Finalmente, está entre nós o primeiro trailer oficial de Duna: Parte 2, a aguardada continuação dirigida por Denis Villeneuve. Nessa LIVE, Daniel Milano (Portal Farcaster) e Roberto Honorato comentam as referências, easter eggs e teorias que podemos encontrar nesse trailer.
Para a alegria de muitos fãs, a adaptação do clássico de Frank Herbert, Duna, pelo diretor Denis Villeneuve, foi indicado ao Oscar 2022 em dez categorias. Enquanto gravo esse vídeo, a premiação ainda não aconteceu, então não sabemos todas as categorias que o filme pode ter vencido, MAS já é um grande feito e vitória para um gênero que costuma ser geralmente ignorado em grandes premiações mais prestigiosas. Ainda assim, admito que não estou otimista demais porque, tirando categorias técnicas e raros casos de roteiro e atuação, nunca tivemos um filme de ficção científica ganhando o principal prêmio de Melhor Filme do Ano nos Oscars.
Por mais que a premiação tenha sofrido com uma queda de audiência nos últimos anos, muito disso por conta da péssima administração nos bastidores do que o interesse do público, ela ainda tem um grande impacto na indústria cinematográfica e influência no público geral. O que tem de estúdio por aí que esperou alguma indicação ou vitória no Oscar pra finalmente anunciar seu filme nem dá pra contar.
Mas ainda que tenha esse obstáculo de audiência, os Oscars continuam sendo uma premiação de prestígio e muitos produtores consideram a validação por parte da academia um grande feito. É por isso que filmes de herói, como Marvel e DC, vivem procurando formas de serem indicados. Não vou entrar no mérito de filmes de arte ou não, ou em todo o problema da Disney monopolizando as salas de cinema, mas é curioso como filmes de herói conseguem uma bilheteria estratosférica, mas nunca são reconhecidos pelos Oscars, sendo que eles devem representar a indústria e, queira ou não, os filmes de herói fizeram bastante sucesso.
Você pode não gostar dos filmes de boneco, eu mesmo tenho meus problemas com alguns deles – talvez mais com o sistema do que os filmes em si -, mas convenhamos que desde que O Cavaleiro das Trevas recebeu 8 indicações, mas não foi sequer indicado Melhor Filme, dava pra ver como a premiação era mais parcial com esse tipo de filme. Tudo bem que o filme levou de Melhor edição de Som e entregou a vitória póstuma pro Heath Ledger como ator coadjuvante, mas por mais que eu tenha gostado de Quem quer ser um Milionário?, e o Danny Boyle é um dos meus diretores favoritos, é difícil não aceitar que O Cavaleiro das Trevas acabou sendo o filme que ditou o tom de várias obras – não só de herois, mas de ação – dos anos seguintes. É só lembrar a fase de entrevistas com diretores que prometiam um filme “realista e sombrio”.
É curioso como Birdman, um filme que comenta a indústria de super heróis, foi aclamado pelas premiações e venceu o prêmio de Melhor Filme – enquanto Logan, obra que também procura analisar o próprio gênero enquanto apresenta uma despedida bem construída através de uma narrativa western, e tem algumas das melhores atuações das carreiras de Hugh Jackman e Patrick Stewart, recebeu apenas uma indicação de roteiro adaptado. Talvez se o filme fosse vendido como um longa em plano sequência, como foi Birdman, talvez animasse mais a galera votante do Oscar, que adora um chamariz narrativo ou nostalgia pela antiga hollywood e a segunda guerra mundial – não duvido nada que alguns conservadores até sintam saudade desse último, MAS seguindo em frente.
Voltando para a ficção científica, temos o caso de Argo, que venceu a categoria principal em 2013. O enredo apresenta uma história de ficção científica dentro da história principal, um drama político sobre um agente da CIA em uma operação para resgatar reféns norte-americanos no Irã. É curioso como dentro da narrativa a ficção científica contribuiu para ajudar os agentes em uma missão arriscada, mas o filme só levou o prêmio mesmo porque o gênero estava em segundo plano, o que venceu foi o drama político. No mesmo ano tivemos A Viagem, das irmãs Wachowski, um filme que dividiu bastante as críticas e o público, mas ele é bem melhor que O Lado Bom da Vida, então podia ter roubado o espaço dele na categoria – se bem que todo mundo sabe que o vencedor moral daquele ano foi Django Livre.
