Eugene Wesley Roddenberry começou sua carreira em Hollywood na década de 50, vendendo roteiros para programas como a série policial Cidade Nua (1958-1963) e o western Paladino do Oeste (1957 – 1963). Foi em 63 que ele começou a produzir sua primeira série, O Tenente, que durou apenas uma temporada. Atores que fizeram parte do elenco em alguns episódios, como Leonard Nimoy e Nichelle Nichols, mais tarde estariam no seu próximo grande projeto.
Jornada nas Estrelas foi apresentada e recusada por estúdios como MGM (onde Gene já havia trabalhado, com O Tenente), até que Oscar Katz e Herb Solow, do estúdio de produção Desilu (propriedade de Lucille Ball, um dos nomes mais importantes para a criação de Jornada, acredite ou não), foram abordados com a ideia.
O estúdio ficou interessado e fez o possível para que a série de Roddenberry fosse ao ar, procurando emissoras que pudessem exibir o programação. Foi com a NBC que conseguiram um contrato e em 1964, o episódio piloto “The Cage” foi ao ar.
Apelidado pelos fãs de “Grande Pássaro da Galáxia”, uma referência à um episódio da série, Roddenberry era o rosto por trás dos conceitos básicos de Jornada nas Estrelas, era o mentor da série. Mesmo quando não estava por perto, era a sua visão que os roteiristas levavam em consideração antes de decidir a maioria dos acontecimentos de algum episódio. Ele viveu o suficiente para ver sua criação ir parar nos cinemas, ganhar novas séries, quadrinhos, livros e suas próprias convenções.
Foi no mesmo ano em que a franquia estava em seu sexto filme com o elenco da série original, The Undiscovered Country (1991), que Roddenberry nos deixou, sofrendo um ataque cardíaco em outubro. Seu legado inclui ser o primeiro produtor da televisão a ter sua própria estrela no Hollywood Hall of Fame (PEARSON, 2014), membro do conselho executivo do Sindicato de Roteiristas de Hollywood e regulador da Academia de Artes & Ciências Televisivas.
Um anos após sua morte, as cinzas de Roddenberry foram levadas ao espaço a bordo do foguete Columbia, do Centro Espacial Kennedy, em 22 de Outubro de 1992. Contidas em um pequeno recipiente que servia como urna, as cinzas do grande pássaro foram espalhadas no espaço, onde após seis anos orbitando o nosso planeta, queimou na atmosfera
Referências: NOGUEIRA e ALEXANDRIA, 2009:16. PEARSON, 2014
Se tem uma série que contribuiu para transformar a ficção científica em um dos gêneros mais intrigantes na televisão é Jornada nas Estrelas. Revolucionária em vários aspectos (alguns deles já mencionei no meu texto sobre Uhura e seu impacto cultural), essa é uma franquia que trouxe algumas das melhores narrativas que já passaram pela TV ou cinema — dependendo de qual filme você estiver assistindo, é claro.
Todo fã de Jornada tem um spin-off favorito, olha que não falta opção, e por mais que eu adore a equipe da versão clássica ou a abordagem mais séria de Deep Space Nine, encontro o equilíbrio perfeito em A Nova Geração. Ótimos personagens e um enredo excepcional renderam alguns episódios memoráveis e uma aula de como uma boa história sci-fi deve ser escrita. Um desses episódios é Darmok, o segundo episódio da quinta temporada, escrito por Philip LaZebnik e Joe Menosky e dirigido por Winrich Kolbe.
Uma das características mais curiosas da série é a exigência de Gene Roddenberry, criador do universo Trek, em evitar conflitos na trama, mantendo consistente a proposta utópica da franquia de um futuro onde não há fome ou a necessidade por posse. Isso faz com que a vida dos roteiristas seja um inferno, afinal como escrever qualquer história sem conflito? É uma das noções básicas de qualquer estrutura narrativa, mas não é como se fosse tão extremo assim, ainda temos conflitos básicos em Jornada nas Estrelas, seja internos ou externos, envolvendo geralmente as relações entre o homem e a natureza, ou ele mesmo. O próprio dilema envolvendo a primeira diretriz, o princípio de que nenhum membro da federação deve interferir no desenvolvimento de outras civilizações, já é um conflito em si, por vezes fazendo com que os personagens entrem em um impasse que pode afetar a dinâmica geral.
Com um foco maior em executar a trama de maneiras mais inteligentes, onde um diálogo tem mais poder que qualquer raio laser disparado por um phaser, não faltam episódios onde a tripulação da Enterprise simplesmente não possui um antagonista principal direto — até mesmo os Borg, mesmo que antagonistas, servem mais como inimigos involuntariamente, já que seu papel é assimilar e aprender, evoluir e sobreviver. Talvez o maior adversário da franquia, ou o mais popular, seja Khan, mas não falaremos dele aqui.
Considerando a maneira como Jornada desenvolve sua trama, um episódio sempre me vem em mente, e é Darmok, da quinta temporada de Nova Geração. Essa é uma história que mostra a importância da comunicação, tornando-a uma das ferramentas essenciais para a vida. No episódio, a Enterprise se aproxima do território de uma raça conhecida como Filhos de Tamar, aparentemente pacífica, que está tentando entrar em contato com a frota. Mas quando Picard tenta sua abordagem diplomática rotineira, é transportado pelos tamarianos para um planeta próximo, El-Adrel IV, acompanhado de Dathon, o capitão da nave dos Filhos de Tamar. Tudo parece uma grande armadilha para que Picard e Dathon combatam até a morte, mas aos poucos descobrimos as verdadeiras intenções da raça e a importância em escolher Picard para o “combate”.
Picard é um estudioso, apaixonado por arqueologia e história, ele é a pessoa perfeita para a missão dos tamarianos, que arriscaram tudo confiando no capitão da Enterprise. Quando ele começa a falar com Dathon, escuta coisas como “Darmok e Jalad em Tanagra” ou “Shaka, quando as muralhas caíram”, o que não faz sentido algum para nós, mas Picard percebe a peculiaridade no discurso da raça, que se comunica por metáforas inspiradas em sua própria mitologia. Dathon usa nomes como Darmok, Jalad ou Shaka, mas essas são figuras de uma cultura única, o que impossibilita uma tradução universal. Assim, os dois passam a maior parte do tempo tentando conversar e se unir contra uma criatura misteriosa na superfície daquele planeta.
Enquanto as duas tripulações se preocupam com seus capitães, compreendemos a ideia dos tamarianos, colocando os dois líderes em uma situação de perigo para que desenvolvam uma ligação e tornem-se companheiros. É na batalha que os laços são forjados com mais força, como aconteceu quando os guerreiros Darmok e Jalad “trabalharam juntos” para sobreviver em Tanagra (daí o Darmok e Jalad em Tanagra), mas desta vez temos Picard e Dathon em El-Adrel.
Essa é uma maneira diferente de primeiro contato, sem contar arriscada, e por isso temos um dos melhores episódios da franquia, com um roteiro tenso e bem executado, sem contar a perfeita atuação de Patrick Stewart em pequenos momentos maravilhosos, consolando seu novo amigo e contando algumas de nossas próprias histórias, incluindo o épico de Gilgamesh, que carrega vários paralelos com a relação dos dois capitães.
Darmok é o tipo de episódio que melhor representa Jornada nas Estrelas, uma série sobre respeito e compreensão, onde outra cultura é aceita de braços abertos. Os tamarianos se sacrificaram por algo que consideravam o mais importante: compartilhar suas histórias e contribuir para a construção de uma nova.
Para sua quinta temporada, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente porque todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série. Em Rachel, Jack and Ashley Too temos uma abordagem um pouco diferente do que a série está acostumada.
Ashley O (Miley Cyrus) é uma das maiores estrelas da música pop, influenciando várias jovens no mundo inteiro. Ela acaba de lançar uma linha de bonecas chamada Ashley Too, que são basicamente pequenos robôs com um tipo de inteligência artificial capaz de se comunicar com seu dono. Rachel (Angourie Rice) é uma grande fã de Ashley O, então precisa da boneca para se conectar com o ídolo.
A trama alterna entre dois núcleos, o primeiro envolvendo os bastidores da vida de Ashley O, uma jovem com um sorriso e atitude positiva no palco, mas depressiva e desiludida com o rumo de sua carreira. Assistimos sua relação com os produtores e sua agente — e tia -, Catherine (Susan Pourfar), que não é das melhores. Ashley tem escondido os medicamentos que Catherine usa para controlar o seu temperamento, o que resulta em uma ação inesperada dos produtores, que colocam a cantora em um coma induzido e copiam sua imagem para manter a agenda da artista em ordem através de apresentações virtuais.
Do outro lado, seguimos Rachel e sua irmã, Jack (Madison Davenport), tentando se comunicar depois da perda de sua mãe. Rachel tem apenas Ashley Too como companhia, enquanto Jack tenta ao máximo se isolar de todos. Os dois núcleos convergem quando a consciência de Ashley O vai parar na boneca de Rachel e agora as duas irmãs precisam ajudar a cantora a retornar ao seu corpo.
O roteiro de Brooker é bem mais leve neste episódio, com uma jornada divertida envolvendo duas adolescentes arranjando maneiras absurdas de ajudar uma boneca senciente. E quando eu digo “leve” é porque mesmo que haja uma corrida contra o tempo para salvar a estrela da música em coma, fica difícil sentir qualquer peso na maneira como a história foi executada, tendo uma mistura de comédia e drama que nunca chegou a combinar organicamente.
A direção ficou nas mãos de Anne Sewitsly, que carrega uma filmografia pequena mas quase sempre carregando um elenco predominantemente feminino, então faz sentido ela estar responsável pelo episódio. Sua habilidade guiando as atrizes é o ponto alto aqui, com algumas sequências engraçadas com as personagens, bem interpretadas por Rice e Davenport.
Quando se fala de Miley Cyrus alguns torcem o nariz, o que considero um exagero porque ela se esforça para trazer uma personagem atraente, seja nos palcos ou fora dele. É claro que não é nada impressionante, mas é o suficiente para que sua imagem fora da série não influencie o espectador — se bem que ela interpreta uma cantora pop, então não há muito problema nisso. O que realmente me impressionou foi ver Cyrus cantando versões mais chiclete das músicas Head Like a Hole e Right Where It Belongs, da banda Nine Inch Nails, que tem um som que vai na direção oposta a tudo que a cantora já fez na carreira (terminar o episódio com Ashley e Jack no palco foi um pouco cafona, mas o episódio já tinha descambado para uma comédia adolescente mesmo, então é melhor abraçar logo o ridículo).
Rachel, Jack and Ashley Too tem uma abordagem bem diferente em tom do que a série está acostumada — até mesmo o humor foi sempre utilizado de maneira ácida e trágica em outras temporadas — e isso acaba afetando negativamente o formato da série. Não é um episódio que deve ser descartado, é claro, mas ainda assim perde seu sentido no meio dos outros.
Ficha Técnica: Black Mirror, S05E03 Criada por Charlie Brooker Direção de Anne Sewitsly Roteiro de Charlie Brooker
Para seu quinto ano, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente porque todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série. Smithereens é o segundo episódio desta nova temporada, um que se passa em grande parte no interior de um carro mas ao mesmo tempo atravessa o mundo para revelar uma narrativa sobre grandes corporações e a manipulação através das redes sociais.
Todos os dias Chris (Andrew Scott) para seu carro na frente de uma grande empresa de comunicação, a Smithereens. Usando um aplicativo de transporte, finalmente consegue ter alguém da empresa em seu carro, mas descobre que é apenas um estagiário. Ainda assim, Chris o amarra no banco de trás e aponta uma arma para sua cabeça. Enquanto a polícia tenta resolver o problema, o motorista tem apenas uma demanda: conseguir entrar em contato com Billy Bauer (Topher Grace), o grande visionário responsável por uma das maiores redes sociais do mundo.
O episódio é dirigido por James Hawes, o mesmo de Hated in The Nation, outro onde a rede social é essencial para a trama. O que ele tenta aqui é construir uma atmosfera de tensão do início ao fim, o que ele consegue através de um bom ritmo, alternando entre as sequências no interior do carro com todo o alvoroço causado pelo protagonista. E se não fosse por conta de Andrew Scott, esse episódio poderia ser um desastre. Scott tem a responsabilidade de carregar a trama e tentar entregar cada linha de diálogo com convicção, o que foi uma tarefa árdua por conta de algumas partes do roteiro onde fica visível a necessidade de confrontar as questões morais do episódio.
Scott usa tudo que aprendeu em Sherlock, interpretando o excelente Moriarty, para apresentar um personagem que pode explodir a qualquer momento. Seu comportamento beira o exagero, mas o ator é bom o suficiente para evitar que o episódio caia em um território mais cômico. Isso também acontece com Topher Grace, que experimenta uma versão mais caricata de um presidente de alguma grande companhia de tecnologia, lembrando um pouco um dos criadores do Twitter, Jack Dorsey, com seu discurso calmo e comportamento descontraído. Todo o desenrolar da trama que resulta na revelação do retiro de silêncio é uma grande piada com Dorsey.
Além de Scott e Grace, temos Damson Idris como Jaden, o pobre estagiário refém. Idris também esteve este ano no episódio Replay, do revival de Além da Imaginação. Aos poucos ele constrói um currículo com atuações sólidas e estou interessado no que ele pode fazer no futuro.
O terceiro ato caminha para o clássico “não use o celular no volante”, o que acabou sendo uma revelação menos impactante do que o esperado, considerando a habilidade da série em entregar reviravoltas que fazem o público debater até hoje, e como a presença de Billy Bauer parecia tremendamente importante para a confissão catártica de Chris. Por conta de uma execução afetada por um roteiro mais contido, Smithereens pode perder um pouco do seu charme ao ser assistido uma segunda vez, mas você acaba ficando mesmo por conta das performances e toda a construção da tensão até aquele ponto.
Não sei quanto às intenções do episódio em referenciar os trabalhos de David Fincher, mas ficou difícil não imaginar todo o clímax do filme Seven quando a câmera escolhe um plano aberto e revela o local onde o carro de Chris foi parar, no meio do mato perto de vários postes de energia e a polícia cercando o incidente. Também há uma estrutura narrativa que lembra Zodíaco, mas isso está ligado exclusivamente ao jeito que o roteiro mostra os vários obstáculos para fazer com que uma simples mensagem seja recebida. Aqui temos uma trama envolvendo o criador de uma rede social que conecta milhões, mas é uma das pessoas mais difíceis de se encontrar no mundo.
Smithereens pode não se aproveitar muito bem do formato da série, deixando de lado toda a premissa que envolve a ameaça da tecnologia, mas ainda assim tem seus méritos, como as ótimas atuações e a experiência de angústia durante todo o processo.
Ficha Técnica: Black Mirror, S05E02 Criada por Charlie Brooker Direção de James Hawes Roteiro de Charlie Brooker
Para sua quinta temporada, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente considerando que todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série.
Danny e Karl não se vêem há anos, mas isso muda depois de um reencontro no aniversário de Danny, que não parece completamente satisfeito com sua vida, já casado e entediado com as pessoas em volta. Karl tem o presente perfeito, uma nova edição de Striking Vipers, o jogo favorito deles na juventude, agora com uma tecnologia inovadora de realidade virtual. O que começa como uma forma de diversão logo se transforma em um drama sobre descobertas e a complexidade de nossas relações, seja com os outros ou nós mesmos.
Anthony Mackie e Yahya Abdul-Mateen II interpretam Danny e Karl, respectivamente. Foi bom termos dois atores competentes como eles para o episódio, que se dedicou em desenvolver o drama de cada personagem com cautela por conta dos temas que aborda. É um pouco difícil falar sobre essa temporada sem revelar informações importantes da trama, então indico que assista os episódios antes de ler.
Striking Vipers é dirigido por Owen Harris, o mesmo responsável por San Junipero, da terceira temporada, que também contava com um debate parecido e foi executado muito bem. Harris repete um pouco da sua estrutura narrativa (o que deve ser considerado mais um aspecto do roteiro de Brooker, mas ainda assim funciona), o que felizmente foi uma decisão inteligente. O episódio passa seu primeiro ato desenvolvendo os laços entre os personagens, explorando e construindo as dinâmicas antes da parte “tecnológica” fazer parte da história. Isso é necessário, estamos falando de uma narrativa onde um olhar cínico poderia estragar completamente a experiência.
Além da dupla principal, Nicole Beharie é Theo, a esposa de Danny. Mesmo sendo coadjuvante, tem sua própria relevância narrativa, lidando com as mudanças que podem afetar seu casamento. E como passamos algumas sequências dentro do mundo virtual do jogo, temos Pom Klementieff (Mantis, de Guardiões da Galáxia) como o avatar de Karl, Roxette; Ludi Lin faz Lance, o avatar de Danny. O jogo parece uma mistura de Street Fighters com Tekken, e os dois lutadores virtuais tem várias semelhanças com alguns personagens famosos como Chun Li ou Ken e Ryu, até mesmo em alguns golpes característicos, como os chutes consecutivos de um ou o “gancho voador” de outro.
Ainda que seja um episódio com ótimas referências visuais (placas neon com Game Over ou as composições que lembram os lugares remotos onde os lutadores se encontram nestes jogos), Striking Vipers se destaca pelos personagens e um ângulo pouco explorado em narrativas envolvendo relacionamentos como o de Danny, Karl e Theo.
Filmes como Moonlight ou Carol carregam uma identidade própria, uma direção mais delicada, onde a conversa sobre a descoberta sexual dos personagens revela muito sobre quem são. Black Mirror tem feito isso com cuidado, San Junipero foi uma das adições mais envolventes do catálogo da série, e agora Striking Vipers chega com sua abordagem mais parecida com o que foi feito em Moonlight, envolvendo homens negros e a representatividade da comunidade LGBTQ+. Pode não ser tão sutil na forma como a trama se desenrola, mas ainda assim abre uma conversa sobre um tema cada vez mais relevante.
Ficha Técnica: Black Mirror, S05 Criada por Charlie Brooker Direção de Owen Harris Roteiro de Charlie Brooker
Produzida pela Conaco (do apresentador e comediante, Conan O´Brian), Final Space foi distribuída pelo canal TBS e, como no caso do Brasil, no serviço de streaming da Netflix. Criada por Olan Rogers e David Sacks, a série animada é uma boa pedida para quem está sofrendo com o intervalo entre temporadas de Rick and Morty. Ambas tratam o gênero da ficção científica com bom humor e irreverência, sem medo de mostrar um pouco de sangue no caminho — e aqui deve ficar bem claro que as duas séries mencionadas não são indicadas para crianças, mesmo apresentando um humor mais imaturo.
Em Final Space, seguimos o capitão Gary Goodspeed (dublado pelo próprio Olan Rogers), que na verdade não é capitão algum e só está tentando converter sua situação de prisioneiro espacial em uma nave do governo. Todos os seus dias são iguais, tentando roubar cookies da máquina sem permissão, aturando o robô inconveniente, KVN (Fred Armisen), e tendo como companheiro apenas o computador HUE (Tom Kenny) e -talvez- Quinn (Tika Sumpter), a cadete da Guarda Infinita que o colocou ali. Gary está quase livre, sua sentença está próxima do fim, mas ele encontra Mooncake, uma criatura fofa e divertida capaz de destruir um planeta inteiro.
Como já mencionei, a série tem algumas similaridades com Rick and Morty, mas é menos “ complexa” na abordagem de alguns temas sérios e tem um drama mais sólido, como a relação entre Gary e seu pai, um famoso astronauta que morreu em missão. Aí entra outra comparação, com Guardiões da Galáxia, não só nessa relação familiar que move a trama, mas no protagonista, que tem uma personalidade que parece ter sido retirada diretamente de Peter Quill, só que menos interessante, o que é o ponto fraco da série. Gary tem seus momentos e muitas das piadas da série funcionam, mas seu comportamento exagerado e impaciente nem sempre caem bem e soam como um alívio cômico sem efeito. Ainda assim, ele não chega a ser um incômodo do tamanho de KVN, o robô dublado por Fred Armisen (ator que eu adoro), que está cantarolando e irritando a tripulação constantemente. Não importa se é intencional, isso irrita até quem assiste, porque independente da situação, ele está falando ou cantando algo que já deixou de fazer graça episódios antes.
Falando assim, parece que estou desmerecendo os personagens, mas tirando esses dois do caminho, todo o elenco é mais que competente, e olha que a série tem algumas vozes bem populares, como David Tennant, dublando o vilão Lord Commander, e Keith David fazendo uma ponta como a entidade Bolo. Ron Perlman (o único Hellboy possível) é o pai de Gary, e Steven Yeunfaz Little Cato, o filho de Avocato (Coty Galloway), um dos novos companheiros de Gary.
A animação é boa, principalmente nas cenas de ação, com perseguições e explosões que tem um apelo visual maior, como em uma cena envolvendo um campo gravitacional e um planeta em ruínas. O pequeno Mooncake serve quase como um MacGuffin — aquele objeto que serve para impulsionar a trama — , com seus poderes que ainda não podemos medir, mas já houveram demonstrações de grande energia.
Muito da comédia é feita em cima do protagonista, ele é o alvo das piadas e é até melhor serem feitas “com ele” do que “por ele”, como a corrida para pegar uma boa nave, que não dá muito certo, ou o seu primeiro acidente quase mortal. Outro personagem bem engraçado, que infelizmente tem pouco tempo em tela, é Tribore (Olan Rogers, mais uma vez), o alienígena da Guarda Infinita que se comunica usando uma retórica peculiar, perguntando e respondendo as coisas ao mesmo tempo.
Final Space mescla boas piadas com conceitos divertidos da ficção científica que podem render muitas temporadas, e ainda sobra espaço para um pouco de drama mais pra frente. É um bom começo para a série e uma boa indicação para quem procura algo descompromissado, mas criativo.
A primeira temporada de The Expanse foi uma dose de originalidade e qualidade que eu precisava. Não é sempre que temos uma história e personagens tão envolventes como o dessa série. Felizmente, ela continua maior e mais forte no seu segundo ano.
Desta vez temos uma presença maior de Marte nos conflitos políticos, com a chegada da sargento Bobbie Draper (Frankie Adams), que perdeu todos os membros do seu esquadrão e é a única sobrevivente de um ataque misterioso. Há uma grande conspiração fabricada pela força militar marciana, que deseja usar a morte de seus soldados como manobra política. Enquanto a tensão aumenta entre marcianos, terráqueos e belters, seguimos com a Rocinante e seus tripulantes tentando resolver sua própria conspiração envolvendo a proto-molécula na estação Eros.
A construção de mundo continua impressionante, com cada vez mais lugares e conceitos sendo introduzidos de maneira relevante para o desenvolvimento dos personagens e da trama geral. É um roteiro bem trabalhado, consciente de todos os pontos que precisa tocar e como, alternando entre momentos leves de descontração dos personagens e a apreensão por cada peça movida no tabuleiro político. O ritmo acelera e a guerra parece cada vez mais iminente entre os polos, mas isso nunca tira a importância dada aos núcleos dramático.
A primeira metade desta temporada destaca a jornada da Rocinante depois de encontrar Miller e descobrir o destino de Julie Mao. A equipe investiga a proto-molécula e se encontra no meio de outro grande impasse político. A conclusão deste arco narrativo acaba promovendo o que veio a se tornar a principal ameaça da série, sem contar que seus feitos ressoam mais uma vez ao longo das tramas paralelas e abrem as portas para a segunda metade da temporada, que deixa Bobbie em uma posição importante, tendo de lidar com o sistema e tudo no que acreditou toda sua vida. Entre estas duas tramas principais, temos mais intrigas e manipulação, felizmente acompanhadas de ótimos diálogos e atuações.
Desta vez, podemos ver mais do cotidiano dos tripulantes da Rocinante e como eles lidam com tudo que está acontecendo. A relação entre Holden (Steven Strair) e Naomi (Dominique Tipper) evolui com cautela, tem peso e traz uma nova dinâmica entre os membros da nave. Strait revela firmeza enquanto seu personagem exibe destreza na liderança e situações diplomáticas; Tipper não deixa Naomi perder sua força mesmo guardando segredos da equipe e lidando com seus próprios dilemas envolvendo os protestos dos belters. Amos (Wes Chatham) e Alex (Cas Anvar) tem seu próprio embate, que pode ficar um pouco repetitivo, mas serve para mostrar um lado de cada um dos dois que ainda não vimos. Já que estamos no elenco, vale mencionar mais uma vez Frankie Adams pelo seu papel como Bobbie, e Thomas Jane como Joe Miller. Os dois sabem roubar uma cena, mas se tem alguém que sabe fazer isso melhor é Shohreh Aghdashloo, com sua Chrisjen Avasarala, mais boca suja e impaciente que o normal. Há até uma participação especial de Adam Savage, um dos responsáveis pelo programa Mythbusters, que virou fã da série e aqui interpreta um especialista na missão da nave exploratória Arboghast.
Assim como na temporada anterior, souberam utilizar cada centavo do orçamento com efeitos especiais incríveis. As batalhas espaciais são lindas de ver, assim como toda a sequencia envolvendo Eros, onde os efeitos ajudaram na ambientação fluorescente do asteroide, coberto em proto-molécula. As vítimas do Projeto Caliban são a grande revelação da temporada (já mencionei os spoilers), com um design assustador que poderia quebrar o realismo que a série traz, mas acaba se incorporando organicamente ao tom dos episódios.
The Expanse mais uma vez impressiona com uma história instigante, que se desenvolve em um ótimo ritmo. A tensão aumenta e a guerra está chegando!
Ficha Técnica: The Expanse, S02 Criada por Mark Fergus e Hawk Ostby Direção de Breck Eisner, Jeff Woolnough, Terry McDonough… Roteiro de Hallie Lambert, Georgia Lee, Naren Shankar… Atuações de Thomas Jane, Shohreh Aghdashloo, Steven Strait, Dominique Tipper, Jared Harris, Frankie Adams
No começo de Abril tivemos os indicados deste ano ao Hugo Awards, uma das principais premiações de ficção científica e fantasia. Os finalistas foram indicados pelos membros da World Science Fiction Society, responsável pela Worldcon, uma das convenções anuais mais aguardadas pelos fãs do gênero. E dando uma olhada nas categorias, podemos ver um aumento no número de mulheres e minorias, principalmente por conta de um mercado com mais opções e um espaço relativamente maior para artistas negligenciados há muito tempo. Vou listar aqui de acordo com o site Tor.com. e comentar naqueles que eu já li/assisti.
Melhor Romance
The Calculating Stars, by Mary Robinette Kowal (Tor)
Record of a Spaceborn Few, by Becky Chambers (Hodder & Stoughton / Harper Voyager)
Revenant Gun, by Yoon Ha Lee (Solaris)
Space Opera, by Catherynne M. Valente (Saga)
Spinning Silver, by Naomi Novik (Del Rey / Macmillan)
Trail of Lightning, by Rebecca Roanhorse (Saga)
Comentários: Eu estou bem atrasado nas minhas leituras esse ano, mas ouvi apenas coisas boas de Trail of Lightning e The Calculating Stars, provavelmente os que tem a maior chance de ganhar por conta de todos os prêmios no qual foram indicados recentemente.
Melhor Novela
Artificial Condition, by Martha Wells (Tor.com Publishing)
Beneath the Sugar Sky, by Seanan McGuire (Tor.com Publishing)
Binti: The Night Masquerade, by Nnedi Okorafor (Tor.com Publishing)
The Black God’s Drums, by P. Djèlí Clark (Tor.com Publishing)
Gods, Monsters, and the Lucky Peach, by Kelly Robson (Tor.com Publishing)
The Tea Master and the Detective, by Aliette de Bodard (Subterranean Press / JABberwocky Literary Agency)
Comentários: Finalmente peguei a série Binti no meu Kindle e posso me atualizar, então você provavelmente vai ler sobre ela por aqui no futuro. Gods, Monsters, and the Lucky Peach está sendo bastante aclamado e tem enorme chance de levar.
Melhor Noveleta
“If at First You Don’t Succeed, Try, Try Again,” by Zen Cho (B&N Sci-Fi and Fantasy Blog, 29 November 2018)
“The Last Banquet of Temporal Confections,” by Tina Connolly (Tor.com, 11 July 2018)
“Nine Last Days on Planet Earth,” by Daryl Gregory (Tor.com, 19 September 2018)
“The Only Harmless Great Thing”, by Brooke Bolander (Tor.com Publishing)
“The Thing About Ghost Stories,” by Naomi Kritzer (Uncanny Magazine 25, November- December 2018)
“When We Were Starless,” by Simone Heller (Clarkesworld 145, October 2018)
Comentários: The Last Banquet of Temporal Confections é uma noveleta bem intrigante, com uma narrativa envolvente. Esse foi o único da lista que li, mas os próximos já estão aqui separados para poder avaliar antes da premiação. O mais legal dessa categoria é que alguns indicados são bem fáceis de achar para ler gratuitamente.
Melhor Conto
“The Court Magician,” by Sarah Pinsker (Lightspeed, January 2018)
“The Rose MacGregor Drinking and Admiration Society,” by T. Kingfisher (Uncanny Magazine 25, November-December 2018)
“The Secret Lives of the Nine Negro Teeth of George Washington,” by P. Djèlí Clark (Fireside Magazine, February 2018)
“STET,” by Sarah Gailey (Fireside Magazine, October 2018)
“The Tale of the Three Beautiful Raptor Sisters, and the Prince Who Was Made of Meat,” by Brooke Bolander (Uncanny Magazine 23, July-August 2018)
“A Witch’s Guide to Escape: A Practical Compendium of Portal Fantasies,” by Alix E. Harrow (Apex Magazine, February 2018)
Melhor Série
The Centenal Cycle, by Malka Older (Tor.com Publishing)
The Laundry Files, by Charles Stross (most recently Tor.com Publishing/Orbit)
Machineries of Empire, by Yoon Ha Lee (Solaris)
The October DayeSeries, by Seanan McGuire (most recently DAW)
The Universe of Xuya, by Aliette de Bodard (most recently Subterranean Press)
Wayfarers, by Becky Chambers (Hodder & Stoughton / Harper Voyager)
Melhor Artigo / Ensaio
Archive of Our Own, a project of the Organization for Transformative Works
Astounding: John W. Campbell, Isaac Asimov, Robert A. Heinlein, L. Ron Hubbard, and the Golden Age of Science Fiction, by Alec Nevala-Lee (Dey Street Books)
The Hobbit Duology(documentary in three parts), written and edited by Lindsay Ellis and Angelina Meehan (YouTube)
An Informal History of the Hugos: A Personal Look Back at the Hugo Awards, 1953- 2000, by Jo Walton (Tor)
www.mexicanxinitiative.com:The Mexicanx Initiative Experience at Worldcon 76(Julia Rios, Libia Brenda, Pablo Defendini, John Picacio)
Ursula K. Le Guin: Conversations on Writing, by Ursula K. Le Guin with David Naimon (Tin House Books)
Comentários: Esse é complicado. Por mais que eu tenha adorado o vídeo-ensaio de Lindsay Ellis sobre a produção da trilogia Hobbit, existe aí a presença de um artigo sobre o próprio Hugo, o que rende aquela chance por ter ligação com o evento; e de outro lado, também temos um documento de Ursula K. Le Guin, que faleceu no último ano. Então, não dá pra saber quem vence.
Melhor Narrativa Gráfica
Abbott, written by Saladin Ahmed, art by Sami Kivelä, colours by Jason Wordie, letters by Jim Campbell (BOOM! Studios)
Black Panther: Long Live the King, written by Nnedi Okorafor and Aaron Covington, art by André Lima Araújo, Mario Del Pennino and Tana Ford (Marvel)
Monstress, Volume 3: Haven, written by Marjorie Liu, art by Sana Takeda (Image Comics)
On a Sunbeam, by Tillie Walden (First Second)
Paper Girls, Volume 4, written by Brian K. Vaughan, art by Cliff Chiang, colours by Matt Wilson, letters by Jared K. Fletcher (Image Comics)
Saga, Volume 9, written by Brian K. Vaughan, art by Fiona Staples (Image Comics)
Comentários: Eu AMO Saga, mas admito estar um pouco atrasado na leitura. Paper Girls e Monstress são duas ótimas obras criativas que merecem seu espaço aqui, mas se tivesse que escolher entre um dos dois, seria facilmente a belíssima Monstress. Por mais que Black Panther: Long Live the Kingseja escrito por Nnedi Okorafor, o que é um destaque, não acho que tenha impressionado tanto quando os outros mencionados.
Melhor Dramatização, Longa (Melhor Filme)
Aniquilação, directed and written for the screen by Alex Garland, based on the novel by Jeff VanderMeer (Paramount Pictures / Skydance)
Vingadores: Guerra Infinita, screenplay by Christopher Markus and Stephen McFeely, directed by Anthony Russo and Joe Russo (Marvel Studios)
Pantera Negra, written by Ryan Coogler and Joe Robert Cole, directed by Ryan Coogler (Marvel Studios)
Um Lugar Silencioso, screenplay by Scott Beck, John Krasinski and Bryan Woods, directed by John Krasinski (Platinum Dunes / Sunday Night)
Sorry to Bother You, written and directed by Boots Riley (Annapurna Pictures)
Homem-Aranha no Aranhaverso, screenplay by Phil Lord and Rodney Rothman, directed by Bob Persichetti, Peter Ramsey and Rodney Rothman (Sony)
Comentários: Algumas ótimas escolhas. Pantera Negra foi um sucesso e merece destaque pelo que conseguiu fazer com uma narrativa menor dentro de um universo compartilhado tão grande; Um Lugar Silencioso com certeza impressionou muita gente por termos John Krasinski se provando um bom diretor e promessa por trás das câmeras; Aniquilação é a adaptação de Alex Garland de um livro bastante adorado, e além disso o filme teve a tarefa de ser o sucessor do pequeno, mas bem construído, Ex-Machina. Todos são bons, mas não se nega o brilhantismo de Sorry to Bother You e Homem-Aranha no Aranhaverso. Os mais impressionantes da lista por conta da enorme criatividade na narrativa visual e uma abordagem completamente diferente do que estamos acostumados. Se qualquer um dos dois levar, posso morrer feliz.
Melhor Dramatização, Curta (Melhor Episódio de Série)
The Expanse: “Abaddon’s Gate,” written by Daniel Abraham, Ty Franck and Naren Shankar, directed by Simon Cellan Jones (Penguin in a Parka / Alcon Entertainment)
Doctor Who: “Demons of the Punjab,” written by Vinay Patel, directed by Jamie Childs (BBC)
Dirty Computer, written by Janelle Monáe, directed by Andrew Donoho and Chuck Lightning (Wondaland Arts Society / Bad Boy Records / Atlantic Records)
The Good Place: “Janet(s),” written by Josh Siegal & Dylan Morgan, directed by Morgan Sackett (NBC)
The Good Place: “Jeremy Bearimy,” written by Megan Amram, directed by Trent O’Donnell (NBC)
Doctor Who: “Rosa,” written by Malorie Blackman and Chris Chibnall, directed by Mark Tonderai (BBC)
Comentários:The Good Place tem o costume de aparecer nas premiações com mais de uma indicação, e dessa vez não foi diferente. O problema é que esta provavelmente foi a temporada mais morna para o público, diminuindo as chances de levarem esse ano. Dirty Computer é o único da lista que não é um episódio de série, mas entra no formato de dramatização, por ser um grande álbum conceito da cantora Janelle Manáe, ambientado em uma sociedade futurista. Ele está disponível do Prime Video e pode ser assistido, por enquanto. Eu assisti e achei interessante, mas nada que seja melhor que os outros indicados. The Expanse é uma maravilha de série e eu vivo falando bem dela para todos, então nem preciso dizer qual o meu favorito da lista, mas não podemos negar que a última temporada de Doctor Who teve alguns episódios marcantes para o público, e eles estão indicados aqui, com uma enorme chance de levar, principalmente levando em conta todas as polêmicas envolvendo boicote por termos uma protagonista feminina pela primeira vez na série. Quando esse povo vai aprender?
Melhor Fanzine
Galactic Journey, founder Gideon Marcus, editor Janice Marcus
Journey Planet, edited by Team Journey Planet
Lady Business, editors Ira, Jodie, KJ, Renay & Susan
nerds of a feather, flock together, editors Joe Sherry, Vance Kotrla and The G
Quick Sip Reviews, editor Charles Payseur
Rocket Stack Rank, editors Greg Hullender and Eric Wong
Melhor Livro de Arte (Conceito Visual, Design…)
The Books of Earthsea: The Complete Illustrated Edition, illustrated by Charles Vess, written by Ursula K. Le Guin (Saga Press /Gollancz)
Daydreamer’s Journey: The Art of Julie Dillon, by Julie Dillon (self-published)
Dungeons & Dragons Art & Arcana: A Visual History, by Michael Witwer, Kyle Newman, Jon Peterson, Sam Witwer (Ten Speed Press)
Spectrum 25: The Best in Contemporary Fantastic Art, ed. John Fleskes (Flesk Publications)
Spider-Man: Into the Spider-Verse — The Art of the Movie, by Ramin Zahed (Titan Books)
Tolkien: Maker of Middle-earth, ed. Catherine McIlwaine (Bodleian Library)
Comentários: Eu já dei uma olhada em alguns desses, mas apenas online. Por mais que The Books of Earthsea, sobre Terramar, seja bem bonito, e Tolkien: Maker of Middle Earth fale com meu lado fã do autor, não tem como eu querer um desse em mãos mais do que o de Aranhaverso. Até hoje fico louco com os visuais e impressionando com cada detalhe, então o livro com toda a parte de conceito visual do filme é minha escolha óbvia.
Prêmio John W. Campbell Award para Melhor Escritor
Katherine Arden (segundo ano elegível)
S.A. Chakraborty (segundo ano elegível)
R.F. Kuang (primeiro ano elegível)
Jeannette Ng (segundo ano elegível)
Vina Jie-Min Prasad (segundo ano elegível)
Rivers Solomon (segundo ano elegível)
Lodestar Award para Melhor Livro YA (Young-Adult)
The Belles, by Dhonielle Clayton (Freeform / Gollancz)
Children of Blood and Bone, by Tomi Adeyemi (Henry Holt / Macmillan Children’s Books)
The Cruel Prince, by Holly Black (Little, Brown / Hot Key Books)
Dread Nation, by Justina Ireland (Balzer + Bray)
The Invasion, by Peadar O’Guilin (David Fickling Books / Scholastic)
Tess of the Road, by Rachel Hartman (Random House / Penguin Teen)
Comentários: Children of Blood and Bone foi lançado no Brasil como “Filhos de Sangue e Osso”, e é um dos livros mais populares da lista. Eu não cheguei a ler qualquer um dos indicados nesta categoria, mas alguns parecem bem interessantes, como The Invasion e Tess of the Road.
Este ano o Hugo Awards tem uma lista de indicados bastante diverso. É interessante ver a quantidade de mulheres nas principais categorias, o que mostra como a premiação segue um caminho mais aberto para representações e pontos de vista diferentes.
Assim que os vencedores sairem, voltamos com a lista. Enquanto isso, hora de atualizar as leituras.
Mesmo adorando o trabalho de Brit Marling no cinema, demorei para entrar na lista de fãs de The OA. Foi mais uma questão de sempre esquecer que a série estava ali, e agora fico pensando nela o tempo todo. Mas finalmente assisti e fiz um texto sobre a primeira temporada. Felizmente, por ter demorado tanto para fazer isso, não sofri esperando mais de dois anos pelo retorno da série (não sei como os fãs aguentaram tanto tempo), e ainda por cima, apenas algumas semanas depois, é anunciada a data definitiva para a continuação. E aqui estou, sentindo o impacto dos oito episódios lançados na última sexta-feira (22 de março), tentando botar os pensamentos em ordem para escrever algumas linhas, derrubando algumas lágrimas ao lembrar que passei a fazer parte daqueles que vão esperar anos pela terceira temporada.
Passei o primeiro parágrafo falando de “temporadas”, mas a série é tecnicamente dividida em “partes”, então é assim que chamarei daqui pra frente.
The OA retorna depois de deixar algumas coisas importantes em aberto na sua Parte 1. Com um desfecho inesperado e uma cena nos créditos finais que piora a situação de qualquer um com ansiedade, a série tem muito o que cobrir. Agora estamos em outra dimensão, Prairie conseguiu “saltar”, mas ainda precisa lidar com vários obstáculos. Hap arranjou uma maneira de atravessar para o mesmo lugar e aproveita sua posição privilegiada como doutor para tomar conta da OA, obviamente considerada louca por conta de sua história. Ele também consegue capturar todas as suas cobaias, mas percebe que Homer é um caso diferente (mais dele para frente). Paralelamente, a série introduz um segundo protagonista e uma trama que toma conta de quase metade dessa segunda parte: o detetive Karim Washington, empenhado em investigar o desaparecimento de uma jovem. Na dimensão original (chamarei assim para poder diferenciar), os jovens e BBA correm conta o tempo para descobrir novas pistas indicando que a OA pode estar viva.
The OA se posiciona como uma das produções mais originais atualmente, e eu ouso arriscar que é o mais próximo que teremos de algo no nível de Twin Peaks (que saudades de você!). A segunda parte mescla alguns gêneros sem perder seu ritmo. A ficção científica ainda é uma base para a série, mas o misticismo, já presente antes, agora tem um papel ainda maior na jornada. A produção chega a explorar um pouco de suspense também, incluindo uma subtrama que beira os filmes clássicos de casa mal assombrada, com novos conceitos que expandem ainda mais a ideia do jardim bifurcado (primordial para a compreensão de grande parte da série). Como se não fosse suficiente, a missão do detetive Karim tem a atmosfera perfeita para um thriller policial.
Transitar entre gêneros é algo que a série faz bem, mas isso não chega perto de descrever toda a loucura que a segunda parte traz para o público. Zal Batmanglij e Brit Marling justificaram a demora para a continuação da história. The OA ficou maior e mais ambiciosa, abrindo as portas para a dupla arriscar mais com o universo que criou, incluindo um episódio inteiro que parece ter saído da cabeça de David Lynch, utilizando tudo que conhecemos sobre séries para destruir a expectativa de quem espera uma narrativa mastigada. Isso não é apenas enredo, estou falando também das decisões visuais usadas para representar o que nossa mente não está treinada para assimilar com facilidade. Para ajudar nisso, Batmanglij emprestou a cadeira de diretor por três episódios para Andrew Haigh e Anna Rose Holmer, responsáveis por ótimos filmes como The Fits e Weekend, respectivamente.
Trazer o abstrato para uma mídia visual é arriscado, e The OA é um dos poucos casos onde há consistência no absurdo e beleza no grotesco, e até mesmo no ridículo. Há sequencias envolvendo um conjunto de robôs que pode soar bobo e fora de lugar, e talvez essa seja uma das poucas partes onde a série poderia se beneficiar abraçando um pouco a ideia de se levar menos à sério, pelo menos em alguns aspectos (algo que Twin Peaks faz com maestria). Mas não é toda vez que isso acontece, principalmente porque você não espera se sentir tão intrigado assistindo um dos momentos mais impensáveis de toda a série (você vai saber exatamente do que estou falando quando chegar nela, mas se tiver dúvida, ela envolve tentáculos), que provavelmente vai afastar uma parte do público, mas conquistar completamente outra, principalmente depois da atuação de Marling, sempre se entregando para as cenas.
Três tramas paralelas podem ser um sinal preocupante para quem assiste, ainda por cima quando elas tem propostas distintas. Seria um desperdício de tempo se toda a apresentação de novos personagens e mundos atrapalhasse o ritmo dos episódios. Felizmente, essa Parte 2 é maior e melhor em muitos aspectos. Karim é a aposta mais perigosa, sendo um novo membro com uma trama própria, mas Kingsley Ben-Adir é mais do que a figura de autoridade que assume uma responsabilidade. O ator revela-se um dos componentes mais atraentes da história, indo de investigador confiante e carismático para um homem com dificuldades na hora de se relacionar com as pessoas mais próximas. É bom ver que, mesmo com todo o destaque para o fantástico, o drama ainda é o que move a série.
O núcleo dos jovens e BBA também está melhor. Depois de passar a maior parte da primeira parte (queria chamar de temporada, mas…) como testemunhas da jornada de Prairie, tomando atitudes apenas nos episódios finais, podemos nos dedicar aos traumas e dilemas de cada um. Com a revelação de que Prairie pode estar viva, o grupo faz uma viagem pela estrada, passando por obstáculos que testam sua amizade. Cada um dos personagens tem seus próprios demônios para lidar, mas devem correr contra o tempo na busca de respostas. Assim como eles, Prairie e seus companheiros estão em uma prisão pior que a anterior, uma que não precisa ser escondida. Para piorar a situação, Homer não parece ter tido sucesso durante o salto, resultando em mais um trabalho para a Oa, que agora precisa trazê-lo de volta. Os dois tem uma bagagem emocional forte, e é outro crédito para a série ter dois atores tão bons dividindo isso. Emory Cohen (que interpreta Homer) e Marling tem a dura tarefa de interpretar mais de um personagem, mesmo que dividam o mesmo corpo. Só posso deixar aqui meus elogios para a forma como os dois conseguiram usar tudo que tinham para criar personalidades opostas ao que estavam acostumados, principalmente Marling, que muda sua linguagem corporal de maneira impressionante para tomar o lugar de Nina Azarova, sua versão que sobreviveu ao acidente de ônibus.
Cada linha narrativa é muito bem executada, sem perder o ritmo, aumentando a atenção do público para um desfecho mais impressionante que o anterior. As tramas convergem e culminam em uma grande jornada sobre união e fé, resultando em uma conclusão que se joga de cabeça em algo que promete ser um exercício de metalinguagem como poucos (mas isso só o tempo dirá).
A ambição da série não está apenas na narrativa e no visual, ou no acréscimo de dois diretores talentosos, mas no próprio elenco. Além do retorno de Riz Ahmed, que na época não era tão cotado quanto hoje, temos a presença da atriz Zendaya, em uma atuação contida e mais pontual que não distrai em momento algum. O que surpreendentemente acaba atrapalhando um pouco é a presença de Ahmed. Sua participação é apressada e surge de maneira conveniente, entregando informações que talvez fossem melhor mantidas em segredo para manter a ambiguidade de um dos mistérios da primeira parte. E por falar nisso, é sentida a falta de alguns elementos recorrentes da primeira parte, como as conversas com Khatun, que eram partes importantes para a Oa.
O que transformou The OA em um evento para mim é a forma como abraça cada pedaço da trama, até aqueles que podem soar vergonhosos à principio, mas que logo revelam-se um momento executado com tanta honestidade e vontade de inovar que você passa a admirar com mais força. Ainda que tenha suas subtramas e conclua a jornada da temporada, essa é uma produção que não se apoia apenas em análises e teorias mirabolantes, se dedicando em estimular os sentidos com um mundo incrível.
Vamos torcer por mais séries nesse nível. É questão de fé!
Ficha Técnica: The OA, S02 Criada por Zal Batmanglij e Brit Marling Direção de Zal Batmanglij, Andrew Haigh e Anna Rose Holmer Roteiro de Zal Batmanglij, Brit Marling, Dominic Orlando… Atuações de Brit Marling, Emory Cohen, Patrick Gibson, Jason Isaacs, Ian Alexander, Phyllis Smith, Kingsley Ben-Adir
Estamos apenas no terceiro episódio e já posso afirmar que, se Patrulha do Destino fosse cancelada neste exato momento, a série seria considerada uma das melhores coisas já produzidas para a TV envolvendo um material da editora DC. Preacher é claramente um deleite de sangue e humor negro, mas a equipe de desajustados da Patrulha conseguiu em apenas poucas semanas entregar personagens bem desenvolvidos, um tratamento visual de qualidade e um enredo competente e criativo.
Em Puppet Patrol a equipe fuça os arquivos do Chefe e descobre informações que os levam para o Paraguai. Na verdade, eles não são levados, é mais questão de tentarem chegar lá por uma boa parte do episódio. Ciborgue não consegue contribuição financeira de seu pai e como ainda não é um membro da Liga da Justiça, não pode pegar um jato emprestado. A solução é carregar todos em um ônibus surrado (para ser generoso com os adjetivos). Não sendo apenas uma decisão criativa da série para evitar gastos no orçamento, obviamente (e há uma cena onde fica ainda mais claro como um simples corte — bem feito — na edição ajudou bastante nessa economia), essa acabou sendo uma daquelas ideias que abrem espaço para várias situações cômicas, como cada integrante do grupo tentando (e falhando) botar a mão no volante ou Crazy Jane tentando se matar por conta do tédio, literalmente. Há uma pausa em um hotel na beira da estrada que também serve para conhecermos mais da rotina de Rita e exibir o humor inconveniente de Cliff, que joga nomes como Batman e Aquaman no ar com a intenção de irritar Ciborgue.
Com o primeiro episódio dando um foco maior na história de Cliff e a relação com sua filha, e o seguinte explorando as origens de Ciborgue e a superfície do que aconteceu com Jane, é chegada a hora de falarmos um pouco mais sobre Larrye os relacionamentos que mantinha, com sua esposa e o colega de trabalho, que acaba se tornando um amante. É mais uma das jornadas trágicas da série, de um homem tomado pelo arrependimento que decide se distanciar de tudo e todos. Mais um bom trabalho do roteiro em apresentar uma certa despedida através do ponto de vista das figuras que mais decepcionou, de um lado um adeus seco e triste de uma esposa traída; do outro uma partida sutil, mas cheia de sentimento, de um homem que perdeu uma das conexões mais fortes que tinha. Matt Bomer atua nas sequencias de flashback e em um momento importante do clímax do episódio, onde tem um embate com sua entidade mal-vinda. Como foi com Brendan Fraser anteriormente, esse é outro caso de um membro do elenco se dedicando ao papel e abraçando o absurdo da série.
Por falar em absurdo, esse episódio tem de sobra, e olha que nem tivemos a narração do Mr. Nobody (fez falta, mas não afetou negativamente a experiência em momento algum). À caminho de Paraguai, o grupo é separado novamente. Rita e Ciborgue ficam em um hotel (contra suas vontades), onde debatem a importância da ex-atriz para a equipe. Esse é o núcleo mais “normal” do episódio, e serve como um alívio cômico reverso, como se colocasse um pé no chão depois de sair da realidade. Por isso também é uma parte que sofre um pouco por não ser tão intrigante quanto a trama paralela, envolvendo Larry, Cliff e Jane chegando (de forma propositalmente conveniente) no seu destino, o ponto turístico provavelmente menos movimentado do país: Fuchtopia (sim, se escreve com h. Tire a cabeça do esgoto). Fantoches que revelam informações sobre o passado do Chefe e Von Fuchs, camponeses prontos para a batalha e a introdução de outra figura bizarra dos quadrinhos são algumas das coisas que me deixam cada vez mais animado para onde esta série pode ir. E pode ir para qualquer lugar.
Puppet Patrol é mais um ótimo episódio de uma série que vem se provando como uma das mais criativas e irreverentes dos últimos anos, e isso com apenas três episódios, mas também com uma trama que está se desenvolvendo muito bem e um trabalho de direção cada vez mais peculiar, com um filtro quase sépia que dá aquela sensação de estarmos vendo uma fotografia velha de algo abandonado há um tempo. É assim que os personagens se sentem e não deixamos de torcer por uma possível luz no fim do túnel para cada um deles.
Ficha Técnica: Puppet Patrol, S01E03 Direção de Rachel Talalay Roteiro de Tamara Becher e Tom Farrell Atuações de Diane Guerrero, April Bowlby, Alan Tudyk, Matt Bomer, Brendan Fraser