomes e referenciar o material original. A transição de um formato para outro pode se fazer necessária por vários motivos, talvez uma releitura completa de uma obra, ou apenas uma atualização contemporânea, em alguns casos chega a ser uma corrupção total do original para elaborar uma crítica, mas o que vejo em Westworld é um caso em que a adaptação serve para explorar de maneira diferente os elementos da versão anterior, podendo aprimorá-los, trazendo um debate maior e até mais relevante através de temas que o original poderia ter estabelecido.
A adaptação da HBO altera e complementa algumas informações introduzidas no filme. Agora que termos como “sintético” e “inteligência artificial” fazem parte de nosso cotidiano, o que antes era conhecido como robô passa a ser chamado de Anfitrião, ou seja, essa é a denominação para os andróides prontos para receber os visitantes humanos, esses apelidados de Hóspedes.
Por falar nos personagens, esse foi um dos maiores acertos da série. No filme temos o implacável Pistoleiro, muito bem interpretado por Yul Brynner, com uma presença forte capaz de causar tensão em qualquer ambiente. Mas Ed Harris não fica atrás com seu Homem de Preto, que além de intimidador é um homem perturbado pelos demônios do passado, tão comprometido com os mistérios de Westworld ao ponto de colocar sua vida e a de outros humanos em risco.
Seguimos o ponto de vista de dois humanos com atitudes contrastantes na versão original, mas isso é deixado de lado assim que o longa se transforma em uma batalha entre os robôs defeituosos e eles. Na adaptação, os personagens tem características mais complexas, e assim observamos os dilemas existenciais de cada um, até mesmo dos Anfitriões, constantemente questionando sua realidade por conta de uma inteligência capaz de se adaptar (oferecimento de seu criador, Dr. Ford, fascinado pelas máquinas ao ponto de permitir que atinjam uma consciência própria). Isso não quer dizer que os episódios evitem sequências de ação, e essas são ótimas, mas a promessa da série é uma análise sobre a importância da identidade.
Outro avanço em questão de elenco e personagens é a presença de mulheres em papéis que não sejam apenas o de uma esposa entediada ou prostituta, as duas únicas opções no filme, que ao menos dá algumas falas para Majel Barrett, interpretando uma dona de bordel. Enquanto isso, a série é praticamente protagonizada por mulheres, o destaque indo para a dupla Dolores (Evan Rachel Wood) e Maeve (Thandie Newton), duas androides em busca de uma narrativa própria, mas apresentando métodos distintos para atingir a liberdade.
Em 1973, Michael Crichton dirigiu um filme cheio de conceitos envolventes e efeitos visuais impressionantes para a época, mas talvez Westworld tenha realmente mostrado seu verdadeiro potencial na transição para o formato seriado, onde os elementos do longa são explorados com mais atenção, e debates existenciais tomam conta de uma narrativa cada vez mais relevante para tempos em que um mundo similar ao de Westworld não parece tão ficção científica assim.
Me sinto na obrigação de começar este texto dizendo que as comparações constantes de Onisciente, a nova série de ficção científica nacional distribuída pela Netflix, com Black Mirror são, no mínimo, uma tremenda falta de referência, sem contar que afirmações como essa acabam sendo não apenas preguiçosas e repetitivas, como parecem diminuir a importância do material, ainda mais um criativo e bem desenvolvido como a produção brasileira de Pedro Aguilera.
Na trama, Nina Peixoto (Carla Salle) trabalha para uma enorme empresa de vigilância, e as coisas parecem ir bem até o dia em que seu pai é assassinado misteriosamente e o sistema que acreditou ser infalível não é capaz de revelar um culpado. Assim, Nina procura uma maneira de descobrir o responsável enquanto tenta burlar o sistema e as câmeras em sua volta.
Aguilera, responsável por roteiros de outro sucesso FC da Netflix, a distopia 3%, continua explorando o gênero, porém com uma abordagem diferente, trazendo uma premissa que, se formos realmente utilizar comparações (dessa vez, pertinentes), investe em elementos comuns nas obras literárias clássicas de Philip K Dick, Isaac Asimov e Aldous Huxley, principalmente o conto Minority Report e o romance Admirável Mundo Novo.
Felizmente, Onisciente não se limita às referências e cria um universo próprio, com personagens e regras bem estabelecidas. O roteiro arrisca cair em territórios perigosos, com pequenas conveniências envolvendo a proposta principal de abordar uma cidade monitorada constantemente por drones tão pequenos que a maioria dos cidadãos sequer percebe.
Esse é um pequeno risco tomado por um enredo bem executado, atento ao cotidiano de seus personagens, o que fortalece suas motivações, e a construção de um mundo que, ao primeiro olhar parece simples, mas logo revela sua conjuntura política, hierarquias e estruturas sociais, tudo de maneira simples e direta, e é nessa objetividade que a narrativa ganha força, sabendo exatamente o que deve aproveitar e o que deve ser deixado de lado.
Uma preocupação com produções nacionais que tentam explorar narrativas de gênero é a chance de soarem artificiais, com diálogos e ações pouco naturais. Por Onisciente ser uma ficção científica com uma linguagem visual mais norte-americana, há sequências onde algumas interações acabam soando mecânicas, mas isso é relevado quando consideramos que os personagens estão sendo vigiados o tempo inteiro, então devem ter cautela com o que dizem e fazem.
Mesmo com as limitações, o elenco faz um bom trabalho, principalmente Carla Salle, como a protagonista Nina, que vai de uma jovem tímida e generosa para uma pessoa mais calculista e intimidadora. Além dela, temos nomes como Sandra Corveloni e a ótima Luana Tanaka (do elenco da série 3%), essa última roubando algumas cenas com uma subtrama que promete ser mais importante em uma futura temporada.
Onisciente é mais um passo para o avanço de produções de gênero no mercado nacional, um que ainda pode ser bastante influenciado por material norte-americano, mas carrega uma voz cada vez mais forte.