A História da Ficção Científica no Oscar
Quando a gente para pra perceber alguns filmes clássicos da ficção científica que não receberam indicações na categoria principal, dá pra perceber a clara indiferença da academia por filmes de gênero. Na maioria das vezes, são lembrados apenas nas categorias de efeitos especiais ou maquiagem.
Duas adaptações de obras de um dos pais da ficção científica moderna, H.G.Wells, se tornaram um marco do gênero no cinema, mas nas premiações da academia receberam apenas um prêmio, na mesma categoria, de Melhores Efeitos Especiais – o primeiro sendo para A Guerra dos Mundos de 1953, e no começo da década seguinte, A Máquina do Tempo, de 1960. Hoje os dois filmes são considerados essenciais para quem tem o interesse em conhecer melhor a ficção científica no cinema, e é uma pena não terem sido reconhecidos por uma instituição que deveria entender sobre a sétima arte. Planeta Proibido, outro clássico da época, também recebeu o prêmio na mesma categoria, mas é triste lembrar que O dia em que a Terra Parou não foi lembrado em categoria alguma.
Mas isso foi algo mais recorrente na década de 1950, as décadas seguintes foram diferentes, obviamente.
Só que não.
Nos anos seguintes tivemos uma sequência de filmes sendo reconhecidos em outras categorias, mas continuaram vencendo apenas em efeitos especiais, e em raros casos, em direção de arte. É como se a Academia nem tivesse os assistido – o que é uma possibilidade considerando alguns vencedores na história do Oscar – e parece que eles só viam ficção científica como uma desculpa para diretores colocarem aliens e naves na tela.
Na década de 1960, Viagem Fantástica venceu em direção de arte e efeitos visuais e em 1969, Planeta dos Macacos conseguiu um prêmio honorário por maquiagem para John Chambers – o que, vamos considerar, é pouco para um filme tão importante quanto esse. O roteiro é do Rod Serling, criador de Além da Imaginação, em um dos seus melhores trabalhos, e ele merecia ao menos ter sido indicado.
No mesmo Oscar de Planeta dos Macacos tivemos uma das obras primas de Stanley Kubrick, 2001: Odisseia no Espaço. Ele conseguiu indicações em algumas categorias importantes, como “direção”, “roteiro” e “direção de arte”, e com certeza merecia vencer em todas, mas como você já deve estar imaginando, o filme venceu apenas uma categoria. Efeitos visuais.
O próprio Stanley Kubrick, um dos diretores mais conhecidos e reverenciados da indústria, também é um dos menos premiados nos Oscars, e nunca levou uma estatueta por melhor direção. A única que recebeu, em toda sua carreira, foi a de efeitos visuais em Odisseia no Espaço.
É ainda mais decepcionante lembrar que Kubrick conseguiu quebrar parte da maldição do scifi nos oscars com Laranja Mecânica, em 1971. A obra foi indicada em direção, roteiro, edição, e finalmente, em melhor filme. Foi a primeira vez que uma ficção científica teve a chance de receber o principal prêmio da noite.
E é claro que perdeu.
Mas pelo menos neste ano o grande ganhador foi Operação França, então Laranja Mecânica não perdeu para um filme qualquer.
Em seguida, chegamos na década de 70, e a mesma coisa: todos receberam apenas prêmios de efeitos visuais. Isso aconteceu com Fuga do Século 23, e até o Alien de Ridley Scott. Já Contatos Imediatos do Terceiro Grau, um dos clássicos do Spielberg, conseguiu várias indicações, em “atriz coadjuvante”, “direção”, “direção de arte”, “som”, “edição”, “efeitos visuais” e “trilha sonora original”, mas só venceu em edição de som. Também, seria um crime se perdesse nessa categoria.
Isso começou outra tendência. Além de premiar scifi com efeitos visuais, os Oscars passaram a colocar o gênero na categoria de som o tempo todo.
Na década de 80, isso aconteceu com Aliens: O Resgate, Robocop e De Volta para o Futuro. Quanto à Blade Runner, ele esteve presente nas categorias de efeitos visuais e direção de arte, mas saiu de mãos vazias.
Entre os anos 70 e 80, apenas dois filmes se destacaram ao ponto de receber indicações em categorias principais, incluindo a de melhor filme: mais um do Spielberg, o charmoso e divertido E.T. e um tal de Star Wars, que não fez muito sucesso.
E.T. foi indicado em diversas categorias, como direção, roteiro, direção de arte e edição, e venceu melhor som, edição de som, efeitos visuais (obviamente) e trilha sonora.
Já Star Wars foi em ator coadjuvante, direção e roteiro, vencendo em vários, como direção de arte, figurino, som, edição, efeitos visuais, trilha sonora e um prêmio especial por efeitos sonoros.
Como eu disse, os dois também receberam indicações de Melhor Filme, mas infelizmente, não venceram.
Depois disso, houve um espaço de quase 30 anos sem qualquer filme de ficção científica indicado na categoria principal. Não é como se tivesse faltando bons filmes do gênero.
A década de 90 teve algumas obras incríveis, que até receberam indicações, mas aquelas que você já esperava. Vingador do Futuro em efeitos visuais, O Exterminador do Futuro 2 com som, maquiagem e o obrigatório de efeitos visuais, e Homens de Preto também levando a estatueta por maquiagem. O maior esnobado dessa vez sendo Jurassic Park, que até venceu em tudo que foi indicado, nas categorias de “som” e, se prepare… “efeitos visuais”. Mas considerando que era um filme do Spielberg, um queridinho da academia, é estranho o filme não ter sido reconhecido como deveria.
“Ah, Roberto, para de reclamar, ele ganhou uns três Oscars”.
“Estamos falando de uma premiação em que Shakespeare Apaixonado levou 7 estatuetas e disse que Green Book é o melhor filme do ano, ganhando de filmes bem melhores que ele, você acha que apenas 3 vitórias é o suficiente para um filme que nos trouxe Jeff Goldblum sem camisa?” [jeff goldblum]”
Esse padrão de premiar a ficção científica nas mesmas categorias evidencia a falta de vontade da Academia em reconhecer filmes de gênero, não só scifi, mas horror e comédia, que até hoje são ignorados, mesmo que horror já tenha recebido certo amor dos Oscars quando Silêncio dos Inocentes fez a limpa em todas as categorias principais, merecidamente. É a galera aqui do scifi que nunca recebe um carinho.
Esse é um fenômeno que foi apelidado de sci fi gueto, ou o gueto da ficção científica. Ele reflete um preconceito que algumas obras de ficção científica sofrem por parte de muitas pessoas, que desmerecem o potencial de uma produção pelo simples fato dela possuir características do gênero. Hoje nem tanto, mas já foi bastante comum termos críticos e acadêmicos negligenciando a ficção científica por considerá-la uma forma de arte inferior. Uma das maiores evidências disso são aquelas pessoas que continuam usando os termos “alta” e “baixa” literatura, colocando apenas clássicos literários com foco no drama como um tipo de “alta qualidade”, criada para atrair aqueles interessados em arte. Enquanto obras de gênero, como ficção científica, horror e fantasia, são apenas entretenimento, sem o mesmo peso.
O curioso dessa história toda é que diversas obras de gênero são constantemente incluídas em listas de “alta literatura” ou como clássicos essenciais, mas nunca são mencionados como ficção científica.
1984 de George Orwell está em quase todas as listas de leitura obrigatória, mas raramente é lembrado que ela é tecnicamente uma ficção científica, já que se utiliza a distopia como recurso narrativo. Alguns acreditam que por ser mais carregado em comentário político, a obra deve ser colocada em prateleiras de alta literatura, não misturada com histórias sobre naves e aliens, sendo que esses dois elementos são apenas uma parte minúscula do que o gênero tem. Uma pena ver que a Octavia Butler faz uma distopia ainda mais atual e assustadora em Parábola do Semeador, mas não recebe a atenção merecida porque é jogada em prateleiras de ficção científica.
Muito dessa ideia do scifi se resumir em naves, lasers e alienígenas vem das revistas pulp, que existem desde o fim de 1800, mas eram dominadas por terror e suspense. O formato consistia de uma revista acessível, bem barata, com histórias curtas e voltado para um público jovem, com foco na ação e aventura, onde se popularizaram personagens como Buck Rogers e John Carter.
A ficção científica passou a dominar as revistas mesmo em meados da década de 1920, principalmente com a chegada da revista Amazing Stories, que introduziu para o mundo autores que logo viraram referência no gênero, como Isaac Asimov e Ursula K Le Guin. E com a chegada de outras revistas, como Astounding Science Fiction e Isaac Asimov’s Magazine, ainda mais nomes hoje essenciais do gênero foram surgindo, como Philip K Dick e Frank Herbert. O Brasil teve sua própria revista, com material melhor, mas inspirada nas clássicas pulp, que foi o caso da Magazine de Ficção Científica, com material selecionado por Jeronymo Monteiro, conhecido como o pai da ficção científica no Brasil.
Mesmo tendo autores que seriam respeitados por obras como Duna ou O homem do Castelo Alto, a ficção científica foi, por décadas, considerada apenas entretenimento para o público jovem, sem poder passar disso. Mesmo que hoje o conceito do scifi guetto e preconceito literário seja algo mais conhecido entre os leitores, ele ainda existe. Até autores do gênero, como a Margaret Atwood, afirmam veemente que não querem ser considerados escritores de ficção científica, e vem com aquele papo de ficção especulativa e um monte de regras pra evitar se misturar com a galera que gosta de navinhas, sendo que ela adora uma distopia ou universo pós apocalíptico, né. Ela ficou mais flexível sobre o assunto com o passar dos anos, mas ainda assim, prefiro seguir a Ursula K Le Guin, que sabe se divertir e abraçar o gênero sem nojinho. [fazer algum fancam com a margaret atwood]
É curioso como tantas pessoas ignoram o gênero, mas colocam algumas obras como essenciais para a literatura, sem jamais mencionar que são scifi. Isso costuma acontecer muito com Admirável Mundo Novo, Fahrenheit 451 e O Conto da Aia, sempre chamados apenas de “distopias”, e tem Frankenstein, que só é lembrado como “horror”, e o belo Flores para Algernon, que vivia nas prateleiras de “drama”, principalmente nos Estados Unidos.
Vale mencionar que esse debate do scifi guetto é diferente em lugares como China, Japão e partes da Europa, onde o gênero é mais abraçado, por isso rende até algumas obras bem mais criativas do que diversos clássicos dos Estados Unidos.
Quando falamos de cinema, muitos atores e diretores aclamados acabam ignorados por se envolverem com filmes de gênero. O próprio Boris Karloff, reconhecido por muitos como um dos melhores atores da sua época, quando começou a interpretar seu memorável Frankenstein, raramente recebia o reconhecimento que merecia, muito disso pelo simples fato de estar carregado de maquiagem e interpretando um monstro.
O mesmo acontece hoje com Andy Serkis, que mesmo tendo impressionado o público com sua interpretação como Gollum, em Senhor dos Anéis, ou Caesar, em Planeta dos Macacos, nunca foi reconhecido nas categorias de atuação. A desculpa é que ele trabalha com captura de movimentos, mas os computadores capturam a atuação dele, então o argumento é completamente falho, principalmente quando notamos a diferença entre seus personagens, e entre outros atores conhecidos por captura de movimento, como Benedict Cumberbatch interpretando Smaug, ou o Bill Nighy em Piratas do Caribe, como Davy Jones.
O próprio James Cameron, que sempre faz um sucesso incrível de bilheteria, é conhecido por seus trabalhos de ficção científica, produzindo ou dirigindo obras como Alita, Exterminador do Futuro, Aliens: O Resgate e o gigantesco Avatar, mas só foi reconhecido pela academia quando lançou seu drama, o épico Titanic, único de sua carreira que venceu o prêmio de Melhor Filme.
Esse assunto é maior do que você imagina, talvez eu faça um roteiro inteiro só sobre isso, debatendo preconceitos entre os próprios leitores do gênero, não só autores e críticos, mas isso é um debate para outro dia.
As Chances de Mudança
Com a virada do século, a ficção científica continuou presa nas mesmas indicações e vitórias de décadas anteriores. Interstellar e Blade Runner 2049 receberam indicações em som e design de produção, mas levaram a previsível estatueta de efeitos visuais, com Blade Runner recebendo também a de direção de arte para o Roger Deakins, finalmente.
Como mencionei antes, E.T. foi o último filme do gênero a receber uma indicação na categoria principal, e isso aconteceu no começo da década de 80. Foram quase 30 anos depois que finalmente tivemos outra ficção científica concorrendo em Melhor Filme: em 2009, uma rara indicação dupla, com Avatar e Distrito 9. O filme de Blomkamp não venceu qualquer estatueta, mas o sucesso de James Cameron levou direção de arte, efeitos visuais e design de produção, deixando pra trás direção, edição, trilha sonora, mixagem e edição de som, e a chance de uma vitória em Melhor Filme.
Nos anos seguintes, a ficção científica passou a comparecer mais vezes entre os indicados da categoria principal. Podemos atribuir isso a algumas mudanças nos bastidores da academia, como a entrada de novos membros, principalmente depois de toda a controvérsia sobre a premiação não possuir diversidade o suficiente em sua lista de votantes.
Isso aconteceu em 2010 com Inception, de Christopher Nolan, e em 2013 tivemos mais uma dose dupla, com o tenso Gravidade, de Alfonso Cuarón,e o melancólico Ela sendo indicados para o prêmio de Melhor Filme. Como deu pra notar pelo padrão que esse vídeo mostra, nenhum dos dois venceu, e eu aceitei as derrotas, mas até hoje me dói como A Chegada perdeu em 2016. Pelo menos foi para Moonlight, que é um ótimo filme, mas eu queria que Denis Villeneuve tivesse levado bem mais por Arrival do que por Duna.
E por falar nele, finalmente chegamos ao grande questionamento desse vídeo: será que Duna leva o Oscars 2022 de Melhor Filme?
Como esse vídeo deve ser lançado ANTES da premiação de 2022, essa parte pode ter um efeito diferente dependendo do vencedor da categoria principal. Se Duna vencer, esse vídeo pode ser um documento para registrar o momento histórico de Duna, ou para evidenciar um problema na indústria que, infelizmente, persiste.
Mas quanto às chances de Duna nos Oscars, eu admito que talvez tenhamos um déjà vu da premiação de 2015, quando Mad Max: Estrada da Fúria era a nossa maior chance de ter um scifi levando o prêmio para cara.
Assim como Duna, Mad Max foi indicado em 10 categorias, e eles dividem algumas, como edição, figurino, maquiagem e penteado, direção de arte, design de produção e, para a surpresa de ninguém, efeitos visuais.
Há algumas diferenças. A primeira sendo a categoria de som. Antes tínhamos mixagem e edição de som, mas aparentemente os membros da academia não sabem a diferença entre os dois, já que os mesmos filmes sempre eram indicados nas duas, então hoje temos apenas uma categoria chamada “som”, que engloba edição e mixagem. Se você quiser, pode considerar que Duna foi indicado em 11 categorias, já que duas foram unidas no último ano. E além dessa, Duna tem uma chance bem grande de levar a estatueta por melhor trilha sonora original pelo trabalho do Hans Zimmer.
A maior diferença entre os dois é que Duna tem uma indicação para melhor roteiro adaptado, o que Mad Max não recebeu. Embora seja ótimo, é uma pena como Duna não recebeu uma indicação por direção. Enquanto George Miller foi lembrado, pelo menos indicado, como melhor diretor, Denis Villeneuve ficou de fora. É sempre estranho ver quando um filme está concorrendo ao prêmio principal da noite, mas a pessoa que o fez não está. Isso aconteceu em Argo, que venceu de melhor filme, mas o diretor, Ben Affleck, sequer foi indicado. Se formos seguir esse padrão, talvez seja uma chance para Duna em melhor filme, mas acho pouco provável. É uma pena, mas se isso acontecer, não será uma surpresa.
Erros dos Oscars
A Academia nunca teve a intenção de reconhecer filmes de gênero, e mesmo com mudanças consideráveis nos bastidores, acho pouco provável termos Duna levando o principal prêmio da noite. Não falo isso só pelos outros indicados serem muito bons e merecedores, mas na forma como os Oscars, que deveriam compreender as tendências da indústria, parecem completamente perdidos. Eu sempre penso desse jeito: quem mais poderia ter feito Mad Max daquele jeito se não George Miller?
A definição de “melhor” é subjetiva, mas deveria seguir algum tipo de exigência. Seria ótimo se os Oscars premiassem filmes por sua identidade, seu diferencial. Em 2019 tivemos Pantera Negra, que claramente não é um filme perfeito, poucos são, mas se o compararmos com o vencedor, The Green Book, vale a pena a pergunta: qual dois dois realmente causou um impacto cultural? Não falo de bilheteria, mas de influência.
Eu mesmo concordo com as colocações do Scorsese sobre o cinema de herói estar dominando as salas e tirando outras obras do lugar – e nem vem com papo de oferta e demanda porque não é assim que a distribuição cinematográfica funciona. Mas, convenhamos que Pantera Negra foi um sucesso por motivos que vão além de ser um filme de herói da Marvel, foi uma produção quase inteiramente realizada por uma minoria que foi representada por décadas da pior maneira possível pela indústria. Ao invés de celebrar essa mudança dando o prêmio para Pantera Negra, os Oscars decidiram dar a estatueta para um filme sobre um homem branco ensinando como um homem negro deveria se comportar.
Eu sei, é uma forma meio reducionista de falar do filme, mas convenhamos que ele também não foi feito pelas pessoas mais bem intencionadas do mundo.
Esse não é o primeiro, nem o último caso da Academia premiando alguém que claramente não era o favorito no bolão de alguém. Voltamos para o George Miller, que fez o excelente Estrada da Fúria, um filme que marcou o ano e continua memorável por conta de suas sequências de ação frenéticas, boas atuações, com uma excelente Charlize Theron interpretando Furiosa, e a direção poderosa de Miller, que na época tinha 70 anos, mas com mais fôlego que qualquer diretor jovem de hoje no seu melhor dia.
Você lembra quem venceu no lugar dele? Spotlight: Segredos Revelados.
Spotlight foi um bom filme, teve excelentes atuações e é um drama muito bem feito, mesmo que alguns resumam apenas como “uma obra importante”, o que quer dizer nada em essência. Mas é só isso, um bom filme, que merece completamente todos os elogios, e não digo que não mereceu o prêmio, mas vamos parar pra pensar. Qual desses dois parecia algo novo, criativo e, principalmente, qual deles você lembra?
Estou sendo completamente subjetivo, é claro, mas a premiação também é, e só um desses filmes foi comentado o ano inteiro, continua sendo debatido e está com uma continuação aguardada em andamento. E o mais importante, Mad Max: Estrada da Fúria parecia diferente, o tipo de filme que só o George Miller poderia fazer, tem sua marca em cada segundo, cada fotograma. Você bate o olho e reconhece.
Já Spotlight, esse pode ser confundido facilmente com outros dramas do gênero, como Todos os Homens do Presidente ou The Post: A Guerra Secreta. Quando falamos de Estrada da Fúria, ele nem pode ser confundido com outros Mad Max, e são do MESMO diretor.
A Ficção Científica nos Oscars?
É decepcionante ver como os Oscars são a noite mais aclamada na temporada de premiações, mas é uma das que menos reconhecem os filmes que melhor representam o cinema de sua época. Duna pode não ser perfeito, e se perder na premiação é compreensível, há filmes ótimos para levar no seu lugar, mas a Academia já teve diversas chances de reconhecer a ficção científica em filmes que podemos considerar os destaques daquele ano. Como acontece na literatura, ainda há um enorme preconceito por parte de crítica e público quando se fala de obras de gênero, e essas pessoas perdem a chance de conhecer produções incríveis que podem divertir e emocionar tanto quanto aquelas consideradas de “alta qualidade”, com um enorme diferencial de envolver ocasionalmente uma viagem no tempo, realidade alternativa ou inteligência artificial tomando consciência e controlando a humanidade.
Se a gente parar para pensar, talvez as tentativas de evitar naves e aliens seja apenas medo de se divertir com algo novo. Porque é para isso que serve a ficção científica, fugir do que é óbvio e explorar novas possibilidades.
Finalmente, DUNA está entre nós. A adaptação de Denis Villeneuve, do clássico livro de Frank Herbert, já liberou a sua primeira parte. O filme é um épico, mas será que foi tão perfeito quanto esperávamos?