Frank Herbert provou seu poder narrativo com o épico Duna, um relato fictício sobre o planeta Arrakis e seus habitantes, explorando seu cotidiano, religião e economia. Para a continuação ele aproveita a liberdade de poder construir uma nova obra sem depender do formato mensal (originalmente, Duna foi distribuído em partes na revista Analog), mas ao invés de extrapolar nas páginas, desenvolve o livro mais “curto” da série, Messias de Duna.
A quantidade reduzida de página não diminui a importância do texto, que aborda os temas de forma mais densa, mas não os deixa de lado, isso porque há uma atenção maior ao desenrolar dos eventos que colocaram Paul Atreides no poder e as suas consequências, lembrando a grande crítica de Herbert aos líderes carismáticos e a crença cega de seus seguidores.
Mais de uma década se passou desde que Muad’Dib, Paul Atreides, ascendeu ao poder de Arrakis, sendo assim um nome respeitado e temido pelo império galáctico, comandando a distribuição de melange, a especiaria mais cobiçada do universo. O livro abre a oportunidade para debates políticos sobre o impacto do governo de Paul, e também observa os diversos pontos de vista de outras guildas e sociedades, como a organização Bene Tleilax, proeminente no enredo, introduzindo novas tramas e personagens intrigantes, como o Dançarino Facial Scytale.
“Como todos os sacerdotes, vocês logo aprenderam a chamar a verdade de heresia”.
Além de todos os questionamentos políticos, Herbert examina a família Atreides com um olhar mais íntimo, com um Paul mais preocupado com seu legado e o futuro do planeta; e Alia, sua irmã, agora uma jovem inteligente e bela. Aqui podemos ter uma versão mais frágil dos dois, o que traz mais emoção para a obra, acusada por alguns de ser muito fria no seu primeiro volume quando se trata da interação entre os personagens.
Com a expansão do universo de Duna, começamos a nos familiarizar com o passado, aprendendo mais sobre “A Idade de Ouro da Terra”, e alguns conceitos mais arriscados, como a criação dos gholas, o que resulta no retorno de um personagem importante do livro original. É difícil construir um mundo tão grande como esse e ao mesmo tempo desenvolver o drama dos personagens de maneira espontânea, mas Herbert não é qualquer escritor.
É claro que a quantidade de páginas acaba reduzindo alguns elementos importantes da obra, e isoladamente Messias de Duna não teria esse problema, mas como uma continuação direta de Duna, a falta de mais sequências envolvendo os fremen (habitantes naturais de Arrakis) e os vermes gigantes, ou até a ausência total de Lady Jessica, a mãe de Paul, aqui mencionada apenas através de diálogos, acabam sendo um ponto desconfortável na leitura, que pode ser afetada ao abandonar elementos tão essenciais para o sucesso da saga.
Faz sentido termos uma concentração maior no avanço do império Atreides, mas terminamos com mais perguntas que respostas; e considerando que o livro seguinte, Filhos de Duna, volta a um formato de mais páginas, talvez fosse melhor transformar essas duas obras em uma só (o que aconteceu em alguns casos nos EUA, onde o segundo e terceiro volume foram lançados como um).
Messias de Duna pode ser um livro pequeno, porém ainda carrega um universo gigantesco com questionamentos que poucos autores têm a coragem de trazer, comprometendo seu próprio protagonista, reforçando um líder imperfeito e tomando decisões impossíveis e arriscadas. Isso faz com que o próprio leitor encare com ceticismo a figura que Herbert criou, e assim somos deixados com uma crise de fé e sem saber em quem podemos confiar daqui para frente.
Ficha Técnica: Título Original: Dune Messiah (EUA, 1969) Editora Aleph, 2012 Tradução de Maria do Carmo Zanini 216 Páginas.
Embora autores clássicos como Machado de Assis tenham se aventurado no gênero, a ficção científica começou a dar seus primeiros passos para ser reconhecida como uma possibilidade para narrativas originais no Brasil graças ao trabalho de Jeronymo Monteiro. Envolvido em diversos projetos, o jornalista e escritor ficou conhecido por seu trabalho em séries de rádio, além de ser um nome importantíssimo para os quadrinhos, editando e traduzindo materiais da editora Abril, como a primeira revista do Pato Donald no país.
Mas sua maior contribuição foi para a literatura nacional, área na qual recebeu a alcunha de “pai da ficção científica no Brasil”, sendo responsável por consolidar o gênero no país através da revista Magazine de Ficção Científica, trazendo autores como Isaac Asimov e Ray Bradbury todo mês. Monteiro é tão influente que a data de seu nascimento, dia 11 de dezembro, é considerada o dia da ficção científica brasileira.
Entre suas obras literárias está Três Meses no Século 81, relançada pela editora Plutão em sua coleção Ziguezague, onde explora as diferentes “ondas” da ficção científica no país. Monteiro está claramente na primeira, sendo pioneiro em apresentar uma narrativa sobre viagem no tempo com elementos que seriam marca do gênero até hoje.
No livro, Campos relata sua experiência visitando a civilização do século 81. A sua viagem revela um mundo aparentemente utópico, com arquitetura e tecnologia impressionante, mas talvez as coisas sejam perfeitas demais para o viajante, que ao chegar no futuro se vê no corpo de um ser chamado Loi. A decisão do autor em transformar a viagem temporal em uma experiência esotérica, através do que chama de “transmigração”, ao invés de uma máquina, como estamos acostumados, é um caminho que acaba dando mais originalidade ao material.
“Em todo caso, aquelas construções, se eram impressionantes pela simplicidade e pela largueza, nada tinham de emocionantes”
A obra carrega uma construção de mundo surpreendente, estabelecendo a sociedade do futuro com sua nova geografia, hierarquias e economia (ou falta dela), fazendo questão de explicar o desenvolvimento de uma nova língua híbrida do inglês com outros idiomas (talvez uma pequena cutucada na maneira como a cultura norte americana tem se expandido em nosso cotidiano).
Monteiro também brinca um pouco com a metalinguagem, elemento pouco comum para a época, inserindo o escritor H.G.Wells, responsável pelo clássico A Máquina do Tempo, em sua história, não só como referência, mas como um personagem que existe no universo de Campos, ou de Loi.
Pode ser uma boa maneira de introduzir os principais elementos da trama, mas é engraçado como a narrativa acaba sofrendo um pouco com essa atenção aos detalhes, deixando por vezes visível como Monteiro acaba sendo prolixo ao ponto de introduzir personagens essenciais para a trama tarde demais, como Ilá, que acaba servindo como ativista e interesse romântico para o protagonista, mas por ser apresentada tão tarde, perde seu peso e suas “cenas” são um problema quando consideramos o quão bem estabelecido é o universo do livro.
Esse é um deslize fácil de relevar em uma obra precursora como essa, e importante para a ficção científica no Brasil. Jeronymo Monteiro é um nome necessário para qualquer leitor de ficção especulativa no país, e o relançamento de Três Meses no Século 81 é mais um enorme acerto da editora Plutão.
Me sinto na obrigação de começar este texto dizendo que as comparações constantes de Onisciente, a nova série de ficção científica nacional distribuída pela Netflix, com Black Mirror são, no mínimo, uma tremenda falta de referência, sem contar que afirmações como essa acabam sendo não apenas preguiçosas e repetitivas, como parecem diminuir a importância do material, ainda mais um criativo e bem desenvolvido como a produção brasileira de Pedro Aguilera.
Na trama, Nina Peixoto (Carla Salle) trabalha para uma enorme empresa de vigilância, e as coisas parecem ir bem até o dia em que seu pai é assassinado misteriosamente e o sistema que acreditou ser infalível não é capaz de revelar um culpado. Assim, Nina procura uma maneira de descobrir o responsável enquanto tenta burlar o sistema e as câmeras em sua volta.
Aguilera, responsável por roteiros de outro sucesso FC da Netflix, a distopia 3%, continua explorando o gênero, porém com uma abordagem diferente, trazendo uma premissa que, se formos realmente utilizar comparações (dessa vez, pertinentes), investe em elementos comuns nas obras literárias clássicas de Philip K Dick, Isaac Asimov e Aldous Huxley, principalmente o conto Minority Report e o romance Admirável Mundo Novo.
Felizmente, Onisciente não se limita às referências e cria um universo próprio, com personagens e regras bem estabelecidas. O roteiro arrisca cair em territórios perigosos, com pequenas conveniências envolvendo a proposta principal de abordar uma cidade monitorada constantemente por drones tão pequenos que a maioria dos cidadãos sequer percebe.
Esse é um pequeno risco tomado por um enredo bem executado, atento ao cotidiano de seus personagens, o que fortalece suas motivações, e a construção de um mundo que, ao primeiro olhar parece simples, mas logo revela sua conjuntura política, hierarquias e estruturas sociais, tudo de maneira simples e direta, e é nessa objetividade que a narrativa ganha força, sabendo exatamente o que deve aproveitar e o que deve ser deixado de lado.
Uma preocupação com produções nacionais que tentam explorar narrativas de gênero é a chance de soarem artificiais, com diálogos e ações pouco naturais. Por Onisciente ser uma ficção científica com uma linguagem visual mais norte-americana, há sequências onde algumas interações acabam soando mecânicas, mas isso é relevado quando consideramos que os personagens estão sendo vigiados o tempo inteiro, então devem ter cautela com o que dizem e fazem.
Mesmo com as limitações, o elenco faz um bom trabalho, principalmente Carla Salle, como a protagonista Nina, que vai de uma jovem tímida e generosa para uma pessoa mais calculista e intimidadora. Além dela, temos nomes como Sandra Corveloni e a ótima Luana Tanaka (do elenco da série 3%), essa última roubando algumas cenas com uma subtrama que promete ser mais importante em uma futura temporada.
Onisciente é mais um passo para o avanço de produções de gênero no mercado nacional, um que ainda pode ser bastante influenciado por material norte-americano, mas carrega uma voz cada vez mais forte.
Chegamos ao segundo episódio de Jornada nas Estrelas: Picard, agora revelando mais informações e estabelecendo melhor o rumo que a série deve tomar. Em Maps and Legends, Picard continua sua investigação sobre Dahj, e mesmo não tendo a ajuda de quem mais precisa, decide resolver tudo com as próprias mãos. Enquanto isso, Soji, a “irmã gêmea” de Dahj, começa uma relação com o misterioso Narek.
Hanelle M. Culpepper retorna no comando do segundo episódio, mantendo uma direção contida, mesmo que agora explore um pouco o formato, alternando entre presente e futuro durante um diálogo, por exemplo. Ainda assim, não é nada que chame atenção, sem contar que a direção de arte de Philip Lanyon, por mais polida que seja, não se esforça demais para manter um visual próprio e acaba caindo em território seguro, replicando a mesma textura e até os lens flares dos filmes de J.J. Abrams.
Para o elenco, temos a introdução dos atores David Paymer, como Dr. Benayoun, um antigo amigo de Picard; além dele, Michelle Hurd, que fará a recorrente Raffi Musiker. Podemos ver como vai ser a dinâmica entre os atores Isa Briones e Harry Treadway, Soji e Narek, respectivamente, com grande tensão sexual e espionagem.
Ainda é cedo para dizer como todos os arcos dramáticos podem se complementar, mas parece que há mais conspirações do que imaginamos, o que é interessante, mas será que Alex Kurtzman, o responsável pela franquia atualmente, forçou alguma cláusula em todas as produções de Jornada nas Estrelas exigindo a presença ou algo similar à Seção 31? Isso porque a organização secreta da Frota Estelar está em evidência em Discovery, sem contar que receberá uma série própria estrelando Michelle Yeoh. Para algo secreto, a Seção 31 está recebendo bastante atenção.
Agora vamos para:
MAKE IT SO – Referências, Teorias e Easter Eggs – SPOILERS!
O episódio abre no estaleiro Utopia Planitia, em Marte, no ano 2385. Uma voz anuncia a comemoração do Dia do Primeiro Contato. Isso nos situa na data 5 de Abril, e a data é referente ao dia em que os humanos fizeram contato com os vulcanos, no ano 2063, em Montana. Podemos ver o evento acontecer no filme Jornada nas Estrelas: Primeiro Contato.
É nessa cena que podemos ver melhor os sintéticos em ação. Um deles, F8, é visto sendo corrompido e acabando violentamente com a vida dos trabalhadores do estaleiro. Não está claro ainda o responsável ou a razão para isso, mas talvez a própria Federação esteja envolvida nisso.
Enquanto assiste às gravações da explosão que causou a morte de Dahj, os companheiros romulanos de Picard, Laris e Zhaban, consideram que esse tipo de trabalho secreto pode ser responsabilidade de uma organização ainda mais antiga que a Tal Shiar, chamada Zhat Vash.
Tal Shiar é uma conhecida agência de inteligência romulana, mencionada pela primeira vez em A Nova Geração, recorrente em Deep Space Nine. Embora Zhaban considere Zhat Vash um mito criado pela Tal Shiar, Laris convence Picard de sua existência.
Durante uma conversa, Soji diz para Narek que não estão em um Cubo Borg, mas sim um “Artefato”, isso porque “O cubo Borg é poderoso e onipotente” enquanto o Artefato está “perdido, separado de sua coletividade”. De acordo com essa informação e o fato de Soji sussurrar uma “mensagem de despedida” no ouvido de um dos Borgs descomissionados, parece que a personagem sabe muito mais do que imaginamos, e talvez Narek não seja o único com segredos.
Voltando a Terra, Picard recebe a visita de um velho amigo, o Dr. Benayoun. Eles conversam sobre o pedido de Picard para assumir uma nave e continuar sua investigação. Benayoun menciona a nave USS Stargazer, onde Picard atuou por anos como capitão antes de assumir o comando da Enterprise.
Mas o mais importante da conversa envolve o diagnóstico de Benayoun, onde ele conclui que há “uma pequena anormalidade no lobo parietal”. Em A Nova Geração, no episódio final duplo “All Good Things…”, Picard descobre sofrer de uma desordem neurológica chamada Síndrome Irumódica, que pode estar afetando a sua percepção temporal, já que ele afirma estar vivenciando eventos do futuro afetados diretamente pelas suas ações.
Quando Picard visita a Federação, podemos ouvir a música da série clássica, com um arranjo mais atualizado.
Depois de seu encontro frustrado com a Federação, Picard recebe a Dra. Jurati em sua casa. Enquanto espera, ela folheia um livro de contos do autor Isaac Asimov, intitulado “The Complete Robot”. Ainda que a edição tenha sido feita para a série, o livro é real, um compilado de todos os contos do autor de ficção científica sobre um de seus assuntos favoritos, robótica.
É claro que além de ser uma referência para os fãs do gênero e do autor, essa pode ser uma alusão ao personagem Bruce Madoxx, o ciberneticista fascinado por Data. Madoxx já foi mencionado algumas vezes até agora, então podemos esperar sua presença em algum momento da série.
Quando decide fazer sua viagem com uma nova tripulação, Picard é interrompido por Laris, que menciona William Riker, Geordi La Forge e Worf como possíveis aliados, mas Picard não aceita colocar seus amigos em risco.
Esse foi mais um episódio de Picard, Maps and Legends. O que tem achado da série até agora?
Escrita por James S. A. Corey (pseudônimo da dupla Daniel Abraham e Ty Franch), a série de livros The Expanse fez tanto sucesso que acabou gerando uma adaptação seriada para o canal SyFy de mesmo nome (que depois foi cancelada e salva pelo serviço de streaming, Amazon Prime Video). Lançado originalmente em 2011, o primeiro livro da série se chama Leviatã Desperta, e é uma aula de construção de mundo e personagens.
A humanidade já conquistou o espaço, mas está dividida. Saltamos 200 anos em um futuro onde os conflitos entre habitantes da Terra, Marte e o cinturão de asteróides podem estourar a qualquer momento, e a tensão aumenta quando uma nave transportadora é destruída. Sem alguém para culpar, começa a corrida contra o tempo para descobrir o que está acontecendo, e o destino de todos pode estar na mão de uma pequena tripulação liderada pelo justo capitão James Holden e o abusado detetive Joe Miller.
Leviatã Desperta é um livro grande, uma ópera espacial em um universo rico, e a quantidade de personagens, planetas e conceitos que precisam ser introduzidos justifica o tamanho da obra. Esse é apenas o primeiro livro, mas já faz um ótimo trabalho em executar uma narrativa sobre conspiração política de maneira inteligente; mesmo que ela esteja acontecendo em segundo plano, continua afetando a trama do início ao fim.
Cada capítulo da obra segue a perspectiva de um personagem específico, e aqui temos uma atenção quase exclusiva aos pontos de vista de Holden e Miller, que também dão nome aos capítulos. O que poderia resultar em um desenvolvimento enfadonho acaba servindo não apenas como um bom exercício diferencial de narrativa, mas uma solução mais dinâmica de alavancar a trama, revelando informações aos poucos, aumentando a expectativa, alternando entre protagonista antes que corra o risco de entediar o leitor – o que nunca acontece.
“Diga o que quiser sobre o crime organizado, pelo menos ele é organizado”
Não é apenas o formato que chama a atenção. Parte do dinamismo da escrita de Corey está nos diálogos, divertidos e ácidos, que deixam os personagens ainda mais reais e envolventes. Há também a dedicação dos autores em apresentar um mundo verossímil, com regras bem estabelecidas, não importa se é para algo maior como uma estação espacial ou trivial como um coquetel de drogas usado pela tripulação para não amenizar o impacto da força g.
Para aqueles interessados em comparações entre o livro e a série de TV, a versão literária é tão elaborada que rendeu conteúdo para duas temporadas. Ainda que a série tenha sido inteligente em introduzir núcleos dramáticos e ótimos personagens logo no começo, a decisão de manter o foco narrativo do livro entre Holden e Miller acaba tirando o espaço de figuras como a excelente Chrisjen Avasarala, a líder das Nações Unidas da Terra. É claro que isso não afeta negativamente a versão original, já que são formatos e mídias diferentes, mas é curioso notar essa diferença.
Leviatã Desperta é uma forte introdução para um universo bem construído, personagens atraentes e uma trama conspiratória como poucas. Até o momento, apenas o primeiro livro foi lançado no Brasil, pela editora Aleph, e infelizmente não há uma data para trazer as continuações, mas essa permanece uma obra satisfatória, mesmo que deixe alguns ganchos para o livro seguinte. Vamos esperar.
Ficha Técnica: Título Original: Levathan Wakes Editora Aleph, 2017 Tradução de Marcia Blasques 672 Páginas.
Poucos nomes servem como símbolo de esperança e compreensão como Picard, um dos personagens mais importantes da ficção científica e da televisão, interpretado por Patrick Stewart na série Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, que teve sete temporadas entre os anos 1987 e 1994. Mesmo sendo mais aclamado na pequena tela, a última vez que vimos Jean-Luc Picard foi no filme Jornada nas Estrelas: Nemesis, de 2002, e desde então sentimos saudade do capitão da Enterprise.
Felizmente, quase duas décadas depois, tivemos a confirmação de que Patrick Stewart retornaria ao papel, estrelando uma nova série intitulada apropriadamente como Jornada nas Estrelas: Picard. No Brasil, teremos episódios todas as semanas através do serviço de streaming Prime Video, da Amazon, e já temos o primeiro, intitulado Remembrance, para analisar.
Há vários obstáculos no caminho que podem atrapalhar o desenvolvimento de Picard, incluindo a necessidade de atrair uma nova audiência para um personagem já estabelecido, sem contar que os fãs já possuem uma série da franquia Jornada atualmente, Discovery, com uma abordagem mais dinâmica e voltada para a estética dos filmes de J.J. Abrams, o que pode ser um problema, já que uma série focada em Picard parece demandar um tratamento mais introspectivo, com atenção maior aos diálogos e as atuações.
O resultado final é um híbrido entre a ação rápida da timeline Kelvin (criada para distinguir os filmes de J.J. Abrams, que apresentavam uma “linha temporal alternativa”)e da série Discovery, com toques de A Nova Geração, dando espaço para momentos de reflexão e silêncio. Talvez nem todos concordem com essa decisão, mas particularmente considero um compromisso necessário, desde que tenhamos um enredo e personagens consistentes.
Da mesma forma, Picard se beneficia dos avanços tecnológicos e o orçamento atual da televisão para entregar um visual cinematográfico, com uma câmera melhor, capaz de dar mais atenção aos detalhes, além de um tratamento melhor nas cores e uma estética limpa. A direção do primeiro episódio fica por conta de Hanelle M. Culpepper, que usa seu repertório em séries como Flash e a própria Discovery, para trazer um dinamismo para as sequências de ação, com coreografias mais elaboradas, como as empolgantes batalhas com Phasers. É um pouco estranho ver tanta ação em volta de Picard, mas faz parte do compromisso mencionado no parágrafo anterior.
Começamos a série com um Picard aposentado, conhecido como o ex-almirante que abandonou a federação para liderar uma frota de resgate depois do surgimento de uma supernova que acaba destruindo o planeta Romulus. O que já era uma missão arriscada, logo transforma-se em tragédia depois de um grupo de sintéticos se rebelarem, causando também a destruição do estaleiro de Utopia Planitia, localizada em Marte. Além de ligar com as repercussões de suas ações, Picard conhece Dahj, uma jovem procurando refúgio ao lado do ex-almirante.
Não há uma série sem Patrick Stewart, e o ator entrega tudo com uma performance mais contida e melancólica, um homem arrependido com uma vida solitária, acompanhado apenas de seus dois ajudantes romulanos e um cachorro, apelidado de Número Um. Mesmo mais velho, Stewart não esquece como é interpretar o personagem, que até em seu ponto mais baixo, serve como uma luz no meio de todo o embate político e a possível ameaça envolvendo as origens de Dahj, interpretada por Isa Briones.
No elenco também somos apresentados ao personagem de Alison Pill, a cientista Agnes Jurati, que auxilia Picard em uma busca sobre o passado de seu amigo, Data, papel reprisado por Brent Spiner. No fim, conhecemos também Narek, personagem de Harry Treadaway. Como é apenas o primeiro episódio, o que temos é uma grande introdução ao universo da série, sem muito espaço para o desenvolvimento dos personagens, então ainda é cedo para avaliar como cada um está indo, se bem que até o momento todos parecem bem confortáveis, principalmente os veteranos Stewart e Spiner.
Com a bela composição musical de Jeff Russo, conhecido por seu trabalho em Fargo, Legion e – mais uma vez – Discovery, ótimos visuais e uma trama promissora, Remembrance é um ótimo ponto de partida para essa nova jornada.
Agora, vamos para a parte em que analisamos alguns aspectos específicos do episódio:
MAKE IT SO – Referências, Teorias e Easter Eggs – SPOILERS!
O episódio começa com a música Blue Skies, de Ervin Berlin. Para os fãs de Jornada, a música ficou mais conhecida por conta do filme Nemesis, quando Data cantou a música durante o casamento de William T. Riker e Deanna Troi. A importância da música para o episódio está ligada diretamente a importância de Data para a trama, já que ele é, aparentemente, o pai de Dahj.
Enquanto a música toca, assistimos Picard jogando poker com Data, mas no fim descobrimos que é tudo um sonho. As partidas de poker eram comuns entre os membros da Enterprise em A Nova Geração, e mesmo sumindo por um tempo, Picard decidiu voltar para participar dos jogos no último episódio da série.
Na sequencia, podemos ver um pouco mais de Chateau Picard, a vinícola da família Picard, agora comandada pelo ex-almirante, que passeia ao lado de seu cão, Número Um, uma referência ao seu antigo primeiro imediato, William T. Riker, que ele chamava por Número Um.
Voltando para casa, Picard pede para o replicador de comida o seu chá favorito, Earl Gray. Dessa vez, descafeinado.
No mesmo dia, Picard recebe uma equipe de reportagem em seus aposentos. Eles debatem a missão de resgate pela qual foi responsável, e é visível que a federação e algumas pessoas de alta patente não ficaram felizes com a ação.
A destruição de Romulus é um ponto importante para o universo de Jornada por conta da criação da linha temporal Kelvin (explorada nos filmes Star Trek, Star Trek: Além da Escuridão e Star Trek: Sem Fronteiras), resultado direto dos eventos envolvendo a supernova.
Em mais um de seus sonhos, Picard caminha pela sua vinícola e encontra Data, pintando um quadro. Esse é um dos hobbies que o personagem adota durante A Nova Geração, como uma maneira de expressar artisticamente.
Ao acordar, Picard visita o prédio de “Arquivos da Frota Estelar”, onde ficam guardados documentos e outros objetos de seu tempo atuando como capitão da Enterprise. A sala está recheada de referências, como uma réplica da Enterprise, um Bat’leth (arma de batalha Klingon) e o banner de comemoração “Captain Picard Day”, do episódio The Pegasus, quando as crianças da nave decidem fazer uma festa celebrando o capitão.
Mas a grande revelação da cena é uma das pinturas de Data, onde Dahj pode ser vista, e a obra é intitulada “Filha”. No episódio The Offspring, de A Nova Geração, em uma das tentativas do personagem em se aproximar da humanidade, Data cria uma “filha” chamada Lal. O experimento não dá certo e ela precisa ser desativada, mas o androide mantém sua memória e faz uma pintura dela.
Continuando sua investigação, Picard vai ao instituto Daystrom, onde conversa com a doutora Jurati. Ela revela como tem mantido as partes do andróide B-4, uma versão inferior de Data, atualizado com suas memórias depois de se sacrificar pela tripulação em Jornada nas Estrelas: Nemesis.
Durante a conversa, Jurati menciona Bruce Maddox. No episódio The Measure of a Man, da segunda temporada, Maddox é um ciberneticista interessado em desmontar Data para estudar seus componentes e criar novas versões do androide, mas não tem sucesso.
No fim do episódio, somos introduzidos a uma instalação dos Romulanos e ao personagem Narek. Mas com a câmera se distanciando, descobrimos que ela está localizada dentro de um cubo Borg desativado.
O que achou do episódio?
Picard está de volta e a série parece mais promissora do que alguns imaginaram, principalmente depois de acabar com algumas teorias que estavam preocupando os fãs.
Jerome Bixby é um dos nomes mais importantes para a história da ficção científica na TV, escrevendo roteiros para alguns episódios clássicos de Jornada nas Estrelas, como “Mirror, Mirror”, ou de Além da Imaginação, com o excelente “It’s a Good Life”. Bixby esteve envolvido em poucos projetos desde então, mas seu nome voltou a chamar atenção com a chegada de O Homem da Terra, um filme de baixo orçamento lançado em 2007, com direção de Richard Schenkman.
Com uma premissa bem simples, O Homem da Terra apresenta um grupo de professores em sua última reunião de despedida para um de seus amigos, John Oldman, que decidiu se aposentar. Antes que vá embora, Oldman tem uma confissão que pode mexer não só com a relação deles, mas com tudo em que acreditam.
O primeiro elemento a chamar atenção no filme é a sua direção. Por conta do orçamento modesto, Schenkman decidiu empregar duas câmeras digital Panasonic DVX100, uma das mais usadas por outras produções independentes (Império dos Sonhos, de David Lynch, foi uma delas), principalmente documentários ou séries no Youtube.
O resultado é um visual um pouco mais escuro e granulado, que pode distrair nos primeiros minutos, isso sem contar alguns problemas com a re-dublagem de algumas cenas, principalmente as tomadas noturnas e exteriores, que provavelmente deviam ser mais barulhentas e precisavam ser inseridas na pós produção. Ainda assim, essas distrações deixam de ser evidentes quando consideramos que a verdadeira conquista da obra está no elenco e no roteiro.
Com debates filosóficos e existencialistas sobre a história da humanidade, construção de memória e identidade em si, o roteiro de Bixby rouba toda a atenção, criando uma narrativa de ótimo ritmo, revelando aos poucos informações sobre o protagonista e cada um de seus companheiros, que passam a maior parte do filme sentados em sua sala, bebendo uísque em copos de plástico. Mesmo que a história contada por John Oldman seja fascinante o suficiente, um grande acerto do filme é seu elenco.
David Lee Smith interpreta o sereno professor John Oldman, e ele faz um bom trabalho em instigar não só os seus colegas, como o espectador. Mesmo que ele seja o protagonista, temos alguns nomes mais conhecidos dos fãs de ficção científica e horror, como John Billingsley, de Jornada nas Estrelas:Enterprise; Tony Todd, do clássico A Noite dos Mortos-Vivos e William Katt, da série Super-Herói Americano.
O Homem da Terra é um daqueles filmes lançados sem expectativa ou aclamação alguma, que logo virou uma obra cultuada por muitos fãs de ficção científica, fascinados pelos conceitos que o gênero pode abordar e os debates que ele carrega. Pequeno em tamanho, mas grande em conteúdo.
Depois de lembrar os primórdios da ficção científica produzida no Brasil através de Machado de Assis, com a obra Sobre a Imortalidade de Rui de Leão, a editora Plutão realmente começa a explorar a pluralidade de vozes do país com a série Ziguezague. Com a proposta de entregar obras que contribuíram para a formação do gênero por décadas, somos apresentados a “Primeira Onda” da ficção científica nacional com Eles Herdarão a Terra, de Dinah Silveira de Queiroz.
Apresentando cinco contos (ou “racontos”, como Queiroz prefere chamá-los), Eles Herdarão a Terra alterna entre a ficção científica, ensaio político e relato sobrenatural, e por mais que sejam, em certo nível, abordagens distintas, o principal tema abordado pela autora é a solidão, presente em cada um dos contos.
Estamos numa época em que a solidão humana ganhou uma perspectiva capaz de produzir verdadeiras alucinações.
Com a intenção de abordar o absurdo, as histórias são divididas em três categorias: “Antecipação”, “Cotidiano” e “Sobrenatural”. A primeira é a mais rica em conteúdo, com narrativas um pouco maiores e detalhadas, sendo elas “A Universidade Marciana”, “O Carioca” e o conto que dá nome ao livro. Em seguida, com “Partido Nacional”, Dinah brinca com o “proverbial derrotismo brasileiro”. No fim, usa o conto “A Mão Direita” como ferramenta do absurdo além da compreensão humana.
Mesmo que “Partido Nacional” seja uma sátira política curiosa em sua premissa e desenvolvimento, ou “A Mão Direita” traga uma escrita mais rebuscada, o verdadeiro destaque da coletânea são os três contos de ficção científica.
Dinah Silveira de Queiroz
Em “A Universidade Marciana”, Dinah aborda o primeiro contato com um olhar mais íntimo e introspectivo, questionando as motivações e as consequências de encontrarmos nova forma de vida. Ambientada em um Rio de Janeiro distópico, onde a “enchente fez unir o mar à lagoa Rodrigo de Freitas”, temos também uma forte presença da igreja, principalmente na figura do papa, que recebe todos no Vaticano para estudar melhor a situação. Esse teor religioso está tão presente nos contos de Queiroz quanto a solidão que aflige os seus personagens.
“Estávamos, então, no limiar da Era Interplanetária, mas a ciência ensinara, durante esse tempo todo, que só a Terra era habitada”
Para “O Carioca”, Queiroz aborda os avanços no campo da cibernética, mas mesmo que a história introduza um cientista construindo o primeiro robô “viajante a Marte ou Vênus” (robô que dá nome ao conto), o verdadeiro apelo dramático da trama está na relação entre esse cientista e sua vizinha, uma viúva que acaba criando uma relação de afeto com as máquinas em seu apartamento.
Chegando no principal conto da obra, “Eles Herdarão a Terra”, somos arrastados ao lugar perfeito para explorar a solidão que fascina Queiroz: um farol, localizado à vista de Guaratiba, outro ponto do Rio de Janeiro. É lá que Marcos trabalha, ao lado de seu velho pai, até que sua irmã, Tudinha, os visita. As coisas ficam estranhas assim que uma figura misteriosa surge com revelações assustadoras sobre o futuro da humanidade.
O livro também tem espaço para algumas referências, não só literárias, como a menção de vários autores da Academia Brasileira de Letras, da qual a própria Dinah fez parte, mas também da ficção científica e de eventos como a famigerada transmissão de Orson Welles para a rádio CBS, em 1938, quando decidiu narrar o livro Guerra dos Mundos, ao vivo, e causou certa comoção (ainda que parte dela seja fabricada para aumentar o impacto da história).
“Sempre haverá quem sustente que tudo partiu de um mero espetáculo de ficção científica, gênero muito popular então, mas agora totalmente esquecido”
Com uma narrativa lenta, mas carregada de tensão, essa é uma coletânea relativamente curta, principalmente considerando que apenas três contos são realmente ficção científica, mas ainda é atraente conhecer melhor o trabalho de Queiroz e suas diferentes vozes refletindo sobre a solidão carioca. Eles Herdarão a Terra é mais um resgate necessário feito pela editora Plutão, que não deixa de surpreender.
Eles Herdarão a Terra (1960), de Dinah Silveira de Queiroz.
163 Páginas; Editora Plutão, 2019
O livro também conta com um prefácio de Ana Rüsche, e a arte gráfica de Paula Cruz.
Para a última matéria do ano, decidi fazer a retrospectiva com produções sci-fi que conseguiram se destacar, positiva ou negativamente. Tivemos um ano com boas produções, talvez melhor que o anterior, e mesmo que alguns desastres tenham chegado às salas de cinema (ou no conforto da sua casa, com algum serviço de streaming), há mais vitórias que derrotas.
Antes de começar, vale mencionar que as obras destacadas (em negrito), boas ou não, correspondem ao gosto de quem escreve essa matéria. Vamos lá.
Os Desastres
Mesmo com boas produções, esse foi o ano em que a Netflix decidiu colocar em seu catálogo os filmes IO, com uma premissa genérica que desperdiça o tempo da atriz Margaret Qualley, e a comédia Fim do Mundo, que considera citar referências de outros filmes (melhores) constantemente e depender de humor barato, algo engraçado.
Mas saindo da Netflix, esses dois exemplos não chegam perto do desperdício de tempo e dinheiro chamado Cópias – De Volta à Vida, estrelado por Keanu Reeves.
Cópias – De Volta à Vida
O problema do filme não é ter todos os elementos mais batidos do mundo para a construção da trama (acidente de carro, corporação do mal…), mas sim não saber usá-los. Eu não vejo problema algum em ter um roteiro simples e direto ao ponto, mas se você não for consistente com cada uma das coisas que apresenta, o resultado é um produto vazio e tedioso.
Cópias erra em quase todos os aspectos, o primeiro deles sendo a direção de Jeffrey Nachmanoff, que não só depende demais de movimentos de câmera desnecessários, como o excesso do ângulo holandês (dutch angle para o pessoal internacional), presente em cenas onde não só destroem a tensão que o longa tenta construir, mas distraem pela maneira nada natural com a qual Nachmanoff aborda as cenas. Esse é mais um filme genérico e previsível que poderia ter sido lançado direto em algum streaming e ainda assim, não recomendaria.
Outra produção que não conseguiu convencer o público foi o retorno da franquia MIB: Homens de Preto, com o filme MIB: Homens de Preto – Internacional, estrelado por Tessa Thompson e Chris Hemsworth, a direção ficou por conta de F. Gary Gray, responsável pela comédia Friday (Sexta-Feira em Apuros, no Brasil), que parece não ter dado conta de uma franquia grande como essa. O desastre foi público e crítico, e o filme quase não apareceu nessa lista por ser tão esquecível.
E infelizmente, uma outra grande decepção veio estrelada pelo ex-protagonista de MIB, Will Smith. O ator não parece conseguir uma nova produção que carregue a aclamação do começo de sua carreira, mas ele continua tentando, e por isso se reuniu com o ótimo diretor Ang Lee, de O Tigre e o Dragão e As Aventuras de Pi, para um novo blockbuster de ação que prometia trazer de volta um sucesso de bilheteria e público para o ator.
Com Projeto Gemini, Ang Lee explora a velocidade de fotogramas (ou frame rate), e tenta gravar o filme em 120 quadros por segundo (ou fps), o que altera drasticamente a experiência, mexendo com o ritmo e a nitidez da imagem, deixando-a tão suave que chega a causar náusea em algumas pessoas. Os cinemas sequer tinham capacidade para passar essa versão do filme em todas as suas salas, então disponibilizou em outras versões, não só a comum, de 24 quadros, mas uma de 60.
Lee já chegou a lançar o filme A Longa Caminhada de Billy Lynn da mesma maneira; mas enquanto esse, um drama de guerra, se beneficia de uma filmagem mais realista por conta da narrativa crua, Projeto Gemini sofre por depender de sequências de ação exageradas e nem um pouco realistas, o que o aumento da quantidade de quadros deixa mais evidente, principalmente em uma absurda sequência envolvendo uma perseguição de motos que desafia várias leis da física.
Mas não é como se a quantidade de quadros fosse o verdadeiro problema de Projeto Gemini, que traz bons atores como Mary Elizabeth Winstead e Benedict Wong para interpretar um enredo repetitivo e previsível, sem contar que dessa vez Ang Lee parece estar mais cansado que nunca, com uma das direções mais sem identidade do ano.
Os Sucessos
Saindo das decepções, é hora de abordar o que deu certo esse ano, começando pela ação Alita: Anjo de Combate. Baseada no mangá Gunnm, de Yukito Kishiro, Alita é a jornada de uma ciborgue à procura de sua identidade perdida. É uma premissa conhecida, mas há elementos o suficiente para fazer dessa história algo próprio.
É uma premissa que envolve batalhas entre outras máquinas e ao mesmo tempo deve desenvolver uma protagonista carismática capaz de carregar uma possível franquia. Por esse motivo entendo a decisão de chamarem alguém como Robert Rodrigues para comandar o projeto. Ele já se provou competente criando boas sequências de ação “cartunesca” com seus Sin City e Machete, mas também sabe apelar para o lado mais infantil, o que ajudou no desenvolvimento de Alita, uma guerreira de personalidade forte, mas com o entusiasmo de uma criança para coisas novas.
Alita: Anjo de Combate
O filme conseguiu “se pagar” na bilheteria, mas não foi nada estrondoso, o que coloca em risco as chances de uma continuação. Mesmo com problemas, Alita encontrou as pessoas certas para sua adaptação. Até mesmo os olhos grandes tiveram uma explicação mais plausível e aceitável que as modificações de outra adaptação estrelada por um ciborgue, o decepcionante live action de Ghost in the Shell, de 2017.
Dessa vez vou dar crédito à Netflix por ter distribuído algumas produções independentes muito boas. A primeira delas é I am Mother, um filme de menor escala e orçamento relativamente modesto, considerando o que costumam valer outros filmes de estúdios e diretores mais conhecidos.O filme tem a vantagem de poder criar cada um dos seus elementos com mais cautela e sem muita intromissão.
Esse é o primeiro longa do diretor Grant Sputore, mas ele faz um bom trabalho. Há espaço para algumas reviravoltas, o que muitos diretores parecem criar primeiro e montar o filme inteiro em cima delas, mas essa é uma obra onde o enredo e os personagens vem antes, e mesmo que traga algumas características “batidas” de narrativas sci-fi, uma execução limpa e objetiva sempre funciona. Ao lado da direção, a equipe de design merece elogios pela forma como apresentou o mundo do filme e montou o visual dos droides. Uma boa surpresa.
I Am Mother
Ao lado de I am Mother, tivemos uma aula de como fazer filmes de baixo orçamento com o ótimo Riqueza Tóxica. Lançado originalmente em 2018, o sci-fi independente só chegou ao Brasil em 2019, quando a Netflix decidiu distribuí-lo.
No meio de tanta coisa grande saindo nos cinemas, rendendo bilhões nas bilheterias, seja mais um filme da franquia Marvel ou Star Wars (basicamente, tudo Disney), é fascinante ver como uma obra menor, em escala e orçamento, consegue ser tão poderosa. Começando pela sua construção visual, que atingiu uma estética realista e distópica sem precisar do uso de tela verde. A maior parte das filmagens foi realizada em uma floresta conhecida da infância dos diretores, e um galpão precisou ser construído para que a equipe pudesse trabalhar perto do local.
É esse tipo de esforço que me faz apreciar ainda mais filmes assim, onde é visível a importância de ter sido gravado longe de um estúdio, com luz natural, contribuindo para a imersão daquele mundo. Tudo aqui é original: trajes espaciais, armas, ilustrações e até mesmo a poeira. Para que o filme tivesse sua própria identidade visual, os diretores passaram dias explorando maneiras diferentes de representar a poeira rosada que cobre a superfície de uma lua verde.
Riqueza Tóxica
Também foi em 2019 que o aclamado diretor Spike Lee produziu uma ficção científica. A Gente se Vê Ontem é o primeiro longa de Stefon Bristol, que tem alguns curtas no currículo e esteve envolvido nas filmagens de Infiltrado na Klan, onde provavelmente conheceu Spike Lee. A Gente Se Vê Ontem é baseado em um de seus curtas de mesmo nome, trazendo de volta a maior parte do elenco para a nova versão.
Esse é um filme carregado de temas pertinentes ao diretor e a comunidade negra, tendo a brutalidade policial como principal objeto de análise. Mas ainda que envolva críticas sociais e um dilema moral por parte dos seus protagonistas, seguimos com um tom leve, que lembra um pouco a sensação de estar assistindo apenas uma produção adolescente.
Os elementos de ficção científica ficam em segundo plano, mesmo que sirvam para impulsionar a trama. Isso não é um problema, já que o gênero abre as portas para incontáveis interpretações e é uma das melhores opções quando um roteiro precisa de uma alegoria construtiva. Aqui temos viagem no tempo e efeito borboleta para mostrar como a violência contra a comunidade negra não é uma casualidade, envolve uma mentalidade preconceituosa impregnada na sociedade.
A Gente se Vê Ontem
Mas a grande surpresa divulgada (mesmo que pouco) pela Netflix esse ano foi o maior sucesso de bilheteria da China nos últimos anos, a jornada espacial Terra à Deriva. Também lançado originalmente em 2018, o filme chegou ao Brasil apenas esse ano, e é um excelente trabalho que funciona em todos os níveis, com sequências de ação angustiantes na superfície e debates sobre culpa e arrependimento nos minutos derradeiros da humanidade.
Frant Gwo assina a direção. Mesmo com poucos filmes no currículo, faz um excelente trabalho. Além de encontrar um ótimo elenco (incluindo Mike Sui, que interpreta Tim e serve de alívio cômico. Felizmente, bem encaixado) e desenvolver alguns visuais impressionantes, Terra à Deriva é o tipo de obra que consegue construir drama envolvente no meio da ação incessante.
Terra à Deriva é uma adaptação do conto literário de mesmo nome do autor chinês Cixin Liu, que ficou conhecido por ter sido o primeiro de seu continente a receber o prêmio de Melhor Romance no Hugo Awards(com o seu “O Problema dos Três Corpos”). O filme foi feito com aproximadamente $50 milhões e tornou-se um sucesso rendendo quase $350 milhões de bilheteria apenas em seu país de origem.
Terra à Deriva
Continuando fora do mercado norte-americano, vale mencionar o misterioso drama brasileiro Divino Amor, sobre um futuro teocrático absurdo, mas nem um pouco impossível considerando a crítica que estão fazendo usando o paralelo da presença de uma “bancada evangélica” no congresso nacional. A atriz Dira Paes apresenta uma personagem que combina carisma e intimidação, mas é complexa o suficiente para entregar certa fragilidade.
Ainda que 2019 seja o ano de Bacurau, que tecnicamente entra em ficção científica por ser uma narrativa em um “futuro distópico”, Divino Amor explora mais o gênero, com sua ambientação de neon e construção de mundo mais futurista. Essa obra prova que o cinema brasileiro, além de inteligente em enfrentar os obstáculos que o próprio país coloca em sua frente, consegue ser original, independente do gênero.
Vale lembrar aqui que algumas obras provavelmente não chegarão aos cinemas ou serviços de streaming brasileiros, então decidi usar esse espaço para mencionar duas obras mais introspectivas, que receberam pouca atenção da bilheteria. A primeira é High Life, estrelada por Robert Pattinson, que tecnicamente é mais uma da lista lançada em 2018, em festivais, mas chegou aos serviços de mídia digital com certo atraso. Indo para o segundo exemplo, tivemos Lucy in the Sky, dirigido por Noah Hawley, responsável pelas séries Legion e Fargo.
Os dois filmes souberam explorar o formato um pouco melhor, ao contrário do que aconteceu em Projeto Gemini. Eles brincam com a estrutura e linguagem do cinema, e mesmo que a alternância na razão de aspecto em Lucy in the Sky distraia um pouco, não deixa de ser criativa. O enredo das duas obras segue uma premissa simples, mas se aproveita dos atores para entregar um estudo de personagem mais envolvente, seja a solidão do espaço sentida por Robert Pattinson em High Life, ou a solidão na Terra, por não estar mais no espaço, de Natalie Portman, como a protagonista em Lucy in the Sky.
A Grande Obra do Ano
É arriscado afirmar que uma obra de arte tenha se expressado melhor que outra. Na verdade, é impossível. Todos temos reações e impressões diferentes por conta de nossos gostos, mas existem conquistas técnicas e narrativas que ficam visíveis em um filme, e talvez Ad Astra: Rumo às Estrelas represente isso melhor que os outros filmes da lista.
Pouco pode ser dito sobre a proposta da obra sem entregar detalhes relevantes da trama, que apresenta sequências de ação impressionantes ao lado de um ritmo mais vagaroso. Isso pode soar como um contraste capaz de colocar a experiência do filme em risco, mas tudo funciona perfeitamente.
Ad Astra: Rumo às Estrelas
Seguindo uma trajetória contrária do que se espera de um filme grande como esse no atual contexto das salas de cinema, Ad Astra se distancia completamente de sucessos como Interestelar, de Christopher Nolan, e tem mais interesse em uma condução que ecoa melhor os longa-metragens de ficção científica do diretor russo Andrei Tarkovski, como Solaris ou Stalker.
Ad Astra é uma experiência diferente, a jornada solitária de um homem com um dilema universal. Aqui podemos ver como a humanidade conquistou a lua e até Marte, mas continua olhando para o céu na esperança de nova vida, esquecendo a que já possui.
O que achou da lista? Se concorda, discorda ou acha que faltou algo, é só deixar nos comentários.
2020 promete ser ainda mais agitado, com a chegada de filmes como O Homem Invisível, The Tomorrow War, o atrasado Chaos Walking, e a tão aguardada adaptação de Duna pelo diretor Denis Villeneuve. O problema agora é esperar.
2019 foi um bom ano para a ficção científica. Ainda que uma série ou outra possa decepcionar ou ser simplesmente ruim, no geral, foi um ano com o retorno de nomes fortes e a estréia de alguns que prometem evoluir bastante, sem contar as minisséries que, até o momento (nunca se sabe quando um estúdio pode encomendar uma segunda temporada), entregaram uma história impressionante.
Antes de começar a lista, vale mencionar que as séries destacadas, boas ou não, correspondem ao gosto de quem escreve essa matéria. Também serão válidas apenas as temporadas lançadas esse ano (se ela não tem data para sair no Brasil, considero o lançamento no país original), e aquelas que eu assisti em sua totalidade, então vou deixar logo algumas menções honrosas de séries que comecei, mas ainda não terminei, como a terceira temporada de Stranger Things e The Handmaid’s Tale, assim como a estréia das séries Osmosis e Raising Dion. As duas começaram muito bem, mas por motivos de agenda e a confusão de tanto material para ler / assistir / resenhar, acabei deixando elas para depois.
Outros exemplos, como a aclamada Dark, não entram na lista pelo simples fato de eu ter demorado demais para começar a assistir, então ainda estou no começo (mas o pouco que vi já achei muito bom). Independente disso, a lista está longe de ser pequena, e mesmo com alguns exemplos de “séries ruins”, felizmente a maioria teve um resultado positivo.
A lista segue uma ordem de pior para melhor série, então vamos começar logo indo das decepções do ano, chegando aos poucos nas obras que melhor representaram o gênero ou foram simplesmente excelentes.
The I-Land e Another Life (Estréias)
As duas piores do ano dividem a posição por terem problemas similares. Enredos mal executados, personagens sem desenvolvimento e dramas forçados ao ponto de beirar o ridículo, tanto que cheguei a fazer uma matéria apenas para destacar o que deu errado nas duas séries, e na maneira como a Netflix vem abordando algumas produções de ficção científica.
É uma pena ver uma atriz boa como Katee Sackhoff interagindo com personagens tão ruins (destaque para a palavra “personagens”, isso porque a culpa é exclusivamente do roteiro, já que alguns nomes do elenco já estiveram bem em outras produções) em Another Life; e The I-Land não foge da bronca por ter basicamente copiado a estrutura narrativa e vários elementos de Lost, incluindo a premissa. Duas grandes decepções, mas agora é hora de começar a tirar o gosto ruim da boca e partir para algo um pouco melhor.
Love, Death & Robots (Estréia)
A proposta de Love, Death & Robots é bem criativa. Uma série em formato de antologia contendo dezoito curtas com temática sci-fi, por diferentes artistas. Criada por Tim Miller, de Deadpool, e David Fincher, de Clube da Luta, você pode ir alternando entre os curtas sem problema, já que eles não possuem qualquer ligação narrativa. É claro que em uma coletânea de dezoito histórias, algumas podem ser menos interessantes, outras podem acabar se tornando repetitivas, mas as que funcionam, funcionam bem.
Você pode saber mais sobre cada um dos curtas em um vídeo feito para o canal do Primeiro Contato.
Black Mirror(5ª Temporada)
Para sua quinta temporada, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente considerando que todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série.
A série parece estar um pouco perdida em alguns momentos, e entrega um de seus episódios mais fracos, Rachel, Jack and Ashley Too. Mas há casos onde Black Mirror continua surpreendendo o público com uma premissa original, como em Striking Vipers; ou quando não é muito original, compensa com boas atuações e tensão, o que acontece em Smithereens.
Além da Imaginação (Estréia)
Um clássico está de volta. Jordan Peele, diretor de Corra e Us, assume o posto de anfitrião da série, e mesmo que Rod Serling, o apresentador original, seja insuperável, Peele faz um bom trabalho. Em uma temporada com dez episódios, Além da Imaginação pode ter um retorno um pouco turbulento, com pequenos tropeços ao longo do caminho, mas no geral consegue se salvar trazendo narrativas relevantes e com premissas instigantes.
Ainda que em seu último episódio a série tenha uma reviravolta um pouco desnecessária, ela deixa um indício de que a segunda temporada pode ser um pouco mais livre para explorar as bizarrices que a série clássica adorava, o que esse remake parecia ter um pouco de vergonha. Você pode assistir os vídeos sobre cada um dos episódios no nosso canal.
His Dark Materials (Estréia)
Com um elenco impressionante, incluindo nomes como James McAvoy e Lin Manuel Miranda, His Dark Materials é a promessa de uma adaptação mais fiel e competente da série de livros de mesmo nome, que recebeu uma versão esquecível para os cinemas, em 2002, levando o título do primeiro livro, A Bússola de Ouro.
A primeira temporada tem apenas oito episódios, e é uma pena que demore para realmente engatar na trama, que começa apresentando muitas informações, mas explorando-as bem pouco. Felizmente, quando as coisas entram no eixo, His Dark Materials pode brilhar além de suas ótimas atuações e efeitos especiais de qualidade, provavelmente os melhores do ano.
Star Trek: Discovery (2ª Temporada)
Não é uma lista de ficção científica sem um pouco de Star Trek. A segunda temporada de Discovery se arrisca brincando com o passado e estabelecendo um novo futuro, mas ainda tem seus pequenos problemas, como subtramas mal valorizadas ou diálogos ruins. Ainda assim, Discovery continua uma boa escolha para matar a saudade da franquia, com alguns episódios que seguem a essência da série, como New Eden, dirigida pelo veterano Jonathan Frakes.
Depois de uma primeira temporada inconsistente, havia uma preocupação para o que viria neste segundo ano, principalmente depois do season finale da temporada anterior introduzir a clássica NCC-1701, capitaneada no momento por Christopher Pike (Anson Mount). E por falar em Anson Mount, o rapaz foi tão bem aceito pelos fãs que a ideia de um spin off surgiu antes mesmo da temporada acabar.
Undone (Estréia)
Após terem escrito o sucesso Bojack Horseman, da Netflix, os roteiristas Kate Purdy e Raphael Bob-Waksberg (também showrunner da série), decidiram desenvolver uma nova produção, com um formato diferente e para outro serviço de streaming, dessa vez a Amazon Prime Video. A minissérie Undone é um drama peculiar em sua apresentação, envolvido em elementos de ficção científica.
Trazendo a atriz Rosa Salazar como protagonista, e utilizando rotoscopia, uma técnica onde as filmagens com atores são aproveitadas para que novos quadros sejam desenhados “por cima delas”, Undone foi uma das maiores surpresas do ano, e um grande acerto da Prime Video, apresentando uma experiência arriscada, capaz de distrair e distanciar alguns não acostumados ou satisfeitos com a técnica (o que não é o meu caso), mas que ainda funciona muito bem como a jornada de uma jovem descobrindo sua própria identidade enquanto encara o desafio da aceitação. Leia nossa crítica completa da temporada.
Rick and Morty (4ª Temporada)
Colocar Rick and Morty nessa lista é trapacear um pouco, já que apenas metade da temporada foi lançada esse ano, enquanto a outra chega apenas em 2020. Mas tecnicamente, os cinco episódios da série liberados esse ano são o que tivemos de Rick and Morty, e qualquer coisa dessa animação já vale a pena ser mencionada.
Depois de uma terceira temporada com recepções mistas (por conta de problemas no estúdio, atrasos e mudanças na sala de roteiristas, e por aí vai), Rick and Morty volta mais forte mostrando que consegue equilibrar narrativas originais e entregar um pouco do que os fãs querem, mesmo que na maioria dos casos esteja fazendo piada deles (apenas aqueles que merecem a zombaria, como quem sobe no balcão do McDonalds pedindo um sachê de molho que a série menciona em um episódio).
Depois de ser cancelada injusta e prematuramente pelo canal SyFy quando acabou de entregar uma ótima terceira temporada, The Expanse conseguiu um novo lar no serviço de streaming da Amazon, o Prime Video. O mais impressionante não é apenas o fato de ter sido renovada para uma quarta temporada, mas por continuar com uma base de fãs forte e críticas positivas sendo uma série de ficção científica mais “pesada” no meio de tantas produções de maior nome.
Com essa mudança, alguns poderiam ficar preocupados com o rumo tomado pela série, ainda mais com a redução de episódios por temporada, indo de treze para dez (como foi em seu primeiro ano), ou ter que mexer nos cenários e agendas de elenco. Felizmente, a maioria dessas preocupações foram desnecessárias e tivemos um ótimo retorno para uma das melhores séries da atualidade.
Legion (3ª Temporada)
Em um mundo cheio de adaptações de quadrinhos no cinema e na TV, tivemos dois destaques positivos, e o primeiro deles é Legion, que teve sua terceira e última temporada esse ano. Enfrentando a baixa audiência e orçamento modesto, o criador Noah Hawley conseguiu descobrir maneiras de criar uma despedida justa para um personagem complexo como David, o protagonista interpretado por Dan Stevens.
Ambientado no universo dos X-Men, da Marvel Comics, Legion conta a história de David Haller, o filho do líder dos mutantes, Charles Xavier, lidando com seus demônios interiores, literalmente. Com um enredo bizarro, excelente direção de arte e um bom elenco, Legion pode ter passado despercebida por alguns, mas é uma das melhores séries do ano.
Watchmen (Estréia)
Uma das maiores surpresas do ano é Watchmen. E eu não digo isso por terem feito mais um derivado do quadrinho original de Alan Moore e Dave Gibbons, também não é por ser no formato de série para HBO, o que realmente surpreendeu o público é como a adaptação funcionou bem.
Aproveitando os temas e os debates políticos do quadrinho, o criador da série, Damon Lindelof, seguiu o caminho da renúncia por uma versão completamente submissa ao material original, mas ainda assim respeitando a linguagem de Moore, sem idealizar seus personagens, mostrando como realmente poderia ser um cotidiano entre mascarados.
Um elenco perfeito, enredo de primeira e a maravilhosa trilha sonora da dupla Trent Reznor e Atticus Ross fizeram de Watchmen o melhor lançamento da HBO esse ano.
Criada pela genial Brit Marling, The OA se posiciona como uma das produções mais originais atualmente, e eu ouso arriscar que é o mais próximo que teremos de algo no nível de Twin Peaks (que saudades de você!). Essa segunda parte (como chamam as temporadas) mescla alguns gêneros sem perder seu ritmo. A ficção científica ainda é uma base para a série, mas o misticismo, já presente antes, agora tem um papel ainda maior na jornada.
O que transformou The OA em um evento para mim é a forma como alterna organicamente entre gêneros, traz personagens envolventes e abraça cada pedaço da trama, até aqueles que podem soar vergonhosos à princípio, mas que logo se revelam um momento executado com tanta honestidade e vontade de inovar que te faz admirar a produção com mais força.
Meticulosa em cada elemento, The OA é facilmente a melhor série de ficção científica do ano.
O que achou da lista? Se discorda, concorda ou acha que faltou algo, é só comentar abaixo.
Felizmente, esse foi um bom ano para o gênero na TV e nos serviços de streaming, e pelo que vi das estréias de 2020, o próximo ano parece ainda melhor.