Chegamos ao segundo episódio de Jornada nas Estrelas: Picard, agora revelando mais informações e estabelecendo melhor o rumo que a série deve tomar. Em Maps and Legends, Picard continua sua investigação sobre Dahj, e mesmo não tendo a ajuda de quem mais precisa, decide resolver tudo com as próprias mãos. Enquanto isso, Soji, a “irmã gêmea” de Dahj, começa uma relação com o misterioso Narek.
Hanelle M. Culpepper retorna no comando do segundo episódio, mantendo uma direção contida, mesmo que agora explore um pouco o formato, alternando entre presente e futuro durante um diálogo, por exemplo. Ainda assim, não é nada que chame atenção, sem contar que a direção de arte de Philip Lanyon, por mais polida que seja, não se esforça demais para manter um visual próprio e acaba caindo em território seguro, replicando a mesma textura e até os lens flares dos filmes de J.J. Abrams.
Para o elenco, temos a introdução dos atores David Paymer, como Dr. Benayoun, um antigo amigo de Picard; além dele, Michelle Hurd, que fará a recorrente Raffi Musiker. Podemos ver como vai ser a dinâmica entre os atores Isa Briones e Harry Treadway, Soji e Narek, respectivamente, com grande tensão sexual e espionagem.
Ainda é cedo para dizer como todos os arcos dramáticos podem se complementar, mas parece que há mais conspirações do que imaginamos, o que é interessante, mas será que Alex Kurtzman, o responsável pela franquia atualmente, forçou alguma cláusula em todas as produções de Jornada nas Estrelas exigindo a presença ou algo similar à Seção 31? Isso porque a organização secreta da Frota Estelar está em evidência em Discovery, sem contar que receberá uma série própria estrelando Michelle Yeoh. Para algo secreto, a Seção 31 está recebendo bastante atenção.
Agora vamos para:
MAKE IT SO – Referências, Teorias e Easter Eggs – SPOILERS!
O episódio abre no estaleiro Utopia Planitia, em Marte, no ano 2385. Uma voz anuncia a comemoração do Dia do Primeiro Contato. Isso nos situa na data 5 de Abril, e a data é referente ao dia em que os humanos fizeram contato com os vulcanos, no ano 2063, em Montana. Podemos ver o evento acontecer no filme Jornada nas Estrelas: Primeiro Contato.
É nessa cena que podemos ver melhor os sintéticos em ação. Um deles, F8, é visto sendo corrompido e acabando violentamente com a vida dos trabalhadores do estaleiro. Não está claro ainda o responsável ou a razão para isso, mas talvez a própria Federação esteja envolvida nisso.
Enquanto assiste às gravações da explosão que causou a morte de Dahj, os companheiros romulanos de Picard, Laris e Zhaban, consideram que esse tipo de trabalho secreto pode ser responsabilidade de uma organização ainda mais antiga que a Tal Shiar, chamada Zhat Vash.
Tal Shiar é uma conhecida agência de inteligência romulana, mencionada pela primeira vez em A Nova Geração, recorrente em Deep Space Nine. Embora Zhaban considere Zhat Vash um mito criado pela Tal Shiar, Laris convence Picard de sua existência.
Durante uma conversa, Soji diz para Narek que não estão em um Cubo Borg, mas sim um “Artefato”, isso porque “O cubo Borg é poderoso e onipotente” enquanto o Artefato está “perdido, separado de sua coletividade”. De acordo com essa informação e o fato de Soji sussurrar uma “mensagem de despedida” no ouvido de um dos Borgs descomissionados, parece que a personagem sabe muito mais do que imaginamos, e talvez Narek não seja o único com segredos.
Voltando a Terra, Picard recebe a visita de um velho amigo, o Dr. Benayoun. Eles conversam sobre o pedido de Picard para assumir uma nave e continuar sua investigação. Benayoun menciona a nave USS Stargazer, onde Picard atuou por anos como capitão antes de assumir o comando da Enterprise.
Mas o mais importante da conversa envolve o diagnóstico de Benayoun, onde ele conclui que há “uma pequena anormalidade no lobo parietal”. Em A Nova Geração, no episódio final duplo “All Good Things…”, Picard descobre sofrer de uma desordem neurológica chamada Síndrome Irumódica, que pode estar afetando a sua percepção temporal, já que ele afirma estar vivenciando eventos do futuro afetados diretamente pelas suas ações.
Quando Picard visita a Federação, podemos ouvir a música da série clássica, com um arranjo mais atualizado.
Depois de seu encontro frustrado com a Federação, Picard recebe a Dra. Jurati em sua casa. Enquanto espera, ela folheia um livro de contos do autor Isaac Asimov, intitulado “The Complete Robot”. Ainda que a edição tenha sido feita para a série, o livro é real, um compilado de todos os contos do autor de ficção científica sobre um de seus assuntos favoritos, robótica.
É claro que além de ser uma referência para os fãs do gênero e do autor, essa pode ser uma alusão ao personagem Bruce Madoxx, o ciberneticista fascinado por Data. Madoxx já foi mencionado algumas vezes até agora, então podemos esperar sua presença em algum momento da série.
Quando decide fazer sua viagem com uma nova tripulação, Picard é interrompido por Laris, que menciona William Riker, Geordi La Forge e Worf como possíveis aliados, mas Picard não aceita colocar seus amigos em risco.
Esse foi mais um episódio de Picard, Maps and Legends. O que tem achado da série até agora?
Poucos nomes servem como símbolo de esperança e compreensão como Picard, um dos personagens mais importantes da ficção científica e da televisão, interpretado por Patrick Stewart na série Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, que teve sete temporadas entre os anos 1987 e 1994. Mesmo sendo mais aclamado na pequena tela, a última vez que vimos Jean-Luc Picard foi no filme Jornada nas Estrelas: Nemesis, de 2002, e desde então sentimos saudade do capitão da Enterprise.
Felizmente, quase duas décadas depois, tivemos a confirmação de que Patrick Stewart retornaria ao papel, estrelando uma nova série intitulada apropriadamente como Jornada nas Estrelas: Picard. No Brasil, teremos episódios todas as semanas através do serviço de streaming Prime Video, da Amazon, e já temos o primeiro, intitulado Remembrance, para analisar.
Há vários obstáculos no caminho que podem atrapalhar o desenvolvimento de Picard, incluindo a necessidade de atrair uma nova audiência para um personagem já estabelecido, sem contar que os fãs já possuem uma série da franquia Jornada atualmente, Discovery, com uma abordagem mais dinâmica e voltada para a estética dos filmes de J.J. Abrams, o que pode ser um problema, já que uma série focada em Picard parece demandar um tratamento mais introspectivo, com atenção maior aos diálogos e as atuações.
O resultado final é um híbrido entre a ação rápida da timeline Kelvin (criada para distinguir os filmes de J.J. Abrams, que apresentavam uma “linha temporal alternativa”)e da série Discovery, com toques de A Nova Geração, dando espaço para momentos de reflexão e silêncio. Talvez nem todos concordem com essa decisão, mas particularmente considero um compromisso necessário, desde que tenhamos um enredo e personagens consistentes.
Da mesma forma, Picard se beneficia dos avanços tecnológicos e o orçamento atual da televisão para entregar um visual cinematográfico, com uma câmera melhor, capaz de dar mais atenção aos detalhes, além de um tratamento melhor nas cores e uma estética limpa. A direção do primeiro episódio fica por conta de Hanelle M. Culpepper, que usa seu repertório em séries como Flash e a própria Discovery, para trazer um dinamismo para as sequências de ação, com coreografias mais elaboradas, como as empolgantes batalhas com Phasers. É um pouco estranho ver tanta ação em volta de Picard, mas faz parte do compromisso mencionado no parágrafo anterior.
Começamos a série com um Picard aposentado, conhecido como o ex-almirante que abandonou a federação para liderar uma frota de resgate depois do surgimento de uma supernova que acaba destruindo o planeta Romulus. O que já era uma missão arriscada, logo transforma-se em tragédia depois de um grupo de sintéticos se rebelarem, causando também a destruição do estaleiro de Utopia Planitia, localizada em Marte. Além de ligar com as repercussões de suas ações, Picard conhece Dahj, uma jovem procurando refúgio ao lado do ex-almirante.
Não há uma série sem Patrick Stewart, e o ator entrega tudo com uma performance mais contida e melancólica, um homem arrependido com uma vida solitária, acompanhado apenas de seus dois ajudantes romulanos e um cachorro, apelidado de Número Um. Mesmo mais velho, Stewart não esquece como é interpretar o personagem, que até em seu ponto mais baixo, serve como uma luz no meio de todo o embate político e a possível ameaça envolvendo as origens de Dahj, interpretada por Isa Briones.
No elenco também somos apresentados ao personagem de Alison Pill, a cientista Agnes Jurati, que auxilia Picard em uma busca sobre o passado de seu amigo, Data, papel reprisado por Brent Spiner. No fim, conhecemos também Narek, personagem de Harry Treadaway. Como é apenas o primeiro episódio, o que temos é uma grande introdução ao universo da série, sem muito espaço para o desenvolvimento dos personagens, então ainda é cedo para avaliar como cada um está indo, se bem que até o momento todos parecem bem confortáveis, principalmente os veteranos Stewart e Spiner.
Com a bela composição musical de Jeff Russo, conhecido por seu trabalho em Fargo, Legion e – mais uma vez – Discovery, ótimos visuais e uma trama promissora, Remembrance é um ótimo ponto de partida para essa nova jornada.
Agora, vamos para a parte em que analisamos alguns aspectos específicos do episódio:
MAKE IT SO – Referências, Teorias e Easter Eggs – SPOILERS!
O episódio começa com a música Blue Skies, de Ervin Berlin. Para os fãs de Jornada, a música ficou mais conhecida por conta do filme Nemesis, quando Data cantou a música durante o casamento de William T. Riker e Deanna Troi. A importância da música para o episódio está ligada diretamente a importância de Data para a trama, já que ele é, aparentemente, o pai de Dahj.
Enquanto a música toca, assistimos Picard jogando poker com Data, mas no fim descobrimos que é tudo um sonho. As partidas de poker eram comuns entre os membros da Enterprise em A Nova Geração, e mesmo sumindo por um tempo, Picard decidiu voltar para participar dos jogos no último episódio da série.
Na sequencia, podemos ver um pouco mais de Chateau Picard, a vinícola da família Picard, agora comandada pelo ex-almirante, que passeia ao lado de seu cão, Número Um, uma referência ao seu antigo primeiro imediato, William T. Riker, que ele chamava por Número Um.
Voltando para casa, Picard pede para o replicador de comida o seu chá favorito, Earl Gray. Dessa vez, descafeinado.
No mesmo dia, Picard recebe uma equipe de reportagem em seus aposentos. Eles debatem a missão de resgate pela qual foi responsável, e é visível que a federação e algumas pessoas de alta patente não ficaram felizes com a ação.
A destruição de Romulus é um ponto importante para o universo de Jornada por conta da criação da linha temporal Kelvin (explorada nos filmes Star Trek, Star Trek: Além da Escuridão e Star Trek: Sem Fronteiras), resultado direto dos eventos envolvendo a supernova.
Em mais um de seus sonhos, Picard caminha pela sua vinícola e encontra Data, pintando um quadro. Esse é um dos hobbies que o personagem adota durante A Nova Geração, como uma maneira de expressar artisticamente.
Ao acordar, Picard visita o prédio de “Arquivos da Frota Estelar”, onde ficam guardados documentos e outros objetos de seu tempo atuando como capitão da Enterprise. A sala está recheada de referências, como uma réplica da Enterprise, um Bat’leth (arma de batalha Klingon) e o banner de comemoração “Captain Picard Day”, do episódio The Pegasus, quando as crianças da nave decidem fazer uma festa celebrando o capitão.
Mas a grande revelação da cena é uma das pinturas de Data, onde Dahj pode ser vista, e a obra é intitulada “Filha”. No episódio The Offspring, de A Nova Geração, em uma das tentativas do personagem em se aproximar da humanidade, Data cria uma “filha” chamada Lal. O experimento não dá certo e ela precisa ser desativada, mas o androide mantém sua memória e faz uma pintura dela.
Continuando sua investigação, Picard vai ao instituto Daystrom, onde conversa com a doutora Jurati. Ela revela como tem mantido as partes do andróide B-4, uma versão inferior de Data, atualizado com suas memórias depois de se sacrificar pela tripulação em Jornada nas Estrelas: Nemesis.
Durante a conversa, Jurati menciona Bruce Maddox. No episódio The Measure of a Man, da segunda temporada, Maddox é um ciberneticista interessado em desmontar Data para estudar seus componentes e criar novas versões do androide, mas não tem sucesso.
No fim do episódio, somos introduzidos a uma instalação dos Romulanos e ao personagem Narek. Mas com a câmera se distanciando, descobrimos que ela está localizada dentro de um cubo Borg desativado.
O que achou do episódio?
Picard está de volta e a série parece mais promissora do que alguns imaginaram, principalmente depois de acabar com algumas teorias que estavam preocupando os fãs.
2019 foi um bom ano para a ficção científica. Ainda que uma série ou outra possa decepcionar ou ser simplesmente ruim, no geral, foi um ano com o retorno de nomes fortes e a estréia de alguns que prometem evoluir bastante, sem contar as minisséries que, até o momento (nunca se sabe quando um estúdio pode encomendar uma segunda temporada), entregaram uma história impressionante.
Antes de começar a lista, vale mencionar que as séries destacadas, boas ou não, correspondem ao gosto de quem escreve essa matéria. Também serão válidas apenas as temporadas lançadas esse ano (se ela não tem data para sair no Brasil, considero o lançamento no país original), e aquelas que eu assisti em sua totalidade, então vou deixar logo algumas menções honrosas de séries que comecei, mas ainda não terminei, como a terceira temporada de Stranger Things e The Handmaid’s Tale, assim como a estréia das séries Osmosis e Raising Dion. As duas começaram muito bem, mas por motivos de agenda e a confusão de tanto material para ler / assistir / resenhar, acabei deixando elas para depois.
Outros exemplos, como a aclamada Dark, não entram na lista pelo simples fato de eu ter demorado demais para começar a assistir, então ainda estou no começo (mas o pouco que vi já achei muito bom). Independente disso, a lista está longe de ser pequena, e mesmo com alguns exemplos de “séries ruins”, felizmente a maioria teve um resultado positivo.
A lista segue uma ordem de pior para melhor série, então vamos começar logo indo das decepções do ano, chegando aos poucos nas obras que melhor representaram o gênero ou foram simplesmente excelentes.
The I-Land e Another Life (Estréias)
As duas piores do ano dividem a posição por terem problemas similares. Enredos mal executados, personagens sem desenvolvimento e dramas forçados ao ponto de beirar o ridículo, tanto que cheguei a fazer uma matéria apenas para destacar o que deu errado nas duas séries, e na maneira como a Netflix vem abordando algumas produções de ficção científica.
É uma pena ver uma atriz boa como Katee Sackhoff interagindo com personagens tão ruins (destaque para a palavra “personagens”, isso porque a culpa é exclusivamente do roteiro, já que alguns nomes do elenco já estiveram bem em outras produções) em Another Life; e The I-Land não foge da bronca por ter basicamente copiado a estrutura narrativa e vários elementos de Lost, incluindo a premissa. Duas grandes decepções, mas agora é hora de começar a tirar o gosto ruim da boca e partir para algo um pouco melhor.
Love, Death & Robots (Estréia)
A proposta de Love, Death & Robots é bem criativa. Uma série em formato de antologia contendo dezoito curtas com temática sci-fi, por diferentes artistas. Criada por Tim Miller, de Deadpool, e David Fincher, de Clube da Luta, você pode ir alternando entre os curtas sem problema, já que eles não possuem qualquer ligação narrativa. É claro que em uma coletânea de dezoito histórias, algumas podem ser menos interessantes, outras podem acabar se tornando repetitivas, mas as que funcionam, funcionam bem.
Você pode saber mais sobre cada um dos curtas em um vídeo feito para o canal do Primeiro Contato.
Black Mirror(5ª Temporada)
Para sua quinta temporada, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente considerando que todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série.
A série parece estar um pouco perdida em alguns momentos, e entrega um de seus episódios mais fracos, Rachel, Jack and Ashley Too. Mas há casos onde Black Mirror continua surpreendendo o público com uma premissa original, como em Striking Vipers; ou quando não é muito original, compensa com boas atuações e tensão, o que acontece em Smithereens.
Além da Imaginação (Estréia)
Um clássico está de volta. Jordan Peele, diretor de Corra e Us, assume o posto de anfitrião da série, e mesmo que Rod Serling, o apresentador original, seja insuperável, Peele faz um bom trabalho. Em uma temporada com dez episódios, Além da Imaginação pode ter um retorno um pouco turbulento, com pequenos tropeços ao longo do caminho, mas no geral consegue se salvar trazendo narrativas relevantes e com premissas instigantes.
Ainda que em seu último episódio a série tenha uma reviravolta um pouco desnecessária, ela deixa um indício de que a segunda temporada pode ser um pouco mais livre para explorar as bizarrices que a série clássica adorava, o que esse remake parecia ter um pouco de vergonha. Você pode assistir os vídeos sobre cada um dos episódios no nosso canal.
His Dark Materials (Estréia)
Com um elenco impressionante, incluindo nomes como James McAvoy e Lin Manuel Miranda, His Dark Materials é a promessa de uma adaptação mais fiel e competente da série de livros de mesmo nome, que recebeu uma versão esquecível para os cinemas, em 2002, levando o título do primeiro livro, A Bússola de Ouro.
A primeira temporada tem apenas oito episódios, e é uma pena que demore para realmente engatar na trama, que começa apresentando muitas informações, mas explorando-as bem pouco. Felizmente, quando as coisas entram no eixo, His Dark Materials pode brilhar além de suas ótimas atuações e efeitos especiais de qualidade, provavelmente os melhores do ano.
Star Trek: Discovery (2ª Temporada)
Não é uma lista de ficção científica sem um pouco de Star Trek. A segunda temporada de Discovery se arrisca brincando com o passado e estabelecendo um novo futuro, mas ainda tem seus pequenos problemas, como subtramas mal valorizadas ou diálogos ruins. Ainda assim, Discovery continua uma boa escolha para matar a saudade da franquia, com alguns episódios que seguem a essência da série, como New Eden, dirigida pelo veterano Jonathan Frakes.
Depois de uma primeira temporada inconsistente, havia uma preocupação para o que viria neste segundo ano, principalmente depois do season finale da temporada anterior introduzir a clássica NCC-1701, capitaneada no momento por Christopher Pike (Anson Mount). E por falar em Anson Mount, o rapaz foi tão bem aceito pelos fãs que a ideia de um spin off surgiu antes mesmo da temporada acabar.
Undone (Estréia)
Após terem escrito o sucesso Bojack Horseman, da Netflix, os roteiristas Kate Purdy e Raphael Bob-Waksberg (também showrunner da série), decidiram desenvolver uma nova produção, com um formato diferente e para outro serviço de streaming, dessa vez a Amazon Prime Video. A minissérie Undone é um drama peculiar em sua apresentação, envolvido em elementos de ficção científica.
Trazendo a atriz Rosa Salazar como protagonista, e utilizando rotoscopia, uma técnica onde as filmagens com atores são aproveitadas para que novos quadros sejam desenhados “por cima delas”, Undone foi uma das maiores surpresas do ano, e um grande acerto da Prime Video, apresentando uma experiência arriscada, capaz de distrair e distanciar alguns não acostumados ou satisfeitos com a técnica (o que não é o meu caso), mas que ainda funciona muito bem como a jornada de uma jovem descobrindo sua própria identidade enquanto encara o desafio da aceitação. Leia nossa crítica completa da temporada.
Rick and Morty (4ª Temporada)
Colocar Rick and Morty nessa lista é trapacear um pouco, já que apenas metade da temporada foi lançada esse ano, enquanto a outra chega apenas em 2020. Mas tecnicamente, os cinco episódios da série liberados esse ano são o que tivemos de Rick and Morty, e qualquer coisa dessa animação já vale a pena ser mencionada.
Depois de uma terceira temporada com recepções mistas (por conta de problemas no estúdio, atrasos e mudanças na sala de roteiristas, e por aí vai), Rick and Morty volta mais forte mostrando que consegue equilibrar narrativas originais e entregar um pouco do que os fãs querem, mesmo que na maioria dos casos esteja fazendo piada deles (apenas aqueles que merecem a zombaria, como quem sobe no balcão do McDonalds pedindo um sachê de molho que a série menciona em um episódio).
Depois de ser cancelada injusta e prematuramente pelo canal SyFy quando acabou de entregar uma ótima terceira temporada, The Expanse conseguiu um novo lar no serviço de streaming da Amazon, o Prime Video. O mais impressionante não é apenas o fato de ter sido renovada para uma quarta temporada, mas por continuar com uma base de fãs forte e críticas positivas sendo uma série de ficção científica mais “pesada” no meio de tantas produções de maior nome.
Com essa mudança, alguns poderiam ficar preocupados com o rumo tomado pela série, ainda mais com a redução de episódios por temporada, indo de treze para dez (como foi em seu primeiro ano), ou ter que mexer nos cenários e agendas de elenco. Felizmente, a maioria dessas preocupações foram desnecessárias e tivemos um ótimo retorno para uma das melhores séries da atualidade.
Legion (3ª Temporada)
Em um mundo cheio de adaptações de quadrinhos no cinema e na TV, tivemos dois destaques positivos, e o primeiro deles é Legion, que teve sua terceira e última temporada esse ano. Enfrentando a baixa audiência e orçamento modesto, o criador Noah Hawley conseguiu descobrir maneiras de criar uma despedida justa para um personagem complexo como David, o protagonista interpretado por Dan Stevens.
Ambientado no universo dos X-Men, da Marvel Comics, Legion conta a história de David Haller, o filho do líder dos mutantes, Charles Xavier, lidando com seus demônios interiores, literalmente. Com um enredo bizarro, excelente direção de arte e um bom elenco, Legion pode ter passado despercebida por alguns, mas é uma das melhores séries do ano.
Watchmen (Estréia)
Uma das maiores surpresas do ano é Watchmen. E eu não digo isso por terem feito mais um derivado do quadrinho original de Alan Moore e Dave Gibbons, também não é por ser no formato de série para HBO, o que realmente surpreendeu o público é como a adaptação funcionou bem.
Aproveitando os temas e os debates políticos do quadrinho, o criador da série, Damon Lindelof, seguiu o caminho da renúncia por uma versão completamente submissa ao material original, mas ainda assim respeitando a linguagem de Moore, sem idealizar seus personagens, mostrando como realmente poderia ser um cotidiano entre mascarados.
Um elenco perfeito, enredo de primeira e a maravilhosa trilha sonora da dupla Trent Reznor e Atticus Ross fizeram de Watchmen o melhor lançamento da HBO esse ano.
Criada pela genial Brit Marling, The OA se posiciona como uma das produções mais originais atualmente, e eu ouso arriscar que é o mais próximo que teremos de algo no nível de Twin Peaks (que saudades de você!). Essa segunda parte (como chamam as temporadas) mescla alguns gêneros sem perder seu ritmo. A ficção científica ainda é uma base para a série, mas o misticismo, já presente antes, agora tem um papel ainda maior na jornada.
O que transformou The OA em um evento para mim é a forma como alterna organicamente entre gêneros, traz personagens envolventes e abraça cada pedaço da trama, até aqueles que podem soar vergonhosos à princípio, mas que logo se revelam um momento executado com tanta honestidade e vontade de inovar que te faz admirar a produção com mais força.
Meticulosa em cada elemento, The OA é facilmente a melhor série de ficção científica do ano.
O que achou da lista? Se discorda, concorda ou acha que faltou algo, é só comentar abaixo.
Felizmente, esse foi um bom ano para o gênero na TV e nos serviços de streaming, e pelo que vi das estréias de 2020, o próximo ano parece ainda melhor.
Depois de fazer piadas com dragões e gatos no episódio anterior, Claw and Hoarder: Special Ricktim’s Morty, essa semana continua explorando o mundo animal com serpentes alienígenas. O alvo das piadas de Rattlestar Ricklactica envolvem um elemento que a série sempre evitou: a viagem no tempo.
A decisão de negar esse recurso, bastante comum da ficção científica, não se dá apenas pelas possíveis inconsistências de uma narrativa como essa, mas para criar um diferencial entre Rick and Morty e sua principal inspiração, a trilogia de filmes De Volta Para O Futuro, de onde a série tirou sua dinâmica básica, tendo Rick and Morty como uma versão “ridicularizada” do Dr. Emmett Brown e do estudante Marty McFly (Morty é uma clara referência ao nome do protagonista do filme clássico), respectivamente.
Para quem não sabe, a primeira versão da série, quando ainda era um curta para o festival Channel 101 (um projeto de Harmon onde criadores podiam imaginar e executar o programa que quiser), foi uma paródia direta de De Volta Para o Futuro, chamada The Real Animated Adventures of Doc and Mharty, criada por Justin Roiland, que queria literalmente apenas irritar o estúdio Universal. Roiland faz a voz dos dois personagens principais, e comanda até hoje Rick and Morty, ao lado de Dan Harmon.
Mas por que trazer uma narrativa de viagem no tempo? A série prova constantemente como tem pouco interesse em abordar o assunto, é só prestar atenção na prateleira de ferramentas de Rick, onde uma caixa intitulada “Time Travel Stuff”, ou “Tralhas de Viagem no Tempo”. A resposta mais óbvia, e provavelmente a correta, é para provar como os roteiristas consideram viagem temporal uma ideia ruim.
Em mais uma de suas viagens, Rick nota que o pneu de sua nave está furado, mas pede para Morty ficar no carro enquanto faz o conserto, afinal, o espaço é perigoso. Como esperado, seu sobrinho não segue o conselho e acaba mordido por uma serpente espacial (o que é basicamente uma serpente comum, só que em um traje espacial – não sei se essa descrição foi relevante, pareceu algo bastante auto-explicativo). O veneno se espalha pelo corpo de Morty, mas Rick consegue salvá-lo a tempo depois de descobrir sobre uma civilização de serpentes, bastante similar a nossa, mas apenas em comportamento.
Morty, que acabou matando a serpente espacial, se sente mal e procura uma substituta para enviar ao planeta dela. O resultado é uma confusa sequência de eventos que acaba transformando a civilização serpente em um futuro distópico por conta da guerra entre elas e as máquinas. Enquanto isso, na Terra, Jerry tenta acender as luzes natalinas, mas nem isso consegue fazer sem botar sua vida em risco, e em uma sequência ainda mais confusa, seguimos a jornada de Jerry apanhando em bares e derrubando um avião cheio de passageiros.
Como deu para notar pela premissa, o título Rattlestar Ricklactica pode até ser uma paródia ao nome da série Battlestar Galactica, mas a principal referência do episódio é a série de filmes Exterminador do Futuro, onde temos a viagem no tempo como principal recurso narrativo, um futuro distópico e um salvador da humanidade, que no episódio desta semana acaba sendo Morty mesmo.
Rattlestar Ricklactica pode confiar um pouco demais na subtrama envolvendo Jerry, que é um ótimo personagem mas não sei o quanto dessa sua “jornada” é realmente relevante para o episódio; ainda assim, é mais um caso similar ao de One Crew Over the Crewcoo’s Morty, onde as piadas são rápidas e há tantas coisas acontecendo em uma cena que a confusão acaba resultando em algo ainda mais engraçado do que o esperado.
Agora, a temporada vai entrar em uma pausa, e mesmo que ainda não esteja confirmada a data para o lançamento dos próximos episódios, vamos teorizar um pouco e listar algumas referências:
“Show Me What You Got!” | Referências e Teorias
Quando Rick descobre ter um pneu furado, mostra que sempre teve um alerta para a situação, mas nunca o usa, isso porque ele vem em um pacote com a voz de celebridades, a de Rick acaba sendo Christopher Walken. Essa parece ser uma menção aleatória até aquele ponto, mas depois, quando Beth está em sua nave, Rick a “paralisa no tempo” com controle remoto.
Essa é uma referência ao filme Click, de Adam Sandler, onde um homem recebe um controle capaz de rebobinar e adiantar o tempo. No filme, Christopher Walken interpreta o personagem que entrega essa ferramenta para o protagonista. O nome do seu personagem? Morty.
Assim que Morty mata a serpente astronauta, ele menciona como ela pode ser o “Buzz Aspirina”, então Rick o corrige dizendo que o correto é “Buzz Advil”. Essa é uma piada com o astronauta Buzz Aldrin, conhecido por pilotar a Apollo 11, em 1969, e ser considerado o “segundo homem a pisar na lua”.
Se sentindo culpado por matar “Buzz Advil”, Morty visita uma loja para comprar um réptil substituto. Entre os produtos da loja, podemos ver (no canto superior direito) o “bom garoto” de propaganda Snuffles em uma embalagem de ração.
Snuffles foi o cachorro de Morty que acaba atingindo alto nível de QI por conta de um capacete feito por Rick, no episódio Lawnmower Dog, da primeira temporada.
Enquanto Morty tenta roubar as naves da nave de Rick sorrateiramente, escutamos um comercial falando algo sobre um produto chamado “Plumbus”. Ele já foi mencionado algumas vezes, principalmente no episódio Interdimensional Cable 2: Tempting Fate, da segunda temporada, onde Justin Roiland passa o maior tempo improvisando comerciais de várias dimensões. A piada é que o público nunca sabe o que o produto faz, e a série brinca com isso dizendo nos comerciais que “todos sabem o que ele faz, então não há razão para explicar”. Você pode assistir o comercial na íntegra, lançado em 2015 no canal do Youtube da Adult Swim:
Voltando a falar sobre a caixa de tralhas de viagem no tempo, a “Time Travel Stuff”; quando Rick e Beth retornam de sua procura por Jerry, podemos ver a caixa na estante, onde sempre esteve, intocada. Mas quando uma invasão das cobras ocorre, a caixa está virada, derrubando seu conteúdo. Uma confirmação de que a série sabe o risco que corre em mexer com algo estabelecido desde a primeira temporada.
Na realidade Exterminador do Futuro das serpentes, temos uma viagem aos anos 1985 de sua realidade, e é engraçado ver que nela também tiveram uma versão do filme De Volta para o Futuro, é só ver o pôster no M.I.T. daquela realidade.
Depois de derrotar as cobras, Morty fica preocupado com as repercussões temporais, mas Rick o acalma dizendo que isso é problema dos policiais do tempo, então vemos um dos oficiais chamado Shleemypants, dublado pelo comediante Keegan-Michael Key. A raça de policiais do tempo já apareceu antes, no episódio A Rickle in Time, da segunda temporada.
Além deles, uma outra alusão visual menor ao episódio A Rickle in Time pode ser vista, quando vários gatos flutuam no exterior do “4º Departamento de Polícia Tempo-Dimensional” (acho que se escreve assim), lembrando a piada literal sobre o dilema “gato de Schrödinger”.
A cena pós-crédito responde o que aconteceu para que o Morty do futuro ficasse com um olho roxo. Por mais que seja apenas uma brincadeira, é curioso como isso pode ser um tipo de ligação com o Morty do Mau, conhecido por usar um tapa-olho nas primeiras temporadas.
Uma das maiores surpresas do ano é Watchmen. E eu não digo isso por terem feito mais um derivado do quadrinho original de Alan Moore e Dave Gibbons, também não é por ser no formato de série para HBO, o que realmente surpreendeu o público é como a adaptação funcionou bem. Aproveitando os temas e os debates políticos do quadrinho (sim, quadrinho TEM QUE TER POLÍTICA, não existiria Watchmen sem isso), o criador da série, Damon Lindelof, seguiu o caminho da renúncia por uma versão completamente submissa ao material original, mas ainda assim respeitando a linguagem de Moore, sem idealizar seus personagens, mostrando como realmente poderia ser um cotidiano entre mascarados.
No último episódio da temporada (até agora, não há confirmação de continuações), intitulado See How They Fly, temos um clímax satisfatório, em um episódio que consegue revelar as peças que faltavam e entregar uma conclusão impactante. Ainda que rápido demais e algumas subtramas tenham perdido um pouco de seu fôlego e outras ficaram um pouco previsíveis por conta da presença de Dr. Manhattan, valeu a pena a jornada, e Lindelof merece alguns elogios por conseguir talvez a única adaptação de Watchmen que traga algo original e realmente compreenda a abordagem de Moore ao universo dos super-heróis, ao invés de apenas tentar manter os direitos do quadrinho nas mãos da DC por mais alguns anos.
Sem mais delongas, vamos para:
Sob o Capuz: Referências e Teorias (SPOILERS)
Estamos em 1985, assistindo Adrian gravar seu discurso sobre o plano da lula gigante para o futuro presidente dos EUA, mas enquanto ele está distraído com as filmagens, uma faxineira, Bian, consegue invadir o seu escritório, descobrir a senha de seu computador e encontrar várias amostras de sêmen. Ele coleta uma das amostras e usa uma seringa para se inseminar.
Podemos ver a senha do computador de Adrian, “Rameses II”, a mesma que Rorschach e Dan descobrem nos quadrinhos enquanto vasculham entre os livros do homem mais inteligente do mundo. Durante as gravações, podemos ver mais de Karnak, a instalação de Adrian na antártica, e reconhecemos algumas imagens dos quadrinhos, como os relógios e a série de TVs conectadas no salão principal.
Pulamos para 2008 e Lady Trieu bate na porta de Veidt, em Karnak. Mesmo relutante em receber visitas, Adrian a deixa entrar. Durante sua conversa, várias revelações são feitas, como a ideia da cabine telefônica ter vindo de uma piada de Veidt, ou de todos os recursos de Trieu, um deles sendo um satélite orbitando Europa, e finalmente descobrimos sua motivação. Ela não quer salvar o mundo da Kavalaria, mas sim roubar o poder de Manhattan para si, tentando corrigir tudo que há de errado no mundo. É claro que nem mesmo Adrian considera o plano megalomaníaco de Trieu uma boa ideia. Como se isso não fosse o suficiente, Trieu revela que ser a filha de Adrian.
Estamos de volta ao cativeiro de Veidt, em Europa, e pelo visto as coisas estão indo de acordo com o plano quando uma cápsula espacial desce dos céus para levar Adrian de volta ao planeta Terra. Mas antes de ir, ele precisa enfrentar o descontentamento do Guarda, que atira em Adrian, mas é surpreendido ao ver que seu mestre conseguiu pegar a bala no ar. Nos quadrinhos, Ozymandias faz a mesma coisa, capturando a bala da arma de Laurie.
Com a derrota do Guarda, que (sem surpreender o público) também é um dos Sr. Phillips, Adrian segue para a cápsula e faz sua jornada de volta para casa. Temos um salto temporal e estamos no presente, e vemos que a estátua de Adrian na casa de Trieu era LITERALMENTE ele, só que preservado para o momento em que o Relógio do Milênio funcionasse. No meio disso tudo, Bian confirma para Trieu que sabia ser a sua mãe. Essa é uma cena rápida, que infelizmente merecia mais espaço e atenção para ser revelada com calma, o que entra como exemplo da crítica sobre o episódio ser rápido demais.
Retornamos à Tulsa; Temos um rápido vislumbre do reformado teatro Dreamland, agora comandado por Will Reeves, o avô de Angela. Quando os carros de Trieu param na cidade, podemos ver a banca de jornal novamente, onde Bian sempre comprava de tudo para sua Trieu. Ozymandias conversa com o jornaleiro e fica indignado como parte da população já o esqueceu.
Na conversa, Adrian confirma que “o fim está próximo”. Algo que Rorschach sempre carregava escrito em uma placa nos quadrinhos, enquanto andava pelas ruas sem seu uniforme.
É hora de checar como está o plano da Kavalaria. O grupo de supremacistas recebe visitas especiais, uma delas sendo John Keene, o pai do senador Joe, que entra no “evento” fazendo um sinal dos Ciclopes. Laurie assiste a reunião e escuta o discurso de Joe Keene sobre a “dura realidade dos brancos nos EUA”. Depois de obter sucesso capturando Manhattan, Keene tira sua roupa para entrar na câmara de teste, ficando apenas com uma cueca ridícula, bastante similar a utilizada por Manhattan nos quadrinhos.
Além disso, finalmente tivemos o retorno de Looking Glass, infiltrado entre os membros da Kavalaria. E junto dele, entra Angela, que interrompe o processo tentando evitar um desastre, mas já é tarde demais e Lady Trieu está chegando.
Lady Trieu chega ao encontro da Kavalaria e consegue trazer seu Relógio do Milênio. Laurie reencontra Adrian, que a chama pelo nome original, Juspeczyk; Keene explode na câmara de teste depois de não ter feito todos os procedimentos corretamente. Trieu lê uma carta de Reeves para todos, deixando claro que foi ele quem entregou Manhattan para que ela pudesse, em troca, eliminar a Kavalaria.
Manhattan envia Looking Glass, Adrian e Laurie direto para Karnak, onde Adrian elabora um plano para deter Trieu usando sua chuva de lulas, dessa vez deixando-as congeladas, o que as torna mortais. Ainda assim, é tarde demais para salvar Manhattan, que teve todo seu poder drenado pela máquina de Trieu. Antes de ir, ele se despede de Angela e diz que a manteve ali para que ele não morresse sem ela ao seu lado.
Durante a cena, Manhattan diz estar sendo afetado pela jaula na qual foi capturado. Ele começa a falar coisas aparentemente aleatórias, mas são algumas falas retiradas diretamente do quadrinho. A primeira sobre “tudo que vemos dar estrelas são sua fotografia”, um dos pensamentos de Jon quando chega em Marte na HQ. Depois, ele menciona sobre baixar a temperatura e o nome Janey, que é uma referência ao nome Janey Slater, a namorada de Jon quando ele ainda era apenas um cientista, antes dos poderes de Manhattan.
Depois de sobreviver a chuva de lulas que destrói o Relógio do Milênio e enterra Lady Trieu em sua própria criação, Angela vai ao encontro de Will, que está cuidando das crianças dentro do teatro Dreamland. Os dois tem uma conversa franca e Will comenta como “você não pode se curar por trás de uma máscara. Feridas precisam de ar”.
Quando a família sai do teatro, podemos ver que as letras remanescentes depois da chuva de lulas congeladas formam Dr. M, ou seja, Doutor Manhattan.
Para terminar a história de Adrian, Laurie e Looking Glass, é revelado o paradeiro da Archie original, a nave pilotada por Coruja nos quadrinhos. Adrian a tirou da neve e manteve segura em Karnak. Ele chega a mencionar o sobrenome de Dan, Dreiberg, e menciona como a polícia usou o design original para criar as naves que vimos no começo da temporada.
Chegando em casa, Angela coloca as crianças para dormir e oferece um quarto para Will. Ela limpa a bagunça deixada por Jon no episódio anterior, quando ele tenta cozinhar um omelete mas acaba quebrando alguns ovos. Isso faz com que Angela lembre de um diálogo entre os dois, do episódio A God Walks Into Abar, sobre uma possível transferência de poderes de Manhattan para outro organismo. Ela vai para a piscina, engole um dos ovos e tenta caminhar na água. A temporada acaba.
O que achou da temporada?
Parece que acertamos algumas coisas, mas será que isso é tudo? Além do desfecho ambíguo, alguns arcos dramáticos ficaram em aberto, e as várias menções ao Coruja podem ser mais do que apenas referências, talvez até um indício de possíveis tramas para uma segunda temporada. Mas vai saber.
No fim, Lindelof fez um ótimo trabalho em adaptar uma das maiores HQs da história, criando algo novo e envolvente. Vamos ver o que ele planeja em seguida, e se Watchmen retorna para mais um ano. É só lembrar que “nada acaba”
Até a próxima!
ps: Se você parou para ler o PeteyPedia depois do episódio, descobriu que a banda Nine Inch Nails (liderada por Trent Reznor, compositor da trilha de Watchmen) também existe no mundo da série. Mas ainda mais importante, já não precisa mais se preocupar com a identidade do Homem-Lubrificante. Era Petey mesmo